Sporting. Gelson e Rúben: a terna amizade que pode prolongar a seca leonina

O golo ao Moreirense surgiu nos descontos e emocionou o extremo leonino; a dedicatória ao central caído em desgraça por baixo da camisola, porém, já estava planeada de antemão e nem o amarelo visto previamente pesou na hora da comemoração. Agora, além de continuar longe do amigo de sempre, Gelson Martins (provavelmente o jogador mais…

Começa a ser um clássico deste campeonato: o Sporting a sofrer, a sofrer… e a vencer nos últimos minutos – regulamentares ou não. O coração dos leões é, nesta fase, a sua grande força e provavelmente o único aspeto passível de elogios, mas no jogo com o Moreirense foi decisivo para o bem e para o mal.

Mais uma vez, o leão não desistiu nunca e foi premiado pela persistência e tenacidade: aos 90’+2’, uma trivela de Gelson Martins desviou no capitão André Micael e traiu o desamparado Jhonatan Luiz, conferindo uma suadíssima vitória aos comandados de Jorge Jesus. A grande tristeza para os verde-e-brancos – que até já estavam há meia-hora a jogar com dez, depois da expulsão de Petrovic –, porém, chegaria de mãos dadas com o golo: após faturar, Gelson tirou a camisola para mostrar uma dedicatória ao amigo de sempre, que atravessa uma fase muito complicada em Espanha. “Cu bo ti fim de mundo RS35”, que é o equivalente crioulo para “Contigo até ao fim do mundo, RS [Rúben Semedo] 35”.

Em condições normais, o gesto de Gelson seria tudo, menos condenável. Louvável, diremos até, apesar dessa hedionda regra – a necessitar de revisão urgente – que determina a amostragem obrigatória de um cartão amarelo a um jogador que tire a camisola em qualquer momento do encontro, o que normalmente se verifica nos festejos de um golo há muito ambicionado.

O problema, neste caso concreto, é que Gelson Martins havia visto outro amarelo apenas cinco minutos antes, ao agarrar o antigo colega Dramé. Ato contínuo, o árbitro Tiago Martins viu-se obrigado a mostrar novo amarelo – e consequente vermelho – ao internacional português, que só por essa altura caiu em si e percebeu que a dedicatória a Rúben Semedo, preso preventivamente em Espanha e indiciado por vários crimes, entre os quais tentativa de homicídio, lhe acabara de custar a presença no clássico de sexta-feira com o FC Porto, no Dragão, que pode constituir um marco neste campeonato – uma vitória leonina colocava a prova em chamas; um empate favorece essencialmente o Benfica; uma vitória portista, por seu lado, praticamente tira o Sporting da corrida.

Emoções fortes em perspetiva, que Gelson terá de ver da bancada. “O Gelson emocionou-se, tem no coração o Rúben Semedo e quis oferecer o golo ao Rúben Semedo. Na sexta-feira, vai para a bancada para ao pé do Rúben Semedo”, atirou Jorge Jesus após o apito final, visivelmente agastado com a situação. Percebe-se bem, até porque Bas Dost, o outro abono de família dos leões, continua preso por arames e com a presença no Dragão bem longe de estar garantida.

Falhou, no entanto, Jesus num aspeto: é que, se nada mudar entretanto, mesmo estando na bancada Gelson continuará longe do amigo RS. A justiça espanhola assim o dita.

Liedson e os outros O “apagão” de Gelson pode, de facto, vir a custar muito caro ao Sporting. Para já, significa “apenas” a exclusão do extremo de um jogo fulcral para os leões. Um cenário que, curiosamente, está longe de ser novidade para o conjunto de Alvalade, que ao longo dos últimos anos tem experienciado diversas situações semelhantes.

De 2013/14 para cá, por exemplo, William Carvalho já falhou um jogo com o Benfica e outro com o FC Porto por acumulação de amarelos. É certo que ambos ocorreram em momentos normais de jogo – faltas sobre adversários –, mas em ambas as situações ficou a sensação de que o trinco poderia ter evitado as entradas e assim ter-se protegido para poder jogar os encontros contra os maiores rivais.

O caso que continua a assombrar a alma dos sportinguistas, porém, remonta a 2004/05 e tem Liedson como protagonista. Na véspera do Benfica-Sporting que viria a decidir o título (com o tal golo de Luisão aos 87’), o Levezinho, figura-maior da equipa leonina durante quase uma década, viu um amarelo nos descontos de um jogo em Guimarães por… pontapear uma bola para a bancada com o encontro interrompido.

Curiosamente, essa não foi uma situação virgem para o avançado brasileiro (mais tarde internacional por Portugal), que já nessa época, na primeira volta, havia ficado impedido de defrontar… novamente o Benfica. E outra vez por um gesto no mínimo estranho: logo ao minuto 15, outra vez perante o Vitória de Guimarães, ao ver que não chegava com a cabeça a um cruzamento de Carlos Martins, Liedson tocou na bola com a mão. Aí, acabou por ser salvo por uma brecha no regulamento que seria aproveitada da melhor forma pelos leões: o Sporting antecipou o jogo para a Taça, com o Pampilhosa, e o Levezinho limpou o castigo nesse jogo. As regras viriam a ser alteradas posteriormente, sendo introduzida a regra da obrigatoriedade de um castigo por acumulação de cartões amarelos ser cumprido na mesma prova onde o jogador os viu. Por curiosidade, refira-se que Liedson jogou de facto esse encontro com o Benfica… e marcou os dois golos da vitória leonina (2-1).

Já esta época, Corona foi obrigado a falhar o clássico no Dragão entre o FC Porto e o Benfica depois de ter sido expulso no aziago 1-1 dos dragões no terreno do Aves. O extremo mexicano já tinha um amarelo, visto aos 41’ por travar um contra-ataque dos homens então às ordens de Lito Vidigal, e acabaria por ver o segundo aos 52’, na sequência de uma entrada muito dura sobre Vítor Gomes.

Em relação ao Benfica, que na sexta-feira vai estar de cadeirinha a assistir ao duelo entre dragões e leões, há também uma situação que ainda hoje pesa sob os ombros de Carlos Xistra, o árbitro que expulsou Fabrizio Miccoli aos 82’ do Benfica-Estrela da Amadora de 2006/07, tirando assim o avançado italiano do FC Porto-Benfica da semana seguinte. Na altura, o juiz de Castelo Branco justificou o segundo amarelo a Miccoli desta forma: “Tentou tirar desforço e correu para o adversário.” Curiosamente, o jogador em questão, o lateral-direito Rui Duarte, afirmou no fim do encontro que o italiano – amarelado em primeira instância aos 67’ por seguir uma jogada já interrompida por fora-de-jogo – “não fez nada” para ver o segundo amarelo: “Não percebi porque é que ele foi expulso. Eu fiz falta mas ele nem me tocou, acho que foi injusto.” Para a história ficou a ausência de Miccoli, então um dos mais influentes atletas encarnados, e o resultado final no Dragão: 3-2 para o FC Porto, com golo decisivo do improvável Bruno Moraes nos descontos.