As verbas para assessoria e secretariado na Assembleia Municipal de Lisboa (AML) vão ser discutidas amanhã pelos membros da mesma. A presidente do órgão, a também deputada à Assembleia da República, Helena Roseta, levará o assunto à conferência de representantes (que reúne os eleitos pelos lisboetas), onde poderá ouvir os partidos com assento, e o debate está agendado para logo a seguir.
A controvérsia surgiu em consequência da manchete do semanário “SOL” no último fim de semana, que revelava os valores dos salários recebidos pelos assessores e assistentes da assembleia municipal da capital, acima da média profissional e pública. De acordo com a proposta de apoio técnico aos grupos políticos com assento na assembleia municipal, aprovada na sexta-feira 23 de novembro, por unanimidade, cada assessor a tempo inteiro tem um salário mensal de 3752,5 euros brutos, acrescidos da taxa de IVA em vigor (23%). A tempo parcial, o valor baixa para 1876,25 euros (sem IVA).
Já uma secretária a tempo inteiro tem uma remuneração de 2802,5 euros mensais, também acrescidos de IVA. Mas se for a regime parcial é de 1401,25 euros mensais, a que se soma IVA. Ao todo, a Câmara de Lisboa vai gastar mais de um milhão de euros por ano em salários para assessores e secretárias da assembleia municipal até 2021.
Os partidos políticos têm-se resguardado, da direita à esquerda, devido ao facto de a alocação orçamental ter sido acordada por unanimidade entre todos e ainda aguardarem esclarecimento público de Roseta, que remete para o debate de amanhã. Ao i, fonte próxima da mesa da AML reconhece que é verdade que os “valores são altos” e que “não se pode desmentir algo que não é mentira”, mas esclarece que as verbas apresentadas são verbas-limite (de teto salarial) e que visam precisamente evitar valores excessivos. “Não corresponde a nenhum ordenado individual. Não há ninguém que ganhe aquele valor concretamente”, garante, considerando ainda que a AML “é diferente das restantes assembleias municipais” do país na medida em que “tem um trabalho diário só comparável ao do parlamento”. A mesma fonte diz ainda que a controvérsia só surgiu porque a verba passou a ter de ir à Assembleia da República. “Antes era aprovada anualmente na assembleia municipal. Agora, como é para os quatro anos, tem de ir ao parlamento”, termina.
A inquietude laranja
Fora do silêncio ficou o PSD. As reações à capa do “SOL” foram várias, e as mais tensas visavam o tempo em que o atual primeiro-ministro, António Costa, era o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, quando os salários das assessorias assumiram as verbas referidas. “A capacidade de António Costa de fazer pontes é notável. Ou será mais de ‘comprar’ pontes?”, ironizou Duarte Marques, deputado social–democrata, no Twitter. Para Virgílio Macedo, também deputado, mas via Facebook, trata-se de “pouca-vergonha total” e de um “verdadeiro escândalo” sem “qualquer pingo de vergonha”. Mas não foi só Costa que sentiu a fúria laranja. Dentro do próprio PSD também houve ataques: diretos e indiretos.
José Eduardo Martins não fixou alvo, mas reconheceu-se-lho. “Não deve haver caso correspondente em todo o país”, começou, sobre a circunstância de a Assembleia Municipal de Lisboa ser excecional perante todas as outras. “Muitos são os exemplos de tudo o que não devia acontecer. Alguns a raiar o surrealismo, como o caso de deputados que eram simultaneamente assessores de si próprios”, disparou, para depois concluir que “alguém devia moralizar isto…”, tendo ele próprio suspendido o mandato na AML depois de ter visto Luís Newton, presidente de junta de freguesia do PSD (deputado municipal por inerência), candidatar–se contra si para liderar a bancada na assembleia de Lisboa. Newton, por sua vez, considera o caso como “fake news” e “mais grave” todo aquele que “com mais ou menos responsabilidades políticas e mais ou menos conhecimento do modelo de funcionamento da AML, vem procurar fazer falsos e tristes moralismos neste tipo de artigos, à procura de um populismo barato e de uma notoriedade bacoca”.
André Pardal, ex-deputado na AR e militante do PSD na capital, não necessariamente próximo nem de José Eduardo nem de Newton, também associou a polémica em torno da assembleia municipal à turbulência interna do partido em Lisboa. “A capa de hoje do jornal ‘SOL’ ajuda a perceber muito do que se tem passado em Lisboa (e particularmente no PSD/Lisboa) nos últimos anos. Vale a pena pensar nisto antes de formular qualquer juízo de valor sobre apoios ou candidaturas…”, escreveu, de alvo igualmente fixo.