O governo não vai alterar os prazos para a limpeza de terrenos. que termina hoje para os proprietários e arrendatários e acaba a dia 31 de maio para as autarquias. No entanto, o primeiro-ministro –que vai dedicar o conselho de ministros e o debate quinzenal ao combate aos incêndios e à limpeza de terrenos – vai anunciar hoje uma solução que dá mais tolerância aos prazos previstos na lei, sabe o i, não aplicando as multas já a partir de amanhã.
O mecanismo foi desenhado pelo Ministério da Administração Interna tendo em conta as condições climatéricas que têm afetado o país desde a semana passada e que têm impedido muitos proprietários ou arrendatários de terrenos a fazer a limpeza.
Além disso, a solução – que será hoje anunciada numa declaração do primeiro-ministro depois de se reunir com os municípios – foi criada reconhecendo que as empresas que fazem a limpeza dos terrenos estão sobrelotadas e não conseguem agendar trabalhos para as próximas semanas. Isto porque há poucas empresas do setor agropastoril em Portugal.
Estas foram duas das principais razões que levaram o governo a aplicar esta tolerância mas há várias semanas que as autarquias têm vindo a alertar que seria “impossível de cumprir” a lei devido aos “prazos apertados” e à falta de empresas no mercado.
A decisão do governo também foi tomada depois de o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ter defendido, no domingo, que devia haver alguma “elasticidade” no prazo para limpar os terrenos. “É evidente que o prazo pressupõe alguma elasticidade, até com a chuva que tem caído, e supõe um esforço para encontrar meios e, se o ideal não é possível atingir, que se faça o bom”, alertou o chefe de Estado.
Chegou o 15 de março De acordo com a lei em vigor, que foi aprovada no parlamento, todos os proprietários, arrendatários ou exploradores agrícolas tinham até hoje, 15 de março, para limpar os terrenos, sejam eles baldios ou terrenos em redor de sua casa, sob pena de serem multados. Caso não façam a limpeza, serão as autarquias a assumir essa responsabilidade. E têm até 31 de maio para limpar todos os terrenos, sob pena de perderem logo no mês seguinte, em junho, 20% do valor transferido mensalmente através do Fundo de Equilíbrio Financeiro.
A partir de hoje a GNR vai fiscalizar os terrenos para confirmar se foram limpos. Em caso de incumprimento, a GNR já disse que vai usar “o bom senso” para aplicar as coimas. Ao SOL, o diretor do Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente (SEPNA), Vítor Caeiro, adiantou mesmo que, antes de instaurar a contraordenação, os proprietários são notificados pela GNR, tendo cinco dias para regularizar a situação. Ou seja, é-lhes dada uma segunda hipótese para garantir a limpeza do terreno. Caso o incumprimento persista, é aplicada a coima que será registada numa plataforma que está a ser criada com dados da Autoridade Tributária, que desta forma passa a ter informação para executar cobranças coercivas aos proprietários que não paguem a multa.
A partir da data da contraordenação, a GNR tem 48 horas para indicar à autarquia a área do terreno que não foi limpo.
Também já o ministro das Florestas e da Agricultura, Luís Capoulas Santos, disse que a intenção do governo “não é fazer uma caça à multa”. Em entrevista à “Antena 1”, o governante explicou que, “se um proprietário for intimado por um guarda republicano no dia 16 ou 17 e explique que não pode limpar porque choveu muito ou porque contratou a empresa e ela só pode vir na próxima semana, tenho a certeza que ninguém irá ser multado por causa disso”.
Caso o terreno seja limpo pela autarquia, o proprietário tem de pagar ao município essa fatura. A lei prevê ainda que as autarquias possam arrecadar a receita da venda da lenha que resulte da limpeza.
Para apoiar as autarquias com as despesas, o governo vai lançar uma linha de crédito com 50 milhões de euros.
Lei de acesso ao crédito Além deste mecanismo, o governo prepara-se para aprovar hoje em reunião de conselho de ministros o diploma que define as regras para o acesso à linha de crédito de 50 milhões de euros.
Antes do conselho de ministros, António Costa e os ministros da Administração Interna e o da Agricultura e Florestas vão reunir-se com o presidente e vice-presidentes da Associação Nacional de Municípios para discutirem uma nova versão do diploma a aprovar.
A primeira proposta do governo – que foi enviada às autarquias na semana passada e que já mereceu parecer negativo – previa que o Estado só emprestasse às câmaras a totalidade das verbas necessárias para limparem terrenos que fiquem dentro das áreas com maior risco de incêndios. Ou seja, as 710 freguesias que estão sinalizadas como 1.ª prioridade.
Para limpar terrenos localizados nas 339 freguesias consideradas como 2.ª prioridade – os que representam perigo de incêndio à escala municipal – o Estado só iria aprovar 75% do valor pedido pelas câmaras como empréstimo. E esta percentagem desce para os 60% na limpeza dos terrenos classificados como secundários, que fiquem fora das freguesias sinalizadas como prioritárias. Há 2042 freguesias nesta situação.
O decreto-lei – que o i noticiou na semana passada – não define um valor máximo e um valor mínimo para o empréstimo a conceder a cada uma das 308 autarquias, havendo porém dois prazos para que os municípios paguem ao Estado o crédito. No caso de empréstimos com um valor inferior a um milhão de euros, a autarquia tem até cinco anos para devolver as verbas ao Estado. Para empréstimos acima de um milhão de euros, podem levar dez anos a devolver a verba.
Na proposta de decreto-lei prevê-se ainda que, pelo valor do empréstimo, serão cobrados juros de mora, que têm um período de carência de um ano.
A proposta que é hoje afinada prevê ainda que o reembolso dos municípios ao Estado só seja efetuado à medida que recebem dos particulares as verbas que correspondem à limpeza dos terrenos que não foram limpos atempadamente e cuja responsabilidade teve, por isso, de passar para as autarquias.
As críticas das autarquias à linha de crédito No parecer sobre a proposta do decreto-lei da linha de crédito, que as autarquias enviaram ao governo na passada terça-feira à noite, são feitas várias críticas. Sobre os valores de financiamento, os municípios exigem, desde logo, que o crédito seja concedido a 100% da despesa independentemente da prioridade e da localização do terreno. Além disso, as autarquias querem que fique salvaguardado que este empréstimo “não tem quaisquer implicações ao nível da capacidade de endividamento”.
No documento – a que o i teve acesso – lê-se ainda que as câmaras querem “imputar despesas feitas com meios próprios”. Ou seja, as autarquias que não contratarem empresas ou que recorram aos sapadores para limpar os terrenos, também devem ser ressarcidas pelo proprietário pela despesa que realizaram ao usar meios próprios.
Além disso, os municípios consideram que “deve ficar expressamente estabelecido” que, caso não consigam cobrar a despesa da limpeza aos proprietários, o crédito passa a ser considerado a “fundo perdido”, depois de demonstrada a tentativa falhada da cobrança.
Em jeito de alerta, o documento refere ainda que “a inexistência de cadastro de propriedade rústica constitui um impedimento insanável” para a identificação e responsabilização dos proprietários incumpridores. As câmaras lembram ainda que há proprietários com dificuldades financeiras, que apresentam rendimentos inferiores ao salário mínimo nacional, “cujas dívidas não são cobráveis, apesar da cobrança coerciva.
Estes são alguns dos reparos à proposta do governo e que podem constar da versão que será aprovada hoje. Ontem, à “Antena 1”, Luís Capoulas Santos disse que é preciso encontrar um ponto de equilíbrio entre o que quer o Estado e o que defendem as autarquias.