O Estado está a falhar nas suas funções mais básicas e no respeito pelos portugueses que são a sua essência. Em apenas uns poucos meses sucederam-se em Portugal factos graves que, de tão frequentes, quase foram banalizados. Mas mais grave foi o desrespeito com que os responsáveis lidaram com esses acontecimentos.
O roubo de material militar que se verificou em Tancos, por si só foi grave. Mas tão grave quanto o acontecimento foi a ausência de um esclarecimento, a irresponsabilidade da estrutura militar e a falta de autoridade dos responsáveis políticos. Se tal não fosse suficientemente preocupante quanto à falta de robustez do sistema de defesa, as atitudes dos responsáveis militares e políticos foram inadmissíveis – entre declarações, incertezas e falta de esclarecimentos. E passados estes meses continua sem existir uma explicação e sem ninguém assumir qualquer responsabilidade.
Em junho ocorreu o incêndio de Pedrógão que matou mais de 60 pessoas. Uma tragédia com consequências nunca antes verificadas e em que tudo falhou. Falharam a prevenção, as comunicações, a coordenação e falhou a proteção das pessoas. Mas sobretudo falhou a assunção de responsabilidades.
Em 15 de outubro verifica-se o mais devastador dia de incêndios com centenas de ocorrências e dezenas de vítimas mortais, com uma das mais importantes matas nacionais destruída – e, uma vez mais, tudo falha. Mesmo com a previsão das condições adversas, não houve prevenção eficaz, não estavam meios adequados mobilizados, falhou a coordenação e mais uma vez faltou responsabilidade.
A cena de espancamento observada à porta de uma discoteca de Lisboa foi a revelação de uma prática demasiado frequente na noite de Lisboa. Ficámos a saber que a Polícia há muito que tem conhecimento mas que não tem sido capaz de evitar estas situações de modo a garantir a segurança dos cidadãos.
O surto de legionela verificado no Hospital de São Francisco Xavier, com a ocorrência de vários mortos e dezenas de pessoas afetadas, indicia falhas graves num hospital público.
Este acontecimento foi ainda ‘acompanhado’ pela inacreditável interrupção de um velório para levantamento de um corpo por parte do Ministério Público sem qualquer sensibilidade ou respeito pelas pessoas.
Mais recentemente, o episódio da irresponsabilidade do Estado foi o jantar no Panteão Nacional. Um triste acontecimento que faz já parte do anedotário nacional pelo insólito da situação — mas cuja gravidade, para além do facto em si mesmo, reside na ausência de consequências e no ‘passa culpas’ a que se assistiu.
Também o recente episódio do anúncio da deslocalização do Infarmed para o Porto revela a forma ligeira e atabalhoada com que o Estado é gerido. Um processo que terminou com a assunção do óbvio: o primeiro-ministro admitiu que o processo foi mal conduzido – um eufemismo para a precipitação e irresponsabilidade evidente.
Em 2011 o país chegou à beira da bancarrota. O programa de assistência financeira internacional a que foi sujeito transformou Portugal num Estado com a soberania tutelada. Tendo ultrapassado esse período, Portugal parece regressar a uma situação de debilidade de caráter estrutural. O país que foi fragilizado financeiramente está agora a demonstrar fragilidades nas funções do Estado. O Estado volta a falhar. De forma diferente à de 2011, mas a falhar. Em comum, há a circunstância de ser o Partido Socialista (agora apoiado pelo Partido Comunista e pelo Bloco de Esquerda) a governar.
Esta sequência de acontecimentos revela falhas na autoridade do Estado, falhas na responsabilidade do Estado e, infelizmente, demasiada condescendência na exigência dos cidadãos. É na exigência que a mudança terá de começar.