Alexis Sánchez e Rúben Ribeiro. Dois jogadores de futebol, reconhecidos pela sua habilidade e virtuosismo técnico, que já em janeiro mudaram de clube: o chileno trocou o Arsenal pelo Manchester United, enquanto o português deixou o Rio Ave para apanhar o comboio do Sporting. Em comum têm ainda outra particularidade: na hora de escolher o número que irão envergar na camisola, ambos optaram pelo 7, um número habitualmente destinado aos melhores jogadores.
O “problema” é que, quer no United quer no Sporting, a camisola 7 parece estar amaldiçoada de há uns anos a esta parte. O clube inglês teve em George Best, Bryan Robson, Eric Cantona, David Beckham ou Cristiano Ronaldo a representação perfeita do que é jogar com o 7 nas costas; desde que o astro português saiu (verão de 2009), porém, nunca mais um 7 foi bem-sucedido nos red devils. Michael Owen, avançado de renome – mas contratado já com 30 anos –, usou–a durante três anos, marcando apenas cinco golos na Premier League; Valencia vestiu-a durante uma época e marcou… um golo, voltando a usar o 25 de imediato; Di María, contratado por 85 milhões de euros, falhou redondamente em Old Trafford, saindo ao fim da primeira época; Depay durou mais seis meses, mas também não impressionou ninguém. Alexis, todavia, fez vista grossa a maldições. “Só de pensar nos jogadores que usaram a camisola 7, a tua cabeça começa a sonhar em ganhar a Liga dos Campeões e a Premier League. É isso que espero que aconteça comigo aqui”, frisou o chileno.
No Sporting, a coisa é ainda mais grave. Remonta a 1997, quando Ricardo Sá Pinto, que havia substituído Luís Figo, parte para Espanha (Real Sociedad). O búlgaro Iordanov, um símbolo do clube, herda o 7, mas começa precisamente nessa temporada a sofrer de esclerose múltipla. O brasileiro Leandro Machado foi o seu sucessor e, depois de uma primeira época promissora, enveredou por uma vida noturna e boémia que depressa o tirou dos relvados nacionais. Delfim, Sá Pinto (de regresso), Niculae, Izmailov e Jeffrén: todos sofreram violentamente com lesões. Bojinov e Shikabala só foram notícia por comportamentos antidesportivos e Joel Campbell, que chegou com rótulo de estrela, não apresentou um rendimento consentâneo.
Mais uma vez, o reforço não se atemorizou. Rúben Ribeiro, que nas redes sociais se apresenta como RR7, não se deixou intimidar e assumiu o desafio de quebrar a maldição. Até agora, está a correr bem: foi titular em quatro jogos e fez uma assistência.
No início da temporada, também Álvaro Morata decidiu tentar ludibriar o destino. O avançado espanhol trocou o Real Madrid pelo Chelsea e aceitou ser o 9 dos blues – outro número amaldiçoado desde que Jimmy Hasselbaink deixou o clube, em 2004. Daí para cá, a camisola passou por Kezman (sete golos e despedido do clube por consumo de cocaína), Crespo (13 golos), Di Santo (zero golos), Fernando Torres (45 golos em quatro épocas, mas mesmo assim muito criticado) e Falcao (um golo), além do médio Sidwell (um golo)… e do central Boulah-rouz – que ainda viria a passar pelo Sporting em 2012/13, sem qualquer sucesso. Para já, Morata soma 12 golos em 31 jogos, mas já esteve parado alguns períodos por lesão e não tem escapado a algumas críticas por falta de eficácia na hora de atirar à baliza.
Nem só de maldições associadas a feitos desportivos vivem os números no futebol. Gianluigi Buffon, inquestionavelmente um dos melhores guarda-redes da história do jogo, ofendeu toda a comunidade judaica italiana quando decidiu escolher o 88 no Parma. É que H é a oitava letra do alfabeto, e o 88, para os nazis, simbolizava “Heil Hitler”, ou seja, era a saudação que faziam ao ditador alemão responsável pelo genocídio judeu nas décadas de 30 e 40 do séc. xx. Na altura, o guardião italiano garantiu não saber tal coisa e justificou a escolha com o facto de o número lhe lembrar… quatro bolas.
Tudo começou com Pitágoras As superstições e o desporto são, muitas vezes, dois fatores que se associam. Podem manifestar-se das mais diversas maneiras, mas frequentemente prendem-se com numerologia. Não é só neste campo, todavia: a influência dos mitos e das crenças em aspetos intangíveis alarga- -se a praticamente todas as áreas das sociedades, com especial enfoque nas relacionadas com as artes.
Desde a Antiguidade que os números carregam simbologias muito próprias e identificadas, nomeadamente por intermédio da religião. O seu significado e influência sobre as pessoas rapidamente começou a ser estudado, nomeadamente através dos fundamentos matemáticos de Pitágoras, que muitos historiadores apontam como fundador da numerologia.
