Puigdemont sabia que poderia “acabar na prisão”

O líder catalão parece ter mudado de posição sobre a União Europeia. Podemos cai nas sondagens 

Em entrevista à Catalunya Ràdio em Bruxelas, Puigdemont, presidente destituído do governo catalão, afirmou que os membros do seu executivo estão a ser "vítimas de perseguição política" e que o "ódio e as ganas de vingança contra aqueles que os provocaram [o governo de Madrid], segundo eles, uma derrota humilhante, não pressagiavam nada de bom". 

Na capital europeia, o líder catalão confessou que "aqueles que votaram no dia 1 de outubro sabiam que íamos deixar a pele. Digo-lhes que temos de fazer a República a partir da premissa democrática ou não poderemos fazê-la… e o que estão a fazer é travar a democracia para que não possamos fazê-lo". 

A perspetiva de serem acusados, condenados e sentenciados a pena de prisão sempre esteve presente no combate político contra Madrid. "Todos sabemos que podemos acabar na prisão se a extradição for aprovada. Estamos preparados para a eventualidade de nos extraditarem", confessou aos jornalistas. 

Ainda assim, Puigdemont deixou um aviso a Madrid: "Não irei tolerar que destruam a democracia como única forma de anular a nossa vontade de ser um país independente". E, refletindo sobre o dia a seguir às eleições autonómicas de 21 de dezembro, o líder catalão disse que "encontrar-nos-emos diante de um Estado espanhol que nos quer aniquilar enquanto país, a nossa língua, a nossa cultura, e arruinar-nos economicamente e desacreditar-nos como nação". Já no passado, Puigdemont tinha desafiado Madrid a responder se aceitaria os resultados eleitorais caso as forças independentistas obtenham a maioria no parlamento catalão, possibilitando a formação de um novo executivo que defenda a causa da independência. 

A Europa entre o silêncio e a recusa

Na entrevista, Puigdemont parece ter alterado a sua posição face à União Europeia. "Acreditamos que todos os caminhos de acordo são possíveis, mas estamos perante um Estado autoritário e uma da parte da UE apoia os seus abusos", afirmou. "Isso é muito preocupante para o futuro da Europa, porque se desligou dos cidadãos e as pessoas acabarão por não a seguir. Estão a enfrentar agora as suas próprias opiniões públicas", complementou. 

Para Puigdemont, "todo o planeta tem relatado o que se está a passar na Catalunhas e as instituições europeias" demonstram "a mais absoluta indiferença, desligada dos interesses das pessoas". 

Numa decisão inédita, o Parlamento Europeu proibiu hoje a entrada dos cinco líderes catalães, que se encontram em Bruxelas, de entrarem nas suas instalações, excepto se tiverem uma autorização expressa dos tribunais. A proibição de entrada tem como objectivo impedir que Puigdemont e os restantes membros distituídos procurem refúgio nas instalações do órgão legislativo europeu, segundo fontes da instituição. 

As instituições europeias têm recusado qualquer envolvimento na questão independentista catalã, advogando ser um assunto interno e soberano de Espanha. Não obstante, os chefes de Estado e de governo europeus, bem como os líderes das instituições europeis, têm secundado o governo de direita de Mariano Rajoy na sua postura perante os independentistas catalães. 

A preocupação dos espanhóis

O desafio independentista tem estado, nas últimas semanas, em todas as manchetes e aberturas de jornais e programas noticiosos de Espanha – não fosse o maior desafio à democracia espanhola desde 1978. Sabendo disto, os espanhóis consideram a independência da Catalunha como o segundo principal problema com que o país se depara, estando apenas atrás do desemprego, um problema endémico na sociedade espanhola, segundo uma sondagem do Centro de Investigaciones Sociológicos (CIS). 

Cerca de 29% dos inquiridos considera que a independência é o maior desafio com que a Espanha se depara, sendo que 66,2% se focou no desemprego. A preocupação soberanista cresceu de 7,8% para 29% desde o referendo de 1 de outubro. A sondagem foi realizada entre 2 e 11 de outubro, depois do referendo mas antes da votação e proclamação da nova República catalã no parlamento catalão. 

De acordo com dados do mesmo centro de investigação, as preocupações dos espanhóis com a independência da Catalunha apenas perfazia 0,7% há um ano atrás. 

Unidos Podemos cai nas sondagens

Na mesma sondagem, o Unidos Podemos, liderado por Pablo Iglesias, é o partido mais penalizado pela sua postura na questão catalã.A coligação de esquerda-radical cai de 20,3% para 18,5% nas intenções de voto, sendo que o Ciudadanos, partido formado na Catalunha para combater o independentismo e que se tornou nacional, sobe de 14,5% para 17,5%. O Ciudadanos é o único partido espanhol nacional que na sondagem consegue subir nas intenções de voto.

O PP de Mariano Rajoy caiu 0,8%, ficando-se pelas 28%, seguido pelo PSOE com 24,2%. Apesar da queda, o PP seria o partido mais votado em caso de eleições gerais antecipadas. 

O Unidos Podemos tem vivido momentos difíceis tanto na sua vida interna como na sua relação com o seu partido irmão da Catalunha, liderado até recentemente por Albano Dante Fachin. A direção de Iglesias não ficou satisfeita por três dos quatro deputados do Podemos da Catalunha terem votado a favor da Declaração Unilateral de Independência (DUI) no parlamento catalão e, ainda menos, com o coordenador do partido local. 

O Unidos Podemos tem tido uma falta de clareza sobre a questão da independência da Catalunha, levantando dúvidas e incompreensões na região, ameaçando custar-lhe votos a nível nacional. O partido tem defendido que os catalães têm o direito a decidir o seu futuro, mas que, ao mesmo tempo, devem permanecer numa Espanha federal, depois de uma revisão constitucional sobre a organização do território nacional espanhol. 

Pablo Iglesias chegou inclusive a atacar fortemente a DUI, afirmando ainda que o referendo de 1 de outubro carecia de qualquer legalidade para o sustentar, quando antes do referendo disse que as pessoas deviam participar e elogiou o civismo dos catalães ao votarem apesar da "enorme repressão" a que foram sujeitos pela Polícia Nacional e Guardia Civil espanholas.