O Presidente falou e… PUM!

Lá se foi o plano secreto de Mário Soares: implantar, em Portugal, um PRI à portuguesa.

Na lógica do ‘kzar’ do PS, a tradução de Partido Revolucionário Institucional talvez fosse Partido Republicano Independente, em que a figura do Presidente-Rei seria o cerne do ADN de um partido absoluto, certificado por via eleitoral. 

Travado por Salgado Zenha, o mais genuíno defensor do ideal de ‘governo em nome do povo e para o bem do povo’, o fundador do Partido Socialista teve de resignar-se a usar a elegância florentina nas intrigas das capelas de São Bento e Belém, em ligação direta à Rua da Emenda e ao Largo do Rato, ou no folclore de visitas de Estado, a cavalgar tartarugas e elefantes.

Para desgraça do país, o velho sonho absolutista foi continuado pelo melífluo Guterres, acolitado pela trupe de Macau, pela ganância descontrolada de Sócrates e, até ao passado dia 17, pela astúcia de Costa, um homem com talento bastante para transformar uma derrota nas legislativas na ‘geringonça’, que vai fazendo pela vida, e para proclamar uma ‘vitória arrasadora nas autárquicas’ o que não passou de uns feitos pífios no Alentejo, onde o roubo de umas quantas câmaras ao PCP pode vir a ditar a morte do arranjinho da governação. O Dr. Costa saberá o suficiente de filosofia para ter em mente que o relato da ‘vitória de Pirro’ não é história para embalar crianças.

Tudo parecia correr no melhor dos mundos no consulado de António Costa e eis que chegaram os fogos, a destruição, as vítimas, os protestos e, claro, o desnorte, a mentira e a deslealdade para quem serviu de escudo ao Governo. 
Nem os sermões do cardeal Santos Silva (o Augusto), exponenciados por uma imprensa saudosa da ferocidade de Sócrates, limparam as nódoas do ‘caldo entornado’. 

Depois, o Presidente falou e, num ápice, reduziu um impante primeiro-ministro à humildade do governante que pede desculpa por não ter traduzido em palavras a compunção que carrega na alma.

No dia 17, o país teve a prova do que vínhamos pressentindo: temos em Belém uma pessoa imbatível na capacidade para interpretar o sofrimento do povo e para passar à ação, com uma naturalidade que não cessa de surpreender. Um presidente que, por onde passa, arrasta uma unanimidade que o país só conheceu no apostolado de D. Pedro V. 

Quem sabe se, seguindo os ensinamentos de Santo Agostinho – «Meu Deus, faz-me santo, mas só quando eu for velhinho»  –, o ‘político igual aos outros’, que carregava um longo cadastro de tropelias, se terá redimido num genuíno ato de contrição: ‘Prometo a mim mesmo emendar-me e nunca mais voltar a pecar’. 

Seja como for, é impossível não reconhecer mérito a um Presidente que nunca falta nos momentos difíceis, com a compaixão justificada pelas circunstâncias, mas igualmente capaz de usar a dureza para pôr ordem na casa. 

Um exemplo já aplaudido lá fora, que todos os dias dá lições a um Governo hábil na propaganda de feitos que ninguém conhece e em promessas que se perdem nos debates parlamentares.