É bem conhecida a divergência de sentimentos que o número 13 causa às pessoas. Para muitos, é o número do azar, a evitar a todo o custo – principalmente se insistir em nos aparecer a uma sexta–feira; para outros, é exatamente o oposto. Mais uma vez, estes preconceitos remontam à Antiguidade Clássica: desde aí que o 13 é visto como sendo o número do azar, portador de coisas más. Na Bíblia, é o capítulo 13 do livro do Apocalipse que faz referência ao anticristo e à besta (666 – dele falaremos mais à frente); 13 é também o número de pessoas presentes na Última Ceia – Jesus e os 12 apóstolos. Por essa razão, muitos católicos evitam organizar ou participar em refeições em que 13 pessoas se sentem à mesa. Para os numerologistas, 13 é o número que atua em desarmonia sobre as leis do universo.
Mesmo na Antiguidade, porém, o 13 também podia ter uma conotação positiva: representava o mais poderoso e sublime. Ulisses, por exemplo, era o 13.o elemento do grupo que partiu na Odisseia, de Homero, e escapou ao Ciclope. No tarô, o 13 é a carta da morte, mas no sentido de fim de um ciclo, portanto, de mudança. Por essa razão, há quem o interprete como número de boas vibrações.
O caso mais flagrante de número maldito, porém, será o 666 – mais uma vez, devido à sua relação com a religião. No Livro do Apocalipse, o 666 está associado ao pecado: representa o mal, a imperfeição. Daí para cá, tornou-se o próprio nome, número ou marca da besta (Satanás). “Aqui é preciso sabedoria. O que é inteligente decifre o número da Besta, que é um número de homem; o seu número é seiscentos e sessenta e seis”, pode ler-se no capítulo 13, versículo 18 do Apocalipse.
Além disso, João, o autor do Livro do Apocalipse, utilizou o número para fazer referência ao sexto imperador de Roma: Nero César, tirano que ficou conhecido por ter sido o primeiro perseguidor dos cristãos. Cada letra do alfabeto grego e hebraico tem um valor numérico, cuja soma resulta num código: no caso do imperador, as letras que compõem o seu nome são 200, 60, 100, 50, 6, 200 e 50. Tudo somado dá… 666.
Esse é um exemplo do simbolismo da numerologia na literatura – como tantos que se podem ler em romances como o “Código Da Vinci”, de Dan Brown. No cinema, os 11 primeiros números têm também significados próprios, o que é facilmente identificável em vários dos filmes mais celebrados e reconhecidos. O 10, por exemplo, é tido como o número da perfeição, enquanto o 3 representa muitas vezes um triângulo (seja amoroso, seja a outros níveis da existência humana) ou a confirmação de provérbios ou ditados populares (“À terceira é de vez” ou “Não há duas sem três”).
Os casos mais flagrantes serão aqueles em que o próprio título do filme já é um número, como “Seven” ou “Número 23”. O 7 simboliza a perfeição, a realização, a concretização: são sete as virtudes, sete as notas musicais, sete as cores do arco–íris, sete as maravilhas do mundo, sete os dias da semana. Mas também os pecados mortais, fundamento do filme de David Fincher protagonizado por Brad Pitt, Morgan Freeman e Kevin Spacey. O “Número 23”, por seu lado, narra a história de Fingerling (interpretado por Jim Carrey) e da sua obsessão com o enigma do 23, também conhecido como Lei dos Cincos, segundo a qual tudo na vida pode ser relacionado com o número 5 – e 2+3 é igual a cinco.
A primeira cena de “Matrix Reloaded” – a sequela do aclamado “Matrix”, lançado em 1999 – mostra Neo, o protagonista, a morrer em frente ao quarto 303, sendo o seu quarto o 101. Esta é uma referência explícita ao quarto 101 do livro “1984”, de George Orwell, onde um prisioneiro é obrigado a enfrentar a sua maior fobia, e é desde então utilizado na cultura pop para simbolizar um quarto onde algo é colocado para nunca mais ser encontrado – precisamente o que as máquinas queriam que acontecesse com Neo.
O clube dos 27 Esta “maldição” atinge diretamente a indústria musical e refere-se a artistas que faleceram aos 27 anos. O “clube dos 27” é constituído por Brian Jones (membro fundador dos Rolling Stones), Jimi Hendrix, Janis Joplin, Jim Morrison, Kurt Cobain e Amy Winehouse.
E da China, onde o número 10 significa dualidade, o 5 totalidade e o 6 riqueza, chega o exemplo mais claro de como uma superstição pode manifestar-se na vida quotidiana de uma sociedade: para os chineses, o número 4 pura e simplesmente não existe. E tudo porque o som do mesmo é muito parecido com o da palavra “morte”; por essa razão, tentam omiti-lo em tudo o que for possível – como matrículas de carros ou mesmo andares de prédios. É verdade: é muito raro encontrar, tanto na China como em Macau, um prédio que tenha quarto andar – passa diretamente do terceiro para o quinto. Quando há o quarto, as casas que o compõem são mais baratas do que as restantes. Estranho, mas real. É a força dos números.