A administradora do Banco Privado Atlântico Graça Proença de Carvalho garante nunca ter recebido qualquer indicação do ex-vice-presidente angolano Manuel Vicente para conceder o empréstimo de 130 mil euros ao antigo procurador Orlando Figueira. Admitindo que o banco não exigiu qualquer garantia ao antigo magistrado, a filha do advogado Daniel Proença de Carvalho considera que as condições impostas, no limite, poderiam não ser cumpridas: “Ser banca é isso, tomar riscos. Poderia nem sequer ter transferido a sua carteira de títulos para o BPA.”
Graça Proença de Carvalho é administradora daquela instituição bancária desde que a mesma foi criada, em agosto de 2009. Chegou a ser presidente do comité de crédito e foi um dos administradores que assinaram o empréstimo a Orlando Figueira – dinheiro que, segundo o Ministério Público, é uma parte dos subornos pagos ao antigo magistrado do DCIAP para arquivar inquéritos que visavam Vicente.
Ainda que não se recordasse deste caso em específico até 2016, a testemunha disse que, quando o banco foi alvo de buscas e constituído arguido, se inteirou do processo, não ficando surpreendida com a sua participação: “Todas as decisões são aprovadas por dois administradores e, por isso, é provável que tivesse estado envolvida na aprovação.”
Assegurando nunca ter recebido qualquer indicação ou ordem para que o caso tivesse um tratamento diferente, Graça Proença de Carvalho afirmou que existem práticas, políticas e procedimentos que têm de ser cumpridos, referindo que, além da gestão prudente do BPA, o cerco da supervisão está cada vez mais apertado para as entidades bancárias. Tanto que hoje, contou perante os juízes, “os bancos sabem muito mais da nossa vida do que quase nós”.
As empresas centrais do Fizz que são clientes do BPA A testemunha afirmou conhecer, enquanto clientes do banco, empresas como a Berkeley e a Leadervalue, sociedades relacionadas com a Primagest (que contratou Orlando Figueira em 2012). Mas a Primagest não conhecia: “Até poderia ser cliente do banco, mas não tinha conhecimento. Só tive quando houve buscas.”
A ligação entre estas empresas é relevante para este caso, uma vez que o tribunal pretende perceber quem é o real detentor da Primagest, sendo importante saber, por isso, de quem são outras empresas que, em documentação apreendida, surgem como sendo do mesmo “grupo” e têm representantes comuns. Em causa estão as sociedades Ifogest, de que é acionista maioritário o general Leopoldino do Nascimento; a Siprime – Gestão e Serviços, SA; a Leadervalue; a Ondjyla Capital; a Wacola; a Fundação Ondjyla; a Feurevogel; a Exictos SGPS; a Portexictos SA; a Dukestate Development Ltd; a Seven Capital Ltd; a Brooks, Ltd; a Lockman, Ltd; a Eichenberg, Ltd; a CVExictos, Lda; a Mexcitos, Lda; e a Filmdrechtrsch Unipessoal, Lda.
Angélica Conchinha, representante de várias empresas angolanas em Portugal incluindo estas, disse há dias em julgamento que não fez esse apontamento no documento apreendido por se tratar de empresas de um mesmo grupo económico, mas para se referir a um conjunto de empresas.
Segundo o MP, a Primagest está na órbita da Sonangol, que à data da saída de Figueira do DCIAP tinha como presidente Manuel Vicente. O contrato com a Primagest e o empréstimo são assim apontados como subornos pagos por Vicente para o arquivamento de dois inquéritos.
Mas a defesa de Orlando Figueira e de Paulo Blanco, advogado também arguido no caso Fizz, garante que a Primagest e as restantes empresas elencadas por Angélica Conchinha no documento apreendido fazem parte do grupo Atlântico, ou seja, estão ligadas ao presidente do BPA, o banqueiro Carlos Silva.
Questionada sobre se conhecia Angélica Conchinha, Graça Proença de Carvalho não hesitou: “Representava uma empresa, a Ifogest, que prestou serviços ao banco antes de iniciar atividade. Acho que até eu tive um contrato com a Ifogest, como todos os outros funcionários.”
O banqueiro e as ligações à família Proença de Carvalho A administradora do BPA disse também que quem lhe fez o convite para ir para administração do banco foi Carlos Silva, que não teve dúvidas em identificar quando questionada pela defesa de Orlando Figueira sobre se sabia quem era o PCA do banco – sigla de presidente do conselho de administração.
No final da sessão de ontem, Graça Proença de Carvalho disse ainda ter conhecimento de que o seu pai e Carlos Silva têm uma relação de amizade que vai além da profissional.
Sobre Manuel Vicente, disse que apenas o viu quando o banco foi inaugurado, nem sabendo se foram apresentados.