Gosta que o tratem por ‘príncipe’, ‘patrão’ ou ‘Teodorin’, não sai de casa sem ter os sapatos a condizer com o carro, é capaz de comprar 30 fatos no mesmo dia e só veste as melhores marcas do mercado. Tem dezenas de carros de luxo, um avião, propriedades nos EUA, África do Sul e França, e o seu séquito de funcionários inclui motoristas, pilotos, mordomos, empregados de limpeza, jardineiros, cozinheiros, imobiliários, paisagistas e ex-militares. Tem um curso inacabado de Inglês numa universidade da Califórnia, meteu-se no mercado imobiliário e na indústria florestal, experimentou ser produtor de hip-hop, chegou a ministro da Agricultura da Guiné Equatorial e mais tarde a vice-presidente. E, claro, é o filho preferido de Teodoro Obiang, o mais longevo líder político do continente africano, que o vê como o sucessor perfeito para um dia se sentar na cadeira do poder de Malabo.
Foi essa aparente inesgotabilidade das fontes de rendimento de Teodoro Nguema Obiang Mangue – na cúpula de um país a transbordar de petróleo, mas com quatro quintos da população a viver abaixo do limiar da pobreza e com elevadíssimas taxas de mortalidade infantil – que levou à denúncia das organizações não-governamentais Sherpa e Transparency International, e que acabou por colocá-lo na mira da justiça francesa. O nome do político equato-guineense voltou a saltar para as capas dos jornais internacionais no passado dia 27 de outubro, ao ser condenado a três anos de prisão com pena suspensa, pelos crimes de corrupção, desvio de dinheiros públicos, abuso de confiança, branqueamento e abuso de bens sociais. Em França construiu património avaliado em mais de 100 milhões de euros, que incluía um imóvel de 2800 metros quadrados na exorbitante Avenida Foch, em Paris, 18 carros de luxo, e um diversificado número de joias e obras de arte e que, de acordo com a sentença, foram adquiridos à custa do desvio de verbas da empresa florestal estatal.
Teodorin, o seu pai e os seus advogados dizem que o julgamento não passa de «uma ingerência nos assuntos de um Estado soberano», mas não foi apenas em França que o rasto do dinheiro dos Obiang gerou suspeitas. Um relatório de 2010 de um subcomité do Senado norte-americano sugere que o filho pródigo criou ‘empresas fantasma’, durante a sua estadia nos EUA, através das quais foram canalizados mais de 100 milhões de dólares (cerca de 86 milhões de euros) para o território, sem quaisquer encargos de ordem fiscal.
Ainda que não tenha sido suficiente para justificar uma acusação formal da justiça norte-americana, o documento descreve ao pormenor alguns dos gastos mais extravagantes do filho do Presidente africano, como por exemplo o arrendamento de uma garagem para guardar os cinco Bentley, quatro Rolls-Royce, dois Lamborghini, dois Mercedes, dois Porsche, dois Maybach e um Aston Martin, que já não cabiam na sua mansão em Malibu (Califórnia), os 58 mil dólares gastos numa sala de cinema particular, os 60 mil em tapetes ou os 1,7 milhões esbanjados num par de copos de vinho.
Em busca de vocação
Os tempos de Teodorin em terras do Tio Sam revelaram ao mundo o seu gosto especial em viver como um verdadeiro príncipe. Ali chegou em 1991, com 22 anos, para frequentar um curso de Língua Inglesa na Pepperdine University, em Malibu. Na linha da frente para explorar os poços de petróleo da Guiné Equatorial, a empresa energética Walter International comprometeu-se a pagar-lhe os estudos, mas cedo percebeu que os gastos do jovem Obiang ultrapassavam largamente os 3400 dólares das propinas. Teodorin não gostava do dormitório no campus universitário e decidiu arrendar uma casa particular e uma suíte num hotel da cidade. A sala de aula foi substituída pelas lojas de Bervely Hills e, ao fim de cinco meses, desistiu dos estudos.
Acabou por se tornar assessor do ‘pai-presidente’, decidiu viajar e conhecer o mundo, e mesmo tendo deixado de viver a tempo inteiro nos EUA, nunca abdicou de passar umas boas temporadas em Las Vegas, Miami ou Los Angeles – onde comprou uma mansão por 6,5 milhões de dólares, junto de estrelas de Hollywood como Mel Gibson, Kelsey Grammer ou Britney Spears. A convivência com meio artístico norte-americano deu-lhe conhecer algumas das suas futuras namoradas, como a rapper Eve, a atriz Tamala Jones ou a Miss Louisiana Teen USA 2008, Lindsey Evans, e colocou-o debaixo do foco da imprensa cor-de-rosa local.
A busca por uma vocação levou Teodorin a investir no mundo da música, numa emissora de rádio, numa companhia aérea, no ramo imobiliário e na indústria da madeira. Terá sido este último investimento aquele que lhe revelou as suas melhores aptidões profissionais, tendo em conta que no final dos anos 90 recebeu das mãos do pai a pasta ministerial da Agricultura, Florestas, Água e Meio Ambiente – cujo Ministério liderou até 2012 – e, de acordo com a sua defesa no caso judicial francês, foi através do qual enriqueceu.
Manias e desenfados
A chegada à vice-presidência do regime autoritário de quase 40 anos do pai acabou por ser um passo natural, mas entre aqueles que o conhecem ou que o investigaram, as maiores responsabilidades de Teodorin Obiang não são sinónimo de trabalho ou competência. «Ele é um idiota desequilibrado e irresponsável», descreve sucintamente um antigo membro dos serviços de inteligência dos EUA, em declarações à Foreign Policy. «Nunca o vi a fazer algo relacionado com trabalho. Os seus dias consistiam unicamente em dormir, fazer compras e sair à noite», acrescenta um antigo motorista que o processou por incumprimento de pagamento.
Entre as incontáveis excentricidades do dia a dia de Obiang constam as lendárias festas por si organizadas. Pelas suas mansões, quartos de hotel, iates ou propriedades arrendadas passaram modelos, músicos, acompanhantes de luxo, ‘coelhinhas’ da Playboy e até um tigre para animar os convidados.
Às festas somam-se manias e hábitos estapafúrdios, como andar regularmente com uma mala atolada com um milhão de dólares em notas de 100, vestir-se a condizer com o carro que conduz ou oferecer boleias generosas no seu avião privado. «Uma vez mandou-o do Rio [de Janeiro] para Los Angeles, para ir buscar o seu barbeiro», conta um outro motorista, que diz ter ouvido da boca do antigo patrão a seguinte ordem: «Hoje tenho sapatos azuis calçados, traz-me o Rolls-Royce azul!».
Alheio às acusações judiciais francesas, às denúncias das constantes violações de direitos humanos levadas a cabo pelo Governo ao qual pertence e ao burburinho da imprensa sobre o seu estilo de vida faustoso, Teodorin vai trilhando o seu caminho com os olhos postos na Presidência da Guiné Equatorial. A preferência do pai, para já, ninguém lha tira – que o digam os generais e representantes de topo do Ministério da Defesa, afastados quatro dias depois da tomada de posse do filho mais velho de Obiang como vice-presidente. Bem que pode começar a ter aulas de português, e com isso honrar as promessas de Malabo no seio da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Já estaria a converter o legado do pai.