O mundo da religião sempre foi um mistério para mim, apesar de ser batizado e de ter vivido no seio de uma família profundamente católica. Acho mesmo que a minha mãe viveu mais uns anos por toda a fé que tinha em Deus. Recordo-me de a ver rezar nos momentos de maior descrença e de como isso lhe fazia bem. Tenho, portanto, o máximo de respeito que alguém pode ter pela Igreja Católica, independentemente de olhar para os ‘podres’ da religião.
Acho, pois, que só é católico quem quer e, dessa maneira, sujeita-se aos seus mandamentos, embora todos saibamos que a vida muda bastante e que a própria Igreja o faz. Se assim não fosse ainda estávamos no tempo da caça às bruxas e das missas em latim.
Posto isto, são de difícil compreensão as palavras do cardeal patriarca de Lisboa sobre um assunto sobre o qual nada entende. Diz, e não percebi se foi a brincar, que os católicos recasados se devem abster de ter relações sexuais. Mas isto faz algum sentido? Por absurdo, esta teoria não contraria uma das máximas do casai e multiplicai-vos? Ou será que D. Manuel Clemente acredita que há mais virgens Marias na terra?
A Igreja há muito que convive mal com o prazer carnal e não só. Entrar numa igreja que professe o catolicismo, às vezes, é um susto absoluto. Recordo-me de estar num casamento em que se bateram palmas depois dos noivos darem o inevitável beijo e o padre ter ameaçado que expulsava os presentes – não percebi se também ameaçou que descasava os jovens noivos… Claro que pode dizer-se que a Igreja é como é e que só a aceita quem quer – felizmente não vivemos em nenhum país muçulmano radical em que todos são obrigados a professar o culto a Alá.
Mas, por este caminho, a Igreja Católica tenderá sempre a perder fiéis, pois ninguém quer estar numa religião onde se ‘obriga’ as pessoas a não terem relações sexuais. Se a abstinência nem para os padres é uma certeza, o que dizer dos casais casados e que dormem na mesma cama?
Afirmar que foi o que o Papa Francisco defendeu parece-me uma falácia de todo o tamanho. Francisco pode ser atacado por todos os lados, mas é indiscutível que é o líder da Igreja Católica que mais tem defendido os casais católicos divorciados, além de falar dos homossexuais como nenhum outro o tinha feito, aceitando-os tranquilamente.
D. Manuel Clemente tornou-se pois notícia um pouco por todo o mundo que fala português e pelas piores razões, embora lhe assista todo o direito de dizer o que muito bem entende. O Opus Dei deve estar, seguramente, de acordo, mas olhando para os baixos índices de natalidade não se percebe como é possível defender a abstinência sexual de casais casados.
Calculo que os católicos casados em Portugal se devem ter sentido muito mal, já que foram considerados pecadores. É certo que é uma matéria que só a eles diz respeito e que os não católicos, se calhar, ficaram mais indignados do que os verdadeiros recetores da mensagem de D. Manuel Clemente.
Resumindo: quando o Papa Francisco pretende dar uma imagem de abertura ao mundo, em que a Igreja deixe de ser um lugar de medo, mas que passe a ser de esperança e alegria, há sempre quem apareça a lembrar a castidade, o silêncio e a tristeza. A Igreja não pode dar mais espaço às seitas que proliferam pelo mundo, onde os pastores não passam de vendilhões do tempo, mas que transmitem uma ideia de prosperidade e de felicidade.