O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ouviu ontem as queixas das câmaras municipais por causa da limpeza das florestas. À saída do encontro, o presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), Manuel Machado, garantiu que “não é exequível” cumprir a lei que responsabiliza as autarquias pela limpeza dos terrenos.
A medida, incluída no Orçamento do Estado para este ano, define que os proprietários devem proceder até 15 de março à limpeza das florestas. As autarquias têm, até 31 de maio, de garantir “a realização de todos os trabalhos de gestão de combustível, devendo substituir-se aos proprietários e outros produtores florestais em incumprimento”. Se não o fizerem, podem ser alvo de um corte de 20% nas verbas do Fundo de Equilíbrio Financeiro (FEF). O poder local conta com uma linha de crédito de 50 milhões de euros para executar esta tarefa.
Os municípios, que já pediram uma reunião com o primeiro-ministro, António Costa, exigem que esta norma seja alterada para “ser clarificado, de modo a ser extremamente precisa a responsabilidade de quem têm que fazer o quê, a custas de quem, como e com que poderes”. Manuel Machado criticou ainda a “postura impositiva” do governo. “Não aceitamos, obviamente, que queiram impor-nos aquilo que quem nos quer impor não fez”.
Um disparate
Os autarcas socialistas acompanham as críticas. Rui Santos, presidente da Associação Nacional de Autarcas do PS, garante ao i que “é impossível fazer em dois meses aquilo que não se fez em 40 anos”. Para o autarca socialista, “não é possível fazer tudo em todo o lado ao mesmo tempo e é preciso definir as áreas de maior risco e dotar o fundo financeiro de mais dinheiro para que se possa, de facto, agir”.
Rui Santos considera ainda “um disparate” a possibilidade de “penalizar os municípios por algo que é impossível de cumprir e que o Estado central não foi capaz de fazer”.
Álvaro Amaro, presidente dos Autarcas Social-Democratas, também se revê nos reparos feitos pela ANMP e, em declarações ao i, considera que “o governo está a seguir um mau caminho”. O presidente da Câmara da Guarda lamenta que em vez de apostar na “cooperação”, o governo tenha optado pela penalização. “A isto pode estar subjacente um certo espírito de desculpabilização do governo no caso de alguma coisa não correr bem”, diz.
Não há contestação
A ANMP já reuniu com o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, para exigir mudanças à lei. O ministro garantiu, há menos de uma semana, que “não há contestação nenhuma” das câmaras municipais. “Há trabalho em conjunto para fazer mais e melhor. Ninguém nos perdoará se não fizermos até maio, isto é, até ao início do próximo verão, tudo”.
Eduardo Cabrita explicou que “a partir de 16 março, se os proprietários não limparem os terrenos, as autarquias, com o apoio das forças de segurança, irão poder substituir-se nessa atividade, responsabilizando os proprietários”.
Os municípios, após o encontro com o ministro da Administração Interna, decidiram solicitar uma audiência ao primeiro-ministro para discutir a revisão da lei . “A ANMP entende que o previsto no art.º 153º da Lei do Orçamento do Estado 2018 não é exequível, quer pelos prazos estabelecidos, quer pela falta de cadastro da propriedade rústica, quer pela ausência de recursos para execução das tarefas exigidas. O espírito da lei passa, claramente, a responsabilidade para os municípios e para os autarcas, pelo que, se acontecer alguma catástrofe, os autarcas serão responsabilizados pessoal, civil e criminalmente, enquanto o Estado Central fica completamente fora do processo”, afirma a ANMP.