O ex-Presidente angolano José Eduardo dos Santos justificou esta semana que a nomeação dos seus filhos para cargos públicos visava proteger o «interesse público» em Angola. O nepotismo «é um conceito que sofreu uma evolução, pois existem países que não reconhecem que o parentesco por si só seja um elemento suficiente para restringir o direito de alguém qualificado ser promovido ou nomeado», afirmou o ex-chefe de Estado, discursando num seminário organizado pelo grupo parlamentar do seu partido, subordinado ao tema ‘MPLA e os Desafios do Combate à Corrupção e ao Nepotismo’.
Para José Eduardo dos Santos, que ainda é presidente do MPLA, «a promoção e nomeação de pessoas melhor qualificadas para o exercício de uma certa função constitui mesmo uma forma de proteção do interesse público e não deverá o Estado ficar restringido de nomear essas pessoas unicamente por razões de parentesco entre as pessoas envolvidas»
O ex-chefe de Estado, que nomeou a filha Isabel dos Santos para liderar a principal empresa pública do país, a Sonangol, que colocou o filho José Filomeno dos Santos à frente do Fundo Soberano de Angola e entregou a administração do canal 2 e do canal internacional da Televisão Pública de Angola a outros dois filhos, Tchizé dos Santos e Coréon Dú, procurava assim justificar as decisões de favorecimento dos seus filhos (para não falar de outros parentes) que marcaram a sua presidência.
Uma interpretação que em nada é partilhada pelo seu sucessor na Presidência de Angola. No mesmo seminário, onde lançou um repto aos angolanos para repatriarem o dinheiro que têm no exterior (ver texto abaixo), João Lourenço considerou o nepotismo um dos «males» que afetam o país.
«Que a realização deste seminário seja entendida como um sinal claro da vontade política e determinação do MPLA em levar a cabo uma verdadeira cruzada de luta contra a corrupção, o nepotismo, o compadrio em todas as esferas da nossa sociedade, e a todos os níveis, até algum dia podermos declarar o nosso país livre destes males, a exemplo de quando se declara livre de uma epidemia que a todos ameaça, porque a semelhança e comparação desses dois factos nos parece adequada», afirmou o Presidente de Angola.
Lourenço elogiou a iniciativa do partido, mas apelidou-a de tardia, «se tivermos em conta que o país vive em paz há 15 anos», e considerou que «não houve [a] determinação e coragem que se impunham» para combater «estes fenómenos perniciosos e condenáveis» que «nasceram, cresceram, se enraizaram e ameaçavam se perpetuar» no período da reconstrução nacional que foi liderado pelo seu antecessor.
«A direção do MPLA, como órgão colegial, assume coletivamente a responsabilidade do que se passou, e que se deveu à nossa inação e de cujas consequências está hoje o país a pagar», acrescentou o Presidente num mea culpa em que sublinhou que o seu partido, apesar de «às vezes desviado por pessoas», é o «mais bem preparado para realizar este difícil combate».
João Lourenço concluiu o seu discurso apelando a uma união de todos no combate a esses males que estão a causar «enormes prejuízos» ao país. «Só unidos e determinados poderemos ter esperança de ir minimizando os enormes prejuízos que a corrupção, o nepotismo, o branqueamento de capitais e outros males equivalentes têm até aqui causado à nossa economia, bloqueando ou atrasando o bem-estar e o progresso social do nosso povo e o desenvolvimento harmonioso e sustentável do país», disse.