No quarto episódio de “Subsolo” Jadeja Pradeepsinh protagoniza uma cena que tanto é ficção como poderia ser documentário, mas isso veremos depois. Quando descobrirmos que o seu nome é esse e não Nazim, um dos cinco protagonistas da websérie que estreia esta noite, às 21h, na RTP Play e no YouTube, os seus cinco episódios em simultâneo. E Jadeja, que nunca tinha feito nada em cinema ou como ator – na verdade trabalhava numa mercearia da Morais Soares quando lhe entraram pela loja a perguntar se queria entrar numa série – terá um papel central nesta história contada a partir da Lisboa que conhecem, e onde fomos encontrá-los, à Rua do Benformoso.
Porque Lisboa não é toda postais, não podia. Lisboa, a verdadeira Lisboa e a que conhecem estes cinco realizadores todos nascidos depois de 1990, é muito Intendente, Benformoso, Morais Soares. Alameda, Almirante Reis. E foi a partir daqui, do lugar que conhecem e que pouco ou nada tem contado a ficção nacional, que Tiago Simões, Joana Peralta, Victor Ferreira, Marta Ribeiro, da Videolotion (a produtora de “Verão Danado”, de Pedro Cabeleira) e Maria Inês Gonçalves, que se juntaria a eles como realizadora convidada, partiram para “Subsolo”.
Cinco episódios de aproximadamente 15 minutos, para cinco realizadores – e cinco protagonistas, que são quem dá o título a cada um dos capítulos. Rúben, João, Margarida, Nazim e Júlia. Em comum, diz Joana, têm “estar todos à procura de quem são, do lugar que ocupam”. O mais novo é Rúben, interpretado pelo irmão mais novo de Pedro Cabeleira, um dos fundadores da Videolotion, que com “Verão Danado”, que estreou no último verão em Locarno, acabou por ter de abandonar “Subsolo”, que começara a ser escrito por Tiago Simões no verão de 2016, depois de um convite da estação pública para a produção de uma websérie para o RTP Lab – um laboratório criativo e experimental para produção de conteúdos numa lógica multiplataforma.
Um novo caminho Experimental é certamente esta websérie que se vem juntar a “Casa do Cais”, estreada ainda este mês, neste novo formato de episódios curtos, adaptados às plataformas digitais. Num registo a aproximar-se do cinema, território que os realizadores conhecem melhor do que o televisivo, afinal, “Subsolo” veio de uma vontade de abrir caminho por um território pouco explorado na ficção televisiva nacional.
“Queríamos fazer conteúdo de jovens para jovens, que é uma coisa que até aqui não existia”, nota Joana Peralta, realizadora e produtora da série que, com uma equipa pequena e um orçamento apertado, acabariam por rodar em apenas 15 dias – três para cada episódio. “Tínhamos só os ‘Morangos com Açúcar’ e queríamos fazer uma coisa um bocadinho diferente. Era uma necessidade muito lógica, porque estamos a começar agora a nossa carreira e queremos fazer cinema. Mas para além do cinema português que, com altos e baixos, tem já o seu percurso, há este outro caminho.”
Um caminho para criar na ficção televisiva um novo espaço para contar a vida real de uma geração que até “Casa do Cais” não tinha ainda tido voz. Geração que poderia dizer-se a dos millennials mas que eles dizem de outra maneira: a dos que, como todos eles e os protagonistas, nasceram depois de 1990. A dos que cresceram a acreditar que seriam especiais, que poderiam ser o que quisessem, para à entrada para a vida adulta descobrirem que talvez não seja tão assim.
“Se calhar para uma pessoa da nossa idade não faz muito sentido fazer planos a longo prazo”, diz Tiago Simões. “É um bocadinho ir vivendo um dia de cada vez e depois ver onde é que isso vai dar, e isso está muito presente nesta série”, contada ao longo de apenas um dia e em torno de uma festa em casa de um dos personagens, com o qual todos eles, em momentos diferentes da noite, acabam por se cruzar. “Apesar de estarmos focados só num dia e por aí não [ser possível] explorar muito os objetivos de cada um para a sua vida, no caso do João sente-se um bocadinho isso, porque está sempre a repetir o mesmo. Qual será o momento em que ele pára e pensa ‘ok, hoje não vou fazer uma festa, se calhar vou sair de casa, tomar um café e pensar no que vou fazer amanhã que não seja isto outra vez?’. Isso que vemos nessa personagem está muito ligado a uma ideia de uma superproteção”, em que diz viver a sua geração. “Por um lado não vou fazer planos a longo prazo porque não vale a pena, as coisas estão um bocado complicadas. Mas, por outro, é essa proteção que também te permite isso. Essa garantia de que amanhã vai estar tudo bem que te pode levar para esta espécie de espiral.”