O movimento radical islamista paquistanês que há três semanas paralisa Islamabad ganhou a batalha contra o governo e conseguiu a demissão do ministro da Justiça por este alegadamente ter violado a lei da blasfémia. Zahid Hamid entregou ontem o pedido de demissão ao primeiro-ministro Shahid Abbasi e com ele também deu uma importante vitória ao ascendente partido ultraortodoxo e radical Tehreek-e-Labaik, uma das duas formações islamistas que nos últimos meses vêm crescendo em força e mobilização no Paquistão.
O líder do Labaik anunciou ontem que as grandes manifestações em Islamabad – e, em menor dimensão, noutras cidades – vão suspender-se quando os militantes detidos ao longo dos protestos estiverem libertados, tal como ficou negociado com o governo. Ontem, ao cair da noite local, as centenas de pessoas que congelam a capital ainda bloqueavam ruas e autoestradas. “A libertação dos nossos trabalhadores está a acontecer”, explicou Ejaz Ashrafi, o porta- -voz do Labaik, à Reuters. “Quando isso acontecer, partiremos.”
No imediato, os protestos nasceram de uma pequena alteração no texto do juramento da tomada de posse de políticos paquistaneses. O juramento novo continuava a afirmar que Maomé é o último profeta do islão, mas o texto alterou temporariamente as palavras “eu juro solenemente” por “eu acredito” (em Maomé como o último profeta do islão). Quando o caso resultou em escândalo e os imãs mais radicais convocaram protestos, o governo recuou de imediato e atribuiu a mudança do texto a “um erro administrativo”. Mas o Labaik não recuou e nas três últimas semanas ocupou o ponto principal de acesso a Islamabad e outras vias importantes na capital.
O governo tentou travar os protestos com a intervenção da polícia, mas apenas conseguiu a sua radicalização. Sete pessoas morreram e quase 200 ficaram feridas no sábado, quando as autoridades paquistanesas tentaram dispersar os protestos e se confrontaram com os paus e ferros das multidões islamistas. No rescaldo da violência, bloqueios armados como o de Islamabad replicaram-se noutras cidades, até esse momento praticamente intocadas. O primeiro-ministro paquistanês tentou mobilizar o exército para pôr fim às manifestações, mas o entendimento ontem era o de que as Forças Armadas se alinharam com os imãs.
“O honrado chefe das Forças Armadas, o general Qamar Javed Bajwa, contactou-nos por meio de um enviado”, anunciou ontem o líder do Labaik, Khadim Rizvi, que nas últimas eleições intercalares chegou ao surpreendente patamar de 6 e 7,6%. “O general interessou-se pessoalmente pela nossa missão e enviou a sua equipa, dizendo-nos que ‘vamos ser as vossas garantias e satisfazer as vossas exigências’”, indicou o clérigo, que parte agora com uma mão forte para as eleições legislativas do próximo ano.