Luiz Inácio Lula da Silva pode ir para a prisão? Pode. Mas será já? Ainda não. E pode continuar a ser candidato a presidente do Brasil? Pode. Mas a lei da Ficha Limpa não impede que alguém condenado em segunda instância possa ser candidato? Impede, mas a defesa do ex-chefe de Estado pode apresentar um recurso especial ou extraordinário pedindo a suspensão da condenação. E se ficar suspensa? Caberá ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) examinar o tema e decidir se aceita ou não a candidatura à presidência.
Nem sequer é uma novidade. Existe jurisprudência para isso. Segundo Gilson Dip, ex-juiz do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), em declarações à Rádio Estadão citadas pelo site Opera Mundi, há mais de 20 presidentes de câmara (prefeitos) que “estão exercendo o mandato com essa condição provisória de suspensão da condenação”.
Dip vai mais longe, referindo que “Lula pode, inclusive preso, participar das eleições, desde que obtenha uma suspensão da condenação”. Cabe sempre ao TSE a última palavra nesta questão, pois “é o órgão competente para dizer se ele é elegível ou inelegível”.
É certo que a decisão do STF de segunda à noite (madrugada de ontem em Portugal) esgota as possibilidades de recurso que a defesa tinha em relação à sua eventual prisão para cumprir os 12 anos e um mês a que foi condenado em segunda instância. Ainda não será já que o juiz Sérgio Moro, da vara do tribunal federal em Curitiba, a cargo da investigação da Operação Lava Jato, emitirá o mandado de prisão. Até porque há ainda trâmites processuais pendentes no tribunal regional (TRF-4), em Porto Alegre, que julgou a sentença em segunda instância e aumentou a pena de nove anos para 12 anos e um mês.
A defesa de Lula já tinha referido que pretende apresentar um novo recurso contra a rejeição do primeiro embargo à sentença – o acórdão foi publicado a 27 de março e tem dez dias seguidos para o fazer e mais dois úteis para entrar com novo recurso, o que prolonga as coisas até ao dia 10. No entanto, é costume interpretar este recurso como manobra dilatória e Moro pode decidir-se por emitir o mandado de prisão antes dessa data.
Os advogados do ex-presidente garantiram em comunicado que irão esgotar “todas as medidas legalmente previstas para evitar que a antecipação da pena imposta automaticamente pelo TRF-4 seja executada porque é incompatível com a Constituição Federal e com o caráter ilegal da decisão que condenou Lula por crime de corrupção baseado em ‘atos indeterminados’ e sem a comprovação de qualquer solicitação ou recebimento de vantagem indevida”.
Se for preso, é muito provável que Lula seja levado para o Paraná. estado de origem da 13.a Vara Federal, a de Curitiba. A Polícia Federal estará a preparar uma cela especial para o ex-chefe de Estado na sua sede em Curitiba.
Assim que se encerrar a tramitação na segunda instância, a defesa tem 15 dias para entrar com recurso especial para o STJ contra a condenação e pedir o efeito suspensivo da condenação. E entrar com outro recurso, este extraordinário, nos mesmos prazos. O primeiro analisará a legalidade do julgamento; o segundo, irregularidades constitucionais.
A defesa de Lula poderá ainda pedir o estatuto de prioridade na análise ao seu caso no comité de Direitos Humanos das Nações Unidas, para que este se pronuncie de modo a que o ex-presidente possa assegurar os seus direitos políticos. O processo foi apresentado em julho de 2016 pelo advogado Geoffrey Robertson, denunciando a parcialidade do juiz Sérgio Moro no julgamento do ex-chefe de Estado. De acordo com o “Estadão”, citando Yuval Shany, um dos 18 peritos do comité, o caso “está na fase de exame da sua admissibilidade”. E para isso é preciso que todos os recursos legais na justiça brasileira tenham sido esgotados. “Só podemos lidar com o caso se foi totalmente resolvido pela justiça doméstica”, acrescentou Shany.
Lula não reagiu publicamente à decisão do STF – disse Gleisa Hoffmann, presidente do PT, que estava reunido com a sua equipa de advogados a preparar os próximos passos da defesa. Hoffmann, que se reuniu ontem com a cúpula do PT na sede do Instituto Lula, em Ipiranga, na zona sul de São Paulo, para analisar a decisão do STF, garantiu, no entanto, aos jornalistas (ver texto ao lado) que o ex-presidente “está bem, está sereno, tem a consciência tranquila dos inocentes”.