O crédito ao consumo voltou a disparar em Portugal, atingindo no final de 2017 o valor mais alto dos últimos 13 anos. E nem os alertas que têm sido feitos nos últimos meses, numa tentativa de estagnar a torneira do crédito, parecem fazer efeito. Em contrapartida, os níveis de poupança continuam a bater históricos de tão baixos que são.
Só em outubro, pelos últimos dados conhecidos do Banco de Portugal (BdP), o total de crédito ao consumo concedido atingiu os 622,1 milhões de euros. Este valor representou um aumento de 13,2% face ao mês anterior e mais 19,8% do que em igual período do ano passado. Uma dimensão que poderá ganhar maior relevo nos próximos meses quando o relatório do BdP contemplar os gastos deste Natal, altura por excelência de maiores despesas e logo maior recurso ao crédito.
A verdade é que esta tendência já fez soar alarmes junto do governador do Banco de Portugal, ao avisar que quer apertar os critérios para a concessão de crédito às famílias. «É fundamental que as instituições financeiras continuem a avaliar adequadamente e de forma prospetiva a capacidade de crédito dos mutuários, evitando a assunção de riscos excessivos nos novos fluxos de crédito, nomeadamente no crédito à habitação», revelou Carlos Costa. Daí admitir que está «a ponderar adotar medidas com vista ao reforço da avaliação, pelas instituições de crédito, da capacidade creditícia dos mutuários particulares».
Entre aos elementos que podem ser ponderados no reforço da avaliação do risco por parte dos bancos incluem-se por exemplo uma maior exigência na taxa de esforço e na apresentação de mais garantias.
Também Bagão Félix já veio criticar este aumento, alertando ainda para o risco de vir a provocar consequências explosivas. «Não aprendemos nada com as crises. Estamos a assistir mais uma vez à facilitação irracional do crédito, quer pelos bancos, como pelas famílias e pelas autoridades públicas», revelou.
Para o ex-ministro das Finanças, as contas são simples: «As famílias têm cerca de 100% do rendimento disponível hipotecado às dívidas que contraíram», criticando desta forma o facilitismo em que as pessoas estão a cair.
A verdade é que Portugal está entre os poucos países que não conta com qualquer tipo de restrições na concessão de crédito. Uma questão que ganha maior relevo junto do crédito à habitação. Dos 28 países da União Europeia, 20 têm limitações impostas pelo supervisor no crédito imobiliário, segundo a última avaliação de política macroprudencial do Comité Europeu de Risco Sistémico, relativa a dados de final de 2016. E é no Sul da Europa que não existem restrições, como Espanha, Grécia e Itália. Além destes países, só a Alemanha, França e Croácia não têm restrições impostas pelo regulador.
E os números falam por si: em Portugal os novos empréstimos têm disparado. Nos primeiros dez meses do ano os bancos portugueses concederam 6,66 mil milhões de euros em novo crédito à habitação, uma subida de 44% face ao mesmo período do ano passado. É o montante mais elevado desde 2010, segundo os dados mais recentes do Banco de Portugal. E esta subida acontece numa altura em que as taxas de juro estão historicamente baixas.
Em contrapartida, a poupança das famílias atingiu o valor mais baixo desde 1999. De acordo com o INE, a taxa de poupança das famílias caiu para 4,4% do rendimento disponível no terceiro trimestre deste ano, ou seja, baixou um ponto percentual em relação ao trimestre anterior. Trata-se do valor mais baixo desde que o INE começou o registo e, desde essa data até agora, a taxa de poupança atingiu um pico de 12% do rendimento disponível no ano terminado no terceiro trimestre de 2002 e registou o valor mais baixo (5%) no ano terminado em junho de 2015.
Cartões para todos os gostos
O que é certo é que a oferta de mais de cem cartões de crédito existentes no mercado nacional também não ajudam nesta tarefa. E este mundo é mais infindável do que pode parecer. Entre os pontos, os descontos e as milhas aéreas de que atualmente tanto se fala, ainda existe uma característica de alguns cartões que apela a uma boa administração da conta bancária: o cashback.
Segundo o último estudo feito pela plataforma ComparaJá.pt, do total de 102 cartões de crédito existentes, apenas 25 isentam os consumidores de custos associados à anuidade ou a comissões de utilização mínima do cartão.
Metade destas opções totalmente gratuitas referem-se a cartões de fidelização de marcas, sendo os restantes disponibilizados por três financeiras – WiZink, Cofidis e Cetelem – e por oito bancos – ActivoBank, EuroBIC, Banco BiG, BPI, Banco CTT, Bankinter, Crédito Agrícola e Millennium BCP.
De salientar que 24 destes 25 cartões gratuitos têm a TAEG no limite máximo definido pelo Banco de Portugal (16,1% para o presente trimestre) e apenas sete incluem algum tipo de seguro.
Além disso, metade destas opções totalmente gratuitas referem-se a cartões de fidelização de marcas, sendo os restantes disponibilizados por três financeiras – WiZink, Cofidis e Cetelem – e por oito bancos – ActivoBank, EuroBic, Banco BiG, BPI, Banco CTT, Bankinter, Crédito Agrícola e Millennium BCP.
Mas nem tudo são vantagens. De acordo com a análise a que o SOL teve acesso, há um campo em que os cartões de crédito sem anuidade se destacam pela negativa quando comparados com os outros cartões existentes no mercado.
Feitas as contas, a TAEG média nos cartões de crédito no nosso país ronda os 15%. Com exceção do ActivoBank, que está em linha com as condições do mercado, todos os outros cartões gratuitos apresentam uma TAEG de 16,1% – como referido, precisamente o limite máximo definido pelo Banco de Portugal para o presente trimestre.
«Daqui se conclui que os bancos e instituições financeiras procuram, através da TAEG, lucrar com os cartões de crédito que isentam os consumidores de anuidades», explica Sérgio Pereira, diretor-geral do ComparaJá.pt.
E além da oferta tradicional da banca há que contar também com os cartões de fidelização e cartões co-branded – como o cartão Fnac ou o cartão Universo, bem como vários outros cartões co-branded da Cetelem, como o Caetano Retail, Conforama, IKEA ou Euronics, ou Wizink CEPSA, ou ainda o cartão Credivisão da Unicre, entre alguns outros.