João saiu cedo de casa para passear o Pó d’Arroz como faz todos os dias. Eram 7 da manhã quando chegou ao parque junto a sua casa, na Ajuda e, enquanto entra no café para comprar o pequeno-almoço, solta o Weimaraner de dois anos e meio para que possa explorar as redondezas.
Apesar de ter tentado incutir ao animal que não se comem coisas do chão, às vezes o instinto fala mais alto. Quando se sentava numa das mesas do parque para comer o pequeno-almoço que tinha trazido do café, percebe que o Pó estava a ser atraído por bocados de pão que estavam no jardim e que João pensou serem para alimentar os pombos. No entanto, quando se aproximou, percebeu que em cada pedaço de pão estavam cravados três pregos de forma quase impercetível. “Percebi logo ali que não era comida para os pombos. Não tenho dúvidas de que quem pôs aquilo ali tinha a intenção de magoar um animal”, esclarece, em declarações ao i.
Em vez de denunciar o caso à polícia, por achar que ficaria esquecido, preferiu fotografar a situação e divulgá-la nas redes sociais. A mensagem chegou a mais de um milhão de pessoas, algumas delas com relatos semelhantes. “Um dos comentários falava em alfinetes escondidos em fatias de queijo”, conta. Além do impacto social, João recebeu também o contacto do presidente da junta que, sensível ao tema, fala em fechar o parque à noite ou pôr alguém a fazer vigilância. Num cenário ideal, o autarca referiu a hipótese de criar um parque para cães no bairro, uma vez que cerca de 60% da vizinhança – contas feitas por alto pelo João – tem um animal em casa.
Se a ideia for avante, este parque vai juntar-se aos dois já existentes na cidade: um no Jardim Fernando Pessa, no Areeiro, e o segundo no Jardim Braancamp Freire, em Arroios. Aliás, apesar deste tipo de episódio do pão armadilhado manchar a reputação da cidade, a verdade é que Lisboa está cada vez mais dog-friendly. Está prevista a criação de vinte parques dedicados aos cães, com bebedouros, pontos de água para lavagens, circuitos de agilidade e wc caninos.
Cocó no chão
E ao falar de wc caninos – ou da falta deles – tocamos num ponto sensível para quem se passeia por Lisboa.
Não são raras as vezes em que os desvios são obrigatórios para evitar dejetos e ainda ontem, logo de manhã, à porta de um prédio de Arroios vimos uma mensagem dirigida “à besta” que deixa diariamente os dejetos do seu animal no passeio.
Situações como estas acontecem diariamente na cidade, apesar de todas as campanhas de sensibilização feitas principalmente pelas juntas de freguesia que, desde 2014, com a passagem do pelouro da higiene urbana da câmara para as juntas, passaram a estar responsáveis pela limpeza das ruas.
Foi nessa altura que algumas freguesias passaram a ter o chamado Motocão, uma mota com aspirador e depósito para dejetos caninos e foi também nesse ano que algumas freguesias, num rasgo mais inovador, apostaram no marketing. O humorista Nuno Markl deu a cara por um spot da freguesia de Benfica, no qual encarnava uma espécie de fiscal que levava a casa dos donos, os dejetos que tinham deixado nas ruas.
Aproveitando esta onda de sensibilização, a Câmara de Lisboa divulgou que, em 2014, foram contabilizadas 2084 infrações ao regulamento de resíduos urbanos da cidade, o que inclui o depósito incorreto de lixo e os dejetos caninos deixados na via pública.
As coimas por atos prejudiciais ao asseio na via pública têm um valor mínimo de 24,25 euros. Relativamente aos dejetos caninos, o valor mínimo é de 48,50 euros. Nesse ano, a câmara arrecadou mais de 14 mil euros em coimas, número que, apesar do pedido feito pelo i, a câmara não atualizou.
Já no Porto, não existem registos de multas passadas por dejetos caninos deixados no chão da cidade. O gabinete de comunicação garante ao i que nunca chegaram aos serviços municipais quaisquer queixas relacionadas com o assunto.
Fonte da autarquia explica que o trabalho tem sido focado na promoção de bons comportamentos e que a câmara tem vindo a aumentar a distribuição de sacos dispensadores para que os donos tenham onde depositar os dejetos de forma acondicionada.