Greve na Ryanair e pressão na TAP deixam passageiros em terra

O descontentamento de trabalhadores da low-cost causou problemas nos aeroportos nacionais, que já tinham sido afetados por dezenas de cancelamentos em ligações da TAP.

Os pilotos da TAP decidiram cortar nas horas extra e o caos instalou-se. Com o planeamento de vários voos a depender diretamente da troca de férias e do adiamento de dias de descanso, foi muito fácil chegar ao cancelamentos de voos. O sindicato, a TAP e a ANA, que gere os aeroportos, não quiseram avançar o número de voos e passageiros afetados, mas há indicações de que na quinta-feira já tinha sido ultrapassada a barreira das 50 ligações. 

Para estes profissionais, não há «aviação sem aviadores» e, por isso, exigem receber um aumento, depois de terem estado vários anos com os salários estagnados. «Estivemos vários anos sem alterações nos vencimentos. Agora não queremos receber mais 1%. Queremos um aumento que vá ao encontro do que acontece a nível internacional», explica fonte ligada ao processo. O aumento de que falam estes profissionais é na ordem dos 43% e «é fácil de explicar»: «Há cada vez mais dificuldade em encontrar pilotos, até porque a aviação tem vindo a crescer nos últimos tempos. É preciso perceber que existem companhias nos EUA em que um piloto recebe mais 2 mil euros para voar fora do horário.» 

Como forma de aumentar a pressão sobre a companhia aérea, os pilotos decidiram cumprir os horários e tempos de descanso e a companhia deixou de ter como cumprir as rotas que tinha programadas. Ainda que uma paralisação não deixe de estar em cima da mesa: «Para já, ficou decidido que os pilotos iam cumprir à risca as regras referentes às horas de descanso. Mas pode haver agravamento das medidas» e não fica de fora a possibilidade de haver greve, avança fonte próxima. Este é, aliás, um dos pontos mais preocupantes, já que o início da época de verão neste setor acontece a 26 de março e implica mais voos, nomeadamente no que diz respeito a ligações de médio curso.

Desta vez, os pilotos optaram por um travão no trabalho extraordinário entre os dias 24 e 28 de março, mas nada impede que se repita. Da parte da TAP existe apenas a indicação de que «está a atuar para minimizar os impactos junto dos seus passageiros» e que haverá compensações. Já as fontes sindicais sublinham que as negociações vão continuar. 

A situação já obrigou o CDS-PP a questionar o Governo sobre as dezenas de cancelamentos. No entanto, até à hora de fecho desta edição ainda não havia resposta do Ministério do Planeamento e das Infraestruturas.

Greve na Ryanair

O dia de quarta-feira ficou marcado também por perturbações na operação da Ryanair. Os tripulantes da companhia decidiram avançar com a greve, numa ação de protesto que começou quarta e se estende a domingo e segunda-feira.
Até ao fecho da edição, a adesão tinha sido de 90%, mas houve poucos voos cancelados no Porto e em Lisboa sentiram-se principalmente atrasos. De acordo com o Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC), os tripulantes que aderiram à greve foram substituídos por trabalhadores de outros locais. Pelas contas feitas inicialmente, com a paralisação quase todos os voos seriam cancelados, mas a substituição mudou o cenário. Em resposta, a Ryanair garante que grande parte dos tripulantes colocaram «os nossos clientes em primeiro lugar, ignorando esta greve», afastando a questão da substituição.

Para os passageiros, a situação é especialmente complicada porque neste caso, como explica a DECO, não há direito a compensações porque a greve não é uma circunstância que seja imputável às companhias. 

Recorde-se que o sindicato tem tentado chegar a acordo com a transportadora de forma que seja aplicada a lei portuguesa, nomeadamente no que diz respeito ao direito de parentalidade e até a baixas médicas. 

A questão da aplicação da lei é, aliás, muito antiga e tem sido polémica ao longo dos últimos anos.

As más condições de trabalho oferecidas pela companhia aérea de baixo custo têm estado na ordem do dia, ainda que não sejam novidade. Já em 2013, a companhia tinha sido condenada a pagar dez milhões de euros por violar leis laborais. Neste caso, a transportadora aérea enfrentava várias acusações pela sua operação em França.

A esta condenação, que previa indemnizações e juros, juntava-se ainda uma multa de mais de 200 mil euros. Também aqui as acusações tinham a ver com o facto de a Ryanair registar os trabalhadores empregados em França como trabalhadores irlandeses, impedindo o funcionamento de plenários e acesso a sindicatos no Aeroporto de Marseille-Marignane. Neste caso, a Ryanair tinha empregado mais de 120 pessoas sem aplicar as leis francesas nem preencher qualquer documento de impostos do país em questão.

Mas o caso de 2013 não serviu de emenda. No ano passado, a companhia enfrentou um outro processo no Tribunal de Justiça da União Europeia e perdeu. A ideia da tripulação de cabina era que o caso fosse julgado num tribunal belga por achar que a lei seria mais favorável, mas a companhia entendeu que o melhor seria que o caso fosse julgado na Irlanda. Foi dada razão aos trabalhadores. De acordo com a Reuters, «o tribunal salientou que no que diz aos litígios relacionados com contratos de trabalho, as regras europeias visam proteger a parte mais fraca». E é aqui que se enquadra o facto de «as regras permitirem, entre outros aspetos, que os colaboradores recorram aos tribunais que considerem mais próximos dos seus interesses».

Os trabalhadores em questão tinham contratos de trabalho realizados de acordo com as leis irlandesas, já que eram feitos como se os colaboradores lá trabalhassem. No entanto, a base destes trabalhadores era o Aeroporto Charleroi, na Bélgica.