Siri Hustvedt, a autora da citação que encima este texto, é uma escritora e ensaísta norte-americana de reconhecido sucesso, coincidentemente casada com um também escritor de sucesso, Paul Auster. E mãe da artista Sophie Auster.
E trata um tema complexo, desafiante, para as sociedades contemporâneas, onde a pluralidade e a inclusão são cada vez mais fundamentais para a observância dos direitos, liberdades e garantias de todos os cidadãos.
Será que esta sua afirmação carrega ainda o peso da masculinidade, presente no lado pior das relações entre os vários géneros? Entre os homens e as mulheres? Não faltam estudos relativos a estas e a outras matérias com elas conexas. Por exemplo, sobre a estética e a beleza.
Será que ainda faz sentido que existam preconceitos em relação às mulheres bonitas, no que diz respeito à sua inteligência? Será que a estética tem ou não influência na perceção do que as mulheres (e também os homens) são, fazem e podem vir a fazer, quer pessoal quer social e profissionalmente?
Na vida pública, a estética é ou não indiciadora dos sentimentos de pertença e de identidade política, num tempo em que as nossas vidas coletivas são tão condicionadas pelos novos media e pelas redes sociais? E, cumulativamente, pelo império das corporações, coligado com a superficialidade e a mercantilização de conteúdos alimentados pelo generalismo?
Pio Abreu, psiquiatra, professor universitário e reputado especialista na área da psicopatologia e da psicoterapia, ao referir-se à relação dos homens com as mulheres em tom quase provocatório, refere que «com o aparecimento da pílula contracetiva, nos anos 60, deixou de se namorar por cima do muro». E vai mais longe, dizendo: «Elas não encontram homens que lhes despertem a libido».
Tudo isto também se funda numa espécie de cultura errada que vê as mulheres como há décadas e há séculos atrás. Uma espécie de ‘mulher utensílio’. Isto porque uma minoria vê, acha e acredita que em vários países do chamado Ocidente as mulheres se preocupam mais com a forma física, a ida ao ginásio, o tratamento das gorduras e das celulites e a cor dos cabelos. Nada de mais errado. As mulheres que – digamos assim – têm ‘prioridades invertidas’ são uma minoria.
Estas contradições e bloqueamentos são detetáveis quer nos homens quer nas mulheres. E de várias idades. E já são muito o resultado dos efeitos do mundo digital, da internet, das redes sociais.
Redes sociais que têm vindo a ampliar cada vez mais as vidas, numa espécie de efeito de espelho. Como se tudo o que fizéssemos e tudo o que vivêssemos fosse preparado para estarmos permanentemente ao espelho, com o que isso tem de negativo.
Como refere Daniel Innerarity, «vivemos em sociedades histéricas, epidérmicas»? Sociedades onde o massacre e as generalizações e simplificações colocam em primeiro lugar amoralismos que só servem para pôr a nu contradições de quem vive da voragem do histerismo e do moralismo doentio? É não só irritante como revoltante – para não adjetivar de maneira mais brejeira – assistir à vaga de moralismos, coligados com justicialismos primários, de quem tem mais falhas morais, éticas, profissionais e até de formação académica do que a esmagadora maioria dos que diabolizam em nome de quase nada? A soberba tomou conta do que não dura. A modéstia é vista como fraqueza.
Hoje, vários dos moralistas e justicialistas não são mais do que adolescentes que formam uma espécie de tribo virtual de adultos ‘mal resolvidos’. Uma espécie de exibicionistas que poucas ou nenhumas referências têm e poucos valores de vida cultivam.
Filhos da sociedade dos sem família. Com manifestos problemas e perturbações identitárias. Julgando que os colmatam com as redes sociais e as vidas em direto. A fama acaba por ser um dos poucos fitos das suas vidas, mesmo sem valores adequados, mesmo que se transformem em dependentes da cultura tecnológica, com o que esta tem de negativo. Talvez por isso, quando se lhes tira o Google caiem-lhes várias máscaras. E percebe-se que conhecem menos a história universal do que as marcas de roupa e outras banalidades.
Faz todo o sentido que, nas sociedades contemporâneas inclusivas e plurais, se trace uma linha divisória com a cultura pós tecnológica do generalismo, que serve de alimento para o moralismo falso, demagógico, que alimenta vários populismos.
Com tanta informação, por que será que, no tempo do Estado e da sociedade da partilha, são cada vez mais as pessoas que afirmam estarmos cada vez mais estúpidos? Mesmo que vários, com soberba, se imponham tão espertos e superiores.
Conceitos como sabedoria, retidão, correção, rigor, esforço, trabalho, competência, coerência, não lhes dizem nada. Antes pelo contrário, irritam-nos. E alimentam sentimentos de vingança. É por isso que as sabedorias intactas não se encontram nos seus lugares – impedindo que se perceba que os seus desconstrutores representam pouco mais do que ruído mediático. Estas são várias das contradições das sociedades contemporâneas. E que condicionam, e muito, o que as mesmas têm procurado expurgar.
Conveniente
Olivença património mundial
Olivença mantém-se há muitos anos como uma matéria de controvérsia em vários setores das sociedades portuguesa e espanhola. Independentemente dos posicionamentos e dos argumentos de cada um dos defensores da pertença a Portugal ou a Espanha, será conveniente ou não que se acompanhe devidamente a pretensão de Olivença querer ser património mundial? Julgo que sim. Daí que deva acompanhar-se o que a esse propósito está a ser feito no chamado território da raia.
Incoveniente
Ryanair em Portugal
O que se tem passado em matéria laboral com a Ryanair em Portugal não é um bom exemplo. Nem para a companhia aérea, nem para o Estado, nem para os defensores da iniciativa privada e da economia de mercado. Nem para quem reconhece – como é o caso – a importância das companhias aéreas para o turismo português. Há limites que não devem ser ultrapassados. E a Ryanair ultrapassou-os e muito.