Tânia Ribas de Oliveira. ‘Tive que aprender com os erros e falhar o menos possível’

Chega como a vemos na televisão. Descontraída. Vem de cabelo molhado – marcámos as fotografias para outro dia -, no bairro onde mora desde menina e em que todos a tratam pelo nome com familiaridade, sem a reverência tantas vezes guardada àqueles que nos entram em casa todos os dias pelo pequeno ecrã. 

Tânia Ribas de Oliveira cresceu não só debaixo dos olhos dos vizinhos de Telheiras como da lente dos portugueses. Afinal, a apresentadora a quem um dia chamaram de ‘netinha de Portugal’ já carrega quase 20 anos de televisão e está diariamente no ar há onze. O dia traçado a regra e esquadro, próprio de quem tem filhos pequenos e uma profissão exigente, faz-nos saltar rápido para o motivo do nosso encontro. Uma conversa franca, sem floreados mas cheia de sorrisos – é que Tânia é mesmo assim. Sai um café – com adoçante, para ela –, deixemo-nos de introitos e venha a conversa. 

Ser entrevistada ainda é um momento contra natura?

Não é bem contra natura, mas curiosamente também não me sinto muito à vontade. Ainda ontem fui a um programa do Júlio Isidro e senti que estava ali a ser entrevistada pelo mestre e ficava um bocadinho empenada nas respostas. Sinto-me muito mais à vontade a fazer perguntas do que a responder. No início era muito mais estranho do que agora.

Lembra-se da primeira vez que isso aconteceu?

Lembro-me. Foi para a TV Guia, foi o Paulo Abreu que me entrevistou. Estava a fazer um programa chamado Aldeia Global – acho que não há pessoas com memória desse programa, porque era para durar dois anos e depois durou dois meses. Era muito exigente, todos os dias de uma escola diferente das 8h30 às 10h00, antes da Praça da Alegria. Era apresentado por mim e pelo Vasco Domingues, fizemos um casting numa produtora, a Astrolábio. Fui escolhida entre centenas de pessoas, publicaram um anúncio no Diário de Notícias. Lembro-me perfeitamente depois de ir comprar a revista e de ficar… Mas o meu pai guarda todas as revistas em que apareço, portanto não compro assim muitas. Guarda tudo e depois no meu aniversário dá-me uma encadernação com as principais notícias em que saí, já tenho para aí uns sete ou oito (risos). Faz isso todos os anos, é muito querido mesmo, fico muito feliz. Mas não veem o Agora Nós todos os dias, têm a vida deles (risos).

Apresentou recentemente a 2.ª semifinal do Final da Canção. Enquanto crescia, via o concurso em casa?

Víamos todos os anos. Na altura saía um quadro de qualificações e depois o meu pai tirava fotocópias para votarmos em casa. A minha mãe perguntava: ‘De zero a 10 quanto é que dás a esta?’ E depois víamos quem é que ganhava o Festival da Canção na nossa casa. Era muito giro. E era a fã número um do Carlos Paião. Ouvia uma música dele na rádio e começava a chorar. Era muito dramática.

Isso com quantos anos?

Não sei bem, foi quando ele participou com o ‘Play Back’ [1981]. Depois ele perdeu esse festival e estive a noite toda numa choradeira. Quando o Carlos Paião morreu era verão e eu estava a passar férias com os meus avós no Vimeiro. Eles esconderam-me aquilo até à exaustão, o meu avô até deixou de comprar o jornal tal era minha pancada. A morte dele marcou-me imenso, foi o meu primeiro grande ídolo.

Antes ainda do que conta, quais são as suas memórias mais antigas de infância?

Brincar às cozinhas com o meu irmão no quarto. Não, lembro-me de coisas antes de isso. Tenho uma imagem claríssima do recreio do infantário da TAP, e aí teria uns três anos e ainda não tinha irmão. Ia ao colo da minha mãe de autocarro e ia o tempo todo a cantar, num português corretíssimo. E as pessoas ficavam de boca aberta. Eu cantava: ‘Uma gaivota voava, voava…’ e outras músicas de intervenção. E a minha mãe só pensava: ‘Ainda vou presa!’ O 25 de Abril ainda tinha sido há pouco tempo (risos) [Tânia nasceu em 1976]. Depois lembro-me da angústia que era quando ela virava costas e me deixava lá. Claro que não era mal tratada mas ficava longe da minha mãe e era horrível.

Já alguma vez pensou que os seus filhos podem também sentir essa angústia?

Então não penso! Ainda ontem partilhei uma coisa no Facebook acerca disso. Fui buscar o Tomás à escola exatamente à hora a que começou a chover torrencialmente. E não tínhamos chapéu-de-chuva, então pus-lhe o capuz e pedi-lhe para irmos a correr até ao portão. E ele olhou para mim e disse: ‘Mãe, eu gosto tanto de apanhar chuva na cara e no cabelo… Deixa-me ir sem capuz’. E ia-me logo sair: ‘Nem pensar, podes constipar-te’. Mas vi-me em pequena a pedir a mesma coisa à minha mãe, e disse-lhe: ‘Está bem. Então tira o capuz e vamos os dois’. Acho que temos que ter essa distância e perceber que não podemos ser só pais. Que já fomos pequeninos e que essas coisas que fizemos um bocadinho à margem são memórias que guardamos sempre. E foi bom.

