Até há bem pouco tempo, o 28 mais famoso de Lisboa era o elétrico que começa em Campo de Ourique e acaba no Martim Moniz. Não que se deixem de formar filas de perder de vista cheias de turistas desejosos de brincar à Lisboa do antigamente. Continua a havê-los e em força, para bem do país e mal de quem só quer apanhar o único transporte disponível para subir algumas das colinas mais íngremes da cidade.
Não sei se o Jamie Oliver, entre tachos e panelas, comida saudável e panquecas cheias de glúten, ouviu falar deste que pode ser já considerado o número da sorte de Lisboa. Mas a verdade é que foi exatamente esse número de porta – na Rua da Escola Politécnica – o escolhido para abrir aquele que é o mais recente restaurante de uma cadeia que conta já com mais de sessenta espaços em todo o mundo.
Deixamos passar o hype, as filas, os primeiros olhares curiosos e avançamos uma semana depois da abertura, que se fez da forma mais discreta possível. “Simplesmente abrimos a porta às 19 horas e esperámos para ver o que acontecia”, explica Helena Farinha, responsável de marketing, recuando até àquela sexta-feira, dia 26 de janeiro, a escolhida para a inauguração do primeiro restaurante do chef britânico em Portugal.
A sala ficou bem composta logo no primeiro jantar e nos dois dias seguintes já era difícil conseguir uma mesa sem reserva. E pensar numa refeição relaxada ao fim de semana, só lá para março. “O melhor é tentar logo no início da semana ou vir à aventura na esperança de alguma desistência”, refere Helena, a quem somos entregues depois de um caloroso “Boa tarde, bem-vindos ao Jamie’s Italian”.
Apesar dos 500 metros quadrados repartidos por três pisos e dois terraços, aqui ninguém se sente perdido. Primeiro, todos os clientes são recebidos por um funcionário que indica o caminho para a mesa ou propõe um cocktail no bar da entrada, enquanto esperam pela sorte. “Somos só dois”, arrisca um casal, meio a medo. “Têm reserva?”, pergunta a funcionária, já a fazer scroll down na longa lista de nomes escritos no iPad. “Não. Tentámos ligar mas ninguém atendeu e decidimos arriscar”. É que é mesmo isso, um risco, mas que desta vez – por ser segunda-feira ao almoço – só dá direito a uns 30 minutos de espera.
É a pensar exatamente nestes momentos que foi criado um bar logo à entrada, onde é possível começar a salivar pelos pratos que se veem sair de uma cozinha aberta, mas já de copo na mão. Da lista fazem parte vinhos portugueses e italianos, sangria e cocktails “clássicos” como a caipirinha, “refrescantes” como o mojito, “contemporâneos” como a margarita e “aborrecidos” como os não alcoólicos [esta última designação é da nossa autoria, mas fica a sugestão]. Ficamo-nos pela água natural [os aborrecidos somos nós], porque é hora de almoço e ainda há este texto para escrever. Mas fica a dica de quem está atrás do balcão: o Aperol Spritz – com Aperol, soda e prosecco – é ótimo para abrir o apetite.
Agora sim, a comida E não é que vamos a mais de meio da prosa e ainda nem falámos da comida? Não admira, o espaço leva o seu tempo de contemplação.
A madeira salta à vista como material de destaque, a dar o ar rústico que o restaurante apregoa. Está nas estantes cheias de livros do chef, nas paredes onde são pendurados grandes espelhos e nas mesas, onde à nossa espera estão já os talheres e um guardanapo de pano com a palavra ‘Jamie’s’ bordada.
E se é de madeira que falamos, venha daí essa tábua de petiscos. A classic meat, com assinatura do chef, vem com carnes frias, queijos, pickles e azeitonas. Mas vamos para a vegetariana, guardando assim o pecado para o prato principal. O mix de vegetais grelhados, mozzarella, grissini e molho de feijão e alho vem servido numa tábua de madeira feita por uma empresa de Pernes, em Santarém, à qual Jamie recorre há vários anos para abastecer todos os seus restaurantes.
Com duas latas de tomate na mão, a funcionária avisa: “Vou pousá-la aqui, ok?”, provando que, tal como os restantes 40 colaboradores que trabalham no restaurante em Lisboa, sabe de cor aquilo que aprendeu nos meses de formação noutros restaurantes do grupo. “Aqui não servimos só por servir, todos têm que saber tudo sobre o que estão a dar aos clientes”, explica a responsável de marketing. É por isso que nada é posto na mesa sem uma explicação prévia, até mesmo o facto de Jamie um dia ter servido a tábua ao seu mentor, o chef italiano Gennaro Contaldo, recorrendo às latas para que, ficando mais alta, se destacasse, aproximando quem está na mesa dos aroma dos produtos.
E agora que nos sentimos um bocadinho mais próximos de Jamie que, atenção, virá a Lisboa – uma visita ainda sem data marcada –, decidimos dar um passo em frente nesta relação ao pedir, para prato principal a pizza preferida da Jools, mulher do chef. A “Julieta” é uma marguerita, mas com o pormenor de vir recheada de tomate assado em cozedura lenta e “a melhor mozzarella de búfala”, diz-nos a ementa.
Lembram-se de falarmos em deixar o pecado para o prato principal? Pensávamos na altura só na gula, sem pensar na inveja em relação à Jools, que pode ter uma marguerita destas todos os dias.