Tônia Carrero. Morreu um dos ícones da televisão brasileira aos 95 anos

Ficou conhecida em Portugal na década de 80. Considerada um ícone da televisão brasileira, protagonizou dezenas de telenovelas, mas tinha uma longa carreira no teatro e no cinema

Tônia Carrero morreu na noite de sábados aos 95 anos devido a paragem cardíaca, durante uma cirurgia numa clínica privada, onde estava internada desde sexta-feira devido a uma úlcera. Era uma das atrizes mais consagradas do Brasil. Participou em 54 peças, 19 filmes e 15 telenovelas. Ficou conhecida em Portugal pela sua participação em telenovelas como “Sassaricando” – com a personagem Rebeca – ou “Kananga do Japão”.

Maria Antonietta de Farias Portocarrero, o seu nome de batismo, era filha de um militar, o marechal Hermenegildo Portocarrero, e de Zilda de Farias. Nasceu no Rio de Janeiro a 23 de agosto de 1922 e desde cedo mostrou a sua vocação para os palcos. Mas o seu casamento com apenas 17 anos de idade – com o realizador e também artista plástico Carlos Arthur Thiré – trocou-lhe as voltas e acabou por se formar em Educação Física, em 1941. No entanto, seis anos depois e em Paris, onde estava a viver temporariamente com o marido, tomou a decisão que iria tornar-se irreversível: ser atriz. E foi na capital francesa que fez a sua formação artística, tendo a oportunidade de ter como professores grandes atores franceses, como Jean-Louis Barrault.

Tônia Carrero regressou ao Brasil com 25 anos e estreou-se no grande ecrã com “Querida Suzana”, de Alberto Pieralise, em 1947, ao lado de Anselmo Duarte, Nicette Bruno e da bailarina Madeleine Rosay. Seguiram-se “Caminhos do Sul” ou “Perdida de Paixão”, de Fernando de Barros, tornando-se uma das divas do cinema brasileiro na década de 1950. 
Em 1949 contracenou com Paulo Autran em “Um Deus Dormiu lá em Casa”. Mais tarde, acabaria por fundar com aquele e com o italiano Adolfo Celi, na altura seu marido, a Companhia Tônia-Celi-Autran. 

Estrela televisiva No entanto, foram as telenovelas a consagrá-la definitivamente como estrela popular. “Pigmalião 70” foi a primeira em que participou, em 1970. A sua personagem fez enorme sucesso, ao ponto de o seu penteado se ter tornado moda e ganho nome próprio: pigmalião. Mas depois desta personagem seguiram-se muitas outras que marcaram os espetadores, que nunca esqueceram a sua imagem: voz rouca, olhos claros e sorriso sedutor

Dez anos depois, a sua Stella Simpson, personagem que interpretou em “Água Viva”, marcou um tempo pela forma emancipada e desassombrada com que assumia a condição feminina. “Sassaricando”, de 1987, e “Kananga do Japão”, de 1989, foram outras telenovelas em que deixou a sua marca.

Em 1986, Tônia Carrero escreveu o livro “O Monstro dos Olhos Azuis”, que reuniu histórias da infância da atriz, e em outubro desse ano foi vítima de um sequestro, do qual escapou ilesa. Recebeu o Prémio Shell pelos 50 anos de carreira e faz a última aparição no teatro na peça “Um Barco para o Sonho”, dirigida por um dos quatro netos, Carlos Thiré.

Trabalhou pela última vez em televisão em 2004, integrando o elenco de “Senhora do Destino” e interpretando-se a si mesma num episódio de “Um Só Coração”. Quatro anos depois seria a vez de se despedir do cinema, com a participação em “Chega de Saudade”, de Laís Bodanzky. Nessa altura, já sofria há nove anos da hidrocefalia oculta que a foi debilitando – doença que provoca a acumulação de líquido cefalorraquidiano nas cavidades ventriculares cranianas, causando aumento na pressão intracraniana sobre o cérebro e aumento do volume do crânio –, dificultando-lhe a capacidade de comunicação e de movimento, e obrigou a atriz a retirar-se para o seu apartamento no Leblon, longe dos olhares atentos do público.

O seu único filho é o também ator Cecil Thiré. Miguel Thiré, Luísa Thiré e Carlos Thiré, seus netos, seguiram também carreira na arte da representação. A atriz era a matriarca de uma família de artistas da sétima arte, com quatro gerações. 

O ícone que despertou muitas paixões foi casado três vezes: com Carlos Artur Thiré (casamento que durou de 1940 a 1950 e com quem teve um filho), Adolfo Celi (entre 1951 e 1962) e com o empresário César Thedim (entre 1964 e 1977). Depois disso manteve outros relacionamentos, mas não quis voltar a casar. Chegou a admitir estar arrependida por não ter respondido à tentativa de conquista por parte de Juscelino Kubitschek, presidente do Brasil entre 1956 e 1961, e também do grande poeta e compositor Vinicius de Moraes, que transformou o seu desgosto amoroso numa canção assinada com Baden Powell, “Formosa”.