Agora que Rui Rio foi eleito líder do PSD (poupando-nos novas interpretações das peças para violinos de Chopin), e sendo Rio conhecido, e com mérito, pelo rigor financeiro, estou deveras curioso para saber como irá o PSD criar uma estratégia económica diferente da do PS. Nas eleições legislativas de 2019, o PSD poderá estar condenado a usar como slogan que “lava mais branco”. Isto é, usar a mesma estratégia económica, só que de forma um pouco mais vigorosa.
Poucos sabem disso, pois no meio da algazarra e do chinfrim mediático os assuntos sérios passam muitas vezes despercebidos, mas, a dívida pública, em percentagem do PIB (total da produção do país) já começou a descer em 2017. E, se não houver grandes sobressaltos macroeconómicos, continuará a descer em 2018 e em 2019. Permanece muitíssimo elevada, mas vai no bom caminho. Num artigo publicado aquando da apresentação do orçamento de Estado para 2018, a 13 de outubro, o “Jornal de Negócios” assinalava que Mário Centeno está a proceder à maior redução da dívida pública portuguesa desde os dias em que o falecido Sousa Franco era ministro das finanças, mas com uma diferença crucial: enquanto Sousa Franco pôde contar com importantes receitas provenientes das privatizações (PT; EDP, Cimpor, Brisa), Mário Centeno não pode dispor desses importantes encaixes financeiros.
Desta forma, e sem essas receitas extraordinárias, só há uma forma de reduzir a dívida pública (embora, obviamente, o crescimento económico e a inflação ajudem): com uma muito disciplinada gestão orçamental. No mesmo artigo do “Jornal de Negócios” fazia-se notar que os saldos das contas públicas, se retiráramos da equação os juros da dívida (os “saldos primários”) apresentarão em 2017 e 2018 os maiores excedentes (receitas superiores às despesas) da história da democracia portuguesa, com a exceção do ano em que Jorge Braga de Macedo foi ministro das finanças. Centeno está a usar os atuais bons tempos económicos para reduzir ou eliminar o défice do Estado, e para baixar a dívida pública. Receita de manual, que, por muitos anos, e por diversas razões, não pôde ser usada.
Em suma: o governo está a desapertar o cinto, mas só um bocadinho, pois Mário Centeno está bem ciente que a elevadíssima dívida pública é o maior problema económico português, e está a ataca-lo de frente. O deputado do PS João Galamba, que não tenho – talvez por falha de avaliação da minha parte – na conta de um economista ortodoxo neoliberal, já veio dizer que em 2019 dificilmente haverá condições para aumentar os salários dos funcionários públicos, provocando uma reação adversa e imediata do Bloco de Esquerda.
Prudência a gradualismo são, pois, as palavras de ordem. O que nos traz de volta a Rui Rio. O homem da prudência financeira vai tentar dizer coisas sensatas, como que será preciso reduzir ainda mais o défice do Estado, de forma a que haja margem de manobra para, quando for necessário, gastar mais dinheiro, ou baixar impostos, estimulando dessas formas a economia, preparando-nos pois antecipadamente para enfrentar os maus tempos económicos que, inevitavelmente, um dia chegarão. A este discurso de prudência, o PS deverá responder que um apertar excessivo dos gastos do Estado prejudicaria o crescimento da economia, e vão mostrar a obra feita. “O menor défice orçamental da democracia” e “o maior crescimento económico deste século” são frases que, nos próximos meses, vamos ouvir até à exaustão.
O que não quer dizer que sejam ineficazes. As pessoas gostam de andar com um pouco mais de dinheiro no bolso, e, se para além disso, souberem que as contas públicas estão perto do equilíbrio, tanto melhor. Por isso, não vaticino a Rui Rio grandes sucessos nas suas propostas de rigor orçamental acrescido. Será um inimigo mais difícil para o PS com as suas iniciativas de reforma do Estado, a mais emblemática das quais será reservar cadeiras vazias no parlamento para os votos em branco. É uma proposta original, inteligente, emblemática, e à qual será difícil ao PS opor-se com muita garra, pois os votos em branco representam uma frustração genuína: a das pessoas que não se sentem representadas por qualquer partido político, e mesmo assim se dão ao trabalho de saírem de casa para irem votar.
Com mais propostas de género, e se gerarem debate público, o estado de graça do governo de António Costa, ao fim de dois anos, terá chegado ao fim. Será porventura prematuro escrever-lhe o obituário político, mas parece-me evidente que, pela sua seriedade, originalidade, e austeridade, Rui Rio é um adversário mais difícil para o PS do que seria Santana Lopes.