Ao fim de uma semana em que a polémica em torno dos resultados dos concursos do programa de apoio às artes, cuja reformulação o secretário de Estado Miguel Honrado assumiu como uma das suas grandes bandeiras, Assunção Cristas chamou para uma reunião, que acontecerá já esta tarde, a Plataforma do Cinema, que tem contestado a atuação do governo na prometida revisão à Lei do Cinema – a outra grande pedra no sapato desta tutela, herdada do tempo de Jorge Barreto Xavier.
“O grupo parlamentar do CDS está também preparar iniciativas legislativas sobre o assunto”, disse Cristas ao i, sublinhando que “a cultura não pode ser uma área onde a direita está proibida de entrar”.
A polémica na revisão à Lei do Cinema vem sobretudo do artigo 14 do diploma que vem substituir o decreto-lei n.º 124/2013, que determina os procedimentos para a nomeação dos júris que avaliam as candidaturas aos apoios ao cinema e ao audiovisual, que em 2013 deixaram de ser escolhidos pelo Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA), substituído nessa função pela SECA, Secção Especializada do Cinema e do Audiovisual do Conselho Nacional de Cultura.
Depois de em fevereiro do ano passado a tutela ter deixado cair, por pressão do setor, uma primeira proposta de alteração ao decreto-lei que mantinha o contestado sistema, foi já este ano apresentada uma segunda proposta, no sábado promulgada pelo Presidente da República, que restitui parte dos poderes ao ICA, mas não afasta totalmente a SECA do protesto.
Fazendo eco das críticas tecidas ao diploma pela Plataforma do Cinema mas também pelo Bloco de Esquerda e o PCP, Marcelo não deixou de fazer reparos ao malogrado artigo, que promulgou “apesar de não corresponder à posição a seu ver preferível”, com a justificação de que um veto adiaria ainda mais a abertura dos concursos, que estão já atrasados.
Os planos do CDS As preocupações expressadas por Marcelo preocupam também o CDS. Ao i, Cristas avançou que esse será um tema da reunião de hoje. Mas chamou atenção sobretudo para o regime sancionatório para as operadoras que se recusem a pagar as taxas que asseguram uma grande fatia do orçamento anual do ICA que, à semelhança da Cinemateca, não beneficia de receitas diretas do Orçamento do Estado. “Preocupa-nos, por exemplo, a questão das coimas não serem suficientemente dissuasoras.”
A par da questão dos júris, essa tem sido uma das falhas legislativas criticadas pela Plataforma do Cinema, estrutura que representa um conjunto significativo de produtores, realizadores, técnicos, programadores e os mais importantes festivais de cinema portugueses. “O regime sancionatório é uma das questões fundamentais deste problema”, reage Cíntia Gil, diretora do Doclisboa e representante da plataforma. “Este regime sancionatório dá força às operadoras [que têm assento na SECA e que no passado usaram o incumprimento como forma de chantagem, num braço-de-ferro que resultou no polémico sistema para a nomeação dos júris, gizado por Barreto Xavier]. Se ele for agravado, torna-se difícil não cumprir.”
Segundo Cristas, esta será apenas a primeira reunião de “uma ronda pelos agentes culturais”, para a qual tinha aliás deixado já a porta aberta esta semana, no calor da polémica em torno dos concursos da DGArtes, que culminou com os protestos que na sexta-feira juntaram milhares de pessoas em seis cidades pela exigência de 1% do OE de 2019 para a Cultura.
“Também na Cultura o governo das esquerdas encostadas dá com uma mão e tira com as duas”, critica a dirigente do CDS. “Depois da degradação nos serviços públicos, em matéria de saúde, na educação ou nos transportes, nos últimos dias ficámos a saber que também a área da cultura está a sofrer às mãos da austeridade escondida e da incompetência do seu governo.”
Para Cíntia Gil, este governo está “a perder uma oportunidade de ouro” para “resolver um problema que todos os partidos, à esquerda e à direita do PS”, reconhecem. “Se não existir um consenso, existe uma sensibilidade alargada em torno desta discussão.”
Com Sebastião Bugalho