A greve na Ryanair continua a ter consequências para os passageiros, para a companhia e, ao que tudo indica, também para os trabalhadores. Depois de várias queixas de que os grevistas estariam a ser substituídos por colegas de outros países, o sindicato fala já na possibilidade de uma greve a nível europeu e o sindicato espanhol avisa que o protesto chegará rapidamente a outros países se “houver represálias”. Com nova paralisação marcada para amanhã, os trabalhadores esperam que a adesão seja ainda maior.
Ao i, fonte ligada a todo o processo explica que a paralisação terá “ainda maior adesão”, apesar de os trabalhadores “estarem a ser contactados pela companhia, que quer saber quem vai voar”. Além disso, a Ryanair tem enviado cartas, por email, a dizer que os trabalhadores “tiveram um no-show [termo que significa “não compareceu”] e que a falta tem de ser justificada”.
Mas, afinal, o que diz a lei laboral? Apesar de não comentar este caso em concreto, contactado pelo i, Diogo Leote Nobre, da Miranda & Associados, explica que existem vários pontos a ter em conta, nomeadamente o que diz o contrato dos trabalhadores. “É preciso perceber a noção de base das empresas. Admito que existam contratos que tenham a base de trabalho noutros países. Ainda assim, mesmo com condições diferentes, o direito à greve estará previsto.” De acordo com o jurista, no quadro geral do direito à greve, a possibilidade de substituição dos grevistas é muito limitada: “O empregador não pode substituir os grevistas por outros trabalhadores que à data do pré-aviso não trabalhassem naquela estrutura. Também não pode contratar uma outra empresa para esses fins.”
Além disso, sublinha, o “exercício do direito à greve é livre. Deve estar imune a qualquer tipo de pressão e o trabalhador não tem, em momento algum, de comunicar se vai ou não fazer greve”. O incumprimento, ou seja, a existência de pressões ou ameaças é “crime punido com pena de multa”.
Há quem considere que um dos maiores problemas é exatamente o facto de a lei portuguesa não estar a ser aplicada. Neste sentido, o PCP já fez saber que lamenta a falta de intervenção do governo no cumprimento da lei da greve na Ryanair: “O Estado, o governo não pode ficar de braços cruzados.” Também o Bloco de Esquerda já se pronunciou e quer audições com trabalhadores e administração.
Questionada sobre as queixas que têm surgido, a empresa continua a afirmar que “a grande maioria dos tripulantes de cabina em Portugal trabalharam (domingo, 1 de abril) dentro da normalidade”. Além de sublinhar que os clientes afetados “já estão a ser recolocados noutros voos”, a empresa fala em “greve desnecessária e injustificada” e afasta o cenário de substituição de grevistas: “Estamos bastante gratos aos nossos tripulantes de cabina portugueses por colocarem os nossos clientes em primeiro lugar, ignorando esta greve.”
Recorde-se que a questão da aplicação da lei é muito antiga e tem sido polémica ao longo dos últimos anos. Um dos casos mais recentes aconteceu com trabalhadores que tinham contratos de trabalho realizados de acordo com as leis irlandesas, já que eram feitos como se os colaboradores lá trabalhassem. No entanto, a base destes trabalhadores era o Aeroporto Charleroi, na Bélgica. A tripulação de cabina queria que o caso fosse julgado num tribunal belga por achar que a lei seria mais favorável, mas a companhia entendeu que o melhor seria que o caso fosse julgado na Irlanda. Foi dada razão aos trabalhadores.