Terminou enfim a presidência de Robert Mugabe no Zimbabué. Numa declaração surpreendente que colocou ponto final àquele que já era um amontoado bizarro de acontecimentos, o único presidente da independência do país africano demitiu-se em direto para a televisão, sob a forma de um comunicado enviado ao presidente do Parlamento, onde esta terça-feira já decorria o processo de impeachment que inevitavelmente o expulsaria à força.
O hemiciclo explodiu em festejos que rapidamente se alastraram pelas centenas de manifestantes que protestavam fora do edifício e pelo resto de Harare. Aos 93 anos e ao fim de 37 no poder, o velho líder que prometia governar até à morte sai de cena.
“Estamos em êxtase, é tempo de sangue novo”, dizia esta terça William Makombore, um dos milhares de zimbabuanos que celebravam nas ruas da capital. “Tenho 36 anos e esperei este momento toda a minha vida. Apenas conheci um líder”, explicou ao “Guardian”, ecoando aquele que parece ser a consciência generalizada no país.
Jubilation in Zimbabwe as Mugabe steps down. Read more: https://t.co/fK2xgR7xxV via @ReutersTV via @edwardcropley pic.twitter.com/r9C1lig32p
— Reuters Top News (@Reuters) November 21, 2017
A população, por exemplo, é hoje um décimo mais pobre do que em 1980, ano em que conquistou a independência à minoria branca e racista que governava a antiga colónia britânica, na altura conhecida como a Rodésia do Sul.
Ao lado de Makombore, Munyaradzi Chisango dá um relato parecido: “Tenho 35 anos e filhos. Nasci sob Mugabe e eles nasceram também sob ele. Isto vai por de novo o Zimbabué no mapa.”
A Reuters avançava esta terça-feira à noite que o poder cairá agora para as mãos do ex-vice-presidente Emmerson Mnangagwa, cuja demissão, há duas semanas, espoletou o golpe de Estado que desaguou na demissão de Robert Mugabe.
The moment the speaker of Zimbabwe's parliament read out Robert Mugabe's letter of resignation https://t.co/ookRf1pBzM pic.twitter.com/eT5kRpNpnM
— BBC Breaking News (@BBCBreaking) November 21, 2017
A notícia não é surpreendente, visto que Mnangagwa passou a última semana a manobrar as negociações entre militares e o presidente e desde o golpe é visto como o sucessor consensual. Ao demitir-se, o presidente deixou o poder ao partido, o Zanu-PF, que, segundo a agência de notícias, entregará a presidência a Mnangagwa e deve consagrá-lo oficialmente como o candidato às eleições de 2018 já em dezembro, data do congresso.
Não se sabe, no entanto, se o novo homem forte no Zimbabué formará um governo de unidade com a oposição ou governará a sós até às eleições – o próximo líder tem também o seu historial de operações de limpezas étnicas e foi ao longo de anos o braço direito (e de ferro) de Mugabe.
Tão-pouco se conhece o destino do agora ex-presidente, mas há notícias sobre um acordo que garante imunidade ao presidente e à sua mulher, Grace, cujas manobras internas provocaram a demissão de Mnangagwa, o golpe militar e o fim inesperado do seu marido. O exército garante que não quer o poder e mesmo a oposição dizia esta terça que Mugabe deve ter caminho aberto para “viver os últimos dias em descanso”, como defendia, por exemplo, o líder do partido opositor.