Podia ser um casal que havia bebido demasiado ou tomado substâncias ilícitas. Ou que simplesmente não tinha um melhor local para onde ir. Sergei Skripal, de 66 anos, e uma mulher com cerca de metade dessa idade foram encontrados num banco de um centro comercial de Salisbury, cidade no sul da Inglaterra, em circunstâncias que ainda permanecem por explicar.
“Ela estava mais ou menos apoiada nele, parecia que tinha desmaiado”, disse uma testemunha à BBC. O homem, por sua vez, “fazia movimentos bastante estranhos com as mãos, enquanto olhava para o céu. Parecia que tinham tomado alguma coisa muito forte”. Sem saber o que podia fazer para ajudar, a testemunha limitou-se a afastar-se.
O casal acabaria por ser levado para o Hospital Distrital de Salisbury, onde se encontra nos cuidados intensivos. Ao descobrir-se a identidade do homem, o enredo começou a complicar-se. A vítima é o coronel Sergei Skripal, um antigo espião russo que em agosto de 2006 foi considerado culpado de alta traição por um tribunal militar de Moscovo, por alegadamente ter passado, desde a década de 90, segredos russos aos serviços secretos britânicos, entre os quais listas de agentes russos a atuar em solo europeu, informação pela qual teria recebido cerca de 100 mil euros. Seria condenado a 13 anos de prisão e despojado de todos os títulos e cargos.
Mas em 2010 recebeu um indulto do presidente Medvedev e foi libertado no âmbito de um programa de troca de prisioneiros entre a Rússia e os Estados Unidos: dez russos libertados pelo FBI contra quatro espiões que se encontravam em prisões russas – além de Skripal, mais três agentes, entre os quais Anna Chapman, uma russa que depois de viver em Inglaterra e nos Estados Unidos trabalhava no seu país natal como modelo e apresentadora de televisão. Quando foi detida, em 2010, a imprensa apodou-a de “a mais charmosa agente secreta russa”.
Depois da troca de prisioneiros, no aeroporto de Viena, Skripal exilou-se em Inglaterra, onde desde então vivia incógnito.
Historial de envenenamentos Face à descoberta do casal no centro comercial de Salisbury, vários locais foram isolados e chamadas equipas de descontaminação. A substância que deixou o antigo espião e a mulher que o acompanhava às portas da morte ainda não foi identificada. No entanto, a Rússia tem um longo historial de uso de venenos: já em 1917 o monge Grigori Rasputine, conselheiro do último czar, foi envenenado antes de morrer às mãos do príncipe Félix Yussopov. Já no nosso século, ficou célebre o caso do também espião Alexander Litvinenko, que em 2006 morreu num hospital de Londres por intoxicação com polónio-210 quando investigava o assassínio da opositora Anna Politovskaia.
Tendo em conta o cadastro de Skripal, não parece demasiado ousado supor que também poderá ter sido mandado assassinar.