O travão à plantação de eucaliptos foi, desde sempre, uma bandeira do Governo, até porque o combate à expansão da área desta espécie foi um dos pilares da negociação entre o PS e os Verdes. No entanto, há quem garanta que que o Executivo de António Costa aprovou já mais plantações de eucalipto do que o Governo anterior.
A denúncia surge por parte da Quercus e da Acréscimo que analisaram os dados do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) referentes ao período que decorreu entre 17 de outubro de 2013 e o final do primeiro semestre deste ano.
De acordo com as duas associações, durante a gestão de Pedro Passos Coelho foram autorizadas 43% das novas plantações, enquanto o Executivo de António Costa é responsável pela aprovação das restantes 57%. Para estas associações, dado o aumento de autorizações, é de prever que se assista nos próximos meses a uma corrida à plantação de novas áreas, já que a nova legislação só entra em vigor no próximo ano.
Estas acusações já obrigaram o Ministério da Agricultura a reagir. De acordo com o gabinete de Capoulas Santos, «a legislação em vigor, como se sabe, facilitou a plantação de eucaliptos». Além disso, o Governo entende que «no cumprimento do seu programa, revogou normas liberalizadoras da plantação» e recorda a proposta de lei apresentada em abril deste ano que vai entrar em vigor já em fevereiro de 2018.
Numa entrevista ao DN, o ministro responsável pela pasta da floresta admite que existe o risco de assistirmos a uma corrida às autorizações, mas garante que nada há a fazer. «Este Governo está a cumprir a lei que existe. Tal como se comprometeu, alterou-a. Só que essa alteração, por decisão do Parlamento, só entra em vigor daqui a vários meses e, enquanto isso não acontecer, o Governo tem de cumprir as leis em vigor. Nós somos, contra a nossa vontade, obrigados a cumprir a lei Cristas, que de alguma forma liberalizou a plantação de eucaliptos», explica.
Com o Governo em funções já desde 2015, há quem questione o facto de a nova legislação só entrar em vigor no próximo ano. No entanto, para Capoulas Santos é importante sublinhar que «Roma e Pavia não se fizeram num dia. Não chegamos ao Governo num dia e cumprimos o programa no dia seguinte. Ao fim de um ano de legislatura já tínhamos o pacote da reforma florestal feito. Seria ótimo que qualquer Governo pudesse cumprir o seu programa numa semana, mas os compromissos são para uma legislatura e fizemos isto no primeiro terço da legislatura».
Redução da área em 2018
Foram muitas as vozes que se levantaram contra um travão à plantação de eucaliptos, nomeadamente ligadas à indústria ligada à produção de papel. No entanto, a medida vai avançar e o diploma, que reduz a área de plantação desta espécie, publicado este ano, entra em vigor já em 2018. «Há quem ache que pode haver eucalipto em todo o lado e há quem ache que o eucalipto é um demónio», esclarece Capoulas Santos, acrescentando que este foi um dos principais problemas da discussão que se criou em torno da reforma da floresta.
«Não vamos permitir que a área de eucalipto aumente. Mas há muito eucalipto onde não pode estar e há terrenos onde é possível produzir o dobro. O que queremos fazer é reorganizar tudo», sublinha, sintetizando: «Queremos é produzir muito, em menos terreno».
As ameaças da indústria
Ao mesmo tempo que o Governo continua a tentar arranjar mecanismos para atrair investimento estrangeiro, existem setores que começaram desde cedo a alertar para algumas decisões do atual Executivo e alguns deles já chegaram mesmo a ameaçar deixar de investir em Portugal. Um dos últimos casos esteve relacionado com a indústria do papel por causa do travão à plantação de eucalipto imposto pela reforma da floresta.
Na raiz do problema está o facto de a indústria consumir, em Portugal, 8,5 milhões de metros cúbicos de madeira de eucalipto por ano, sendo necessário importar dois milhões devido à insuficiência da floresta nacional – argumentos velhos que levaram a um novo problema: o setor diz que precisa de aumentar a produção.
Pedro Queiroz Pereira, presidente do conselho de administração da Navigator Company, explica mesmo que «perdem as empresas deste setor, que veem agravada a sua competitividade externa, e perde o país, sob a forma de escoamento de divisas e de destruição de postos de trabalho».
Além disso, Queiroz Pereira não esconde que poderão estar em risco futuros investimentos, uma vez «que torna cada vez mais difícil a vida das empresas produtivas e mais arriscados os investimentos».
Mas esta posição não é tomada apenas pela Navigator Company. Também a Altri depressa ameaçou travar os investimentos se Portugal demonizasse o eucalipto. «A simples proibição do plantio de determinada espécie de árvore, neste caso o eucalipto, preferindo que aí floresça mato, é a todos os títulos pouco recomendável», atirou Paulo Fernandes.
Incêndios à parte
Os incêndios em Portugal voltaram a trazer a lume uma velha discussão: a plantação de eucaliptos. De acordo com a Associação da Indústria Papeleira (CELPA), o problema dos incêndios não pode ser atribuído a esta espécie, mas sim à falta de gestão da floresta. Não é a primeira vez que este argumento é usado, mas Henrique Vieira, da CELPA, voltou a recordá-lo: «É uma questão da gestão, não é da espécie em concreto. O que não falta no país são exemplos de incêndios que ocorrem em áreas agrícolas e em áreas florestais com outras espécies que não o eucalipto. Onde há gestão, o fogo tem uma probabilidade muito menor de ocorrer e onde ocorre é com menos intensidade e causa menores estragos».