Nessa altura em que iam de autocarro onde moravam?

Em Benfica, perto da Venda Nova. Vivi lá até aos dez anos. Depois vim para Telheiras e aqui estou. Já mudámos de casa três vezes.

É muito abordada na rua ou aqui é mais um elemento do bairro?

Aqui sou mesmo mais um elemento do bairro. As pessoas abordam-me desde sempre, desde antes de aparecer na televisão. Sempre fui uma miúda extrovertida e falava com toda a gente. Vou à mercearia e é ‘Tânia o que precisas, os meninos têm bananas?’, isso para mim é uma coisa perfeitamente normal independentemente da RTP. 

Como era Lisboa quando começou a crescer? Tinham algumas tradições de família?

Passava todos os fins de semana com os meus avós, que são de Trás os Montes mas moravam cá. Tenho outros avós em Aveiro. Raramente ficávamos em Lisboa ao fim de semana. Passeávamos muito. Íamos para o Magoito, para a Praia das Maçãs, para a Adraga… Mas no Natal íamos sempre ao circo, que era na Feira Popular, e ao Chiado. No verão íamos com os meus avós para o Vimeiro e com os meus pais para o Algarve ou para fora. Tinha muita sorte porque, como a minha mãe trabalhava na TAP – era supervisora do balcão de emissões -tínhamos muitas vantagens. Passávamos sempre a Páscoa fora do país. Tive muita sorte. 

Qual foi o primeiro país que visitou e que sentiu ser completamente diferente daquilo a que estava habituada?

O Brasil. Fomos para o Rio de Janeiro e foi sair do avião e nem acreditar naquele calor. E depois era um cheiro que sei perfeitamente qual é mas não consigo explicar. Não era de todo uma coisa muito desagradável, era a mistura das mangas e coco vendidos na rua, das cascas quentes ali ao sol. Isto o meu irmão ainda não tinha nascido, temos três anos e meio de diferença, fui viajar muito cedo com os meus pais.

Olha para a infância com ternura e saudade ou é uma pessoa que pensa mais no futuro?

Não sou muito saudosista, sou mais de presente e de estar a projetar coisas do que a olhar para o passado. Mas tenho memórias bonitas que me confortam muitas vezes. Não é por acaso que sofri tanto com a perda do meu avô, que faleceu há três anos. Guardo tudo isso num lugar muito especial do meu coração. Os cheiros, as roupas que vestia na altura… A minha mãe preparava uma mala toda bonita para nós irmos de fim de semana e a minha avó ia à feira e comprava fatos de treino com uns bonecos para nós nos podermos sujar e brincar à vontade. Olhando para trás, agora acho isso o máximo. 

Os avós dos seus filhos têm liberdade para fazer isso com eles?

São tempos muito diferentes, mas claro que teriam liberdade para fazer o mesmo. Nasci quando os meus pais tinham 21 anos, a minha avó quando eu nasci tinha 42 anos, que é a idade que vou fazer agora. Esta distância de gerações implica muita mudança. Fui mãe com 36 e 39 anos, a maturidade é completamente diferente. Se calhar tenho mais necessidade de estar muito tempo perto deles. Os meus pais eram uns miúdos e foram os melhores pais que poderiam ter sido para a idade e as circunstâncias. Nasceram e cresceram em Luanda, um país tropical, casam-se em setembro de 1975, eu nasço em junho de 76 e eles já estavam em Portugal. Foi uma confusão pegada. Chegar a Portugal, um país com o qual eles não se identificavam em nada, um país frio, conservador, ainda muito filho de uma ditadura. Não era nada daquilo que eles conheciam e tenho a certeza de que não foram muito felizes nos primeiros anos. Temos que olhar para as coisas com a distância e as circunstâncias necessárias. É claro que hoje em dia estamos todos juntos, com os avós dos meus filhos. Não tenho que trabalhar até às tantas para os meus filhos terem que ficar, ficam porque é possível e porque é bom para todos que fiquem, não é uma necessidade.

Sente que teve mais liberdade do que os seus colegas na escola?

Acho que sim. Pelo menos sentia que éramos miúdos diferentes, mais à vontade. Tínhamos muita facilidade em expressar a nossa felicidade, de rir. Os meus pais tinham um grupo enorme de amigos também de Luanda e no verão, aos fins de semana, íamos muitas vezes para as praias lá do fundo da Costa e aquilo era uma coisa muito à vontade para a época, agora olhando a esta distância… Não usávamos chapéu-de-sol, a minha mãe fazia topless. Nós crescemos com essa liberdade, fruto, acho eu, de pais nascidos e crescidos num país africano. Mas também estávamos perfeitamente enquadrados com todos os outros.

Já disse várias vezes que tem o privilégio de trabalhar no que é o seu sonho de infância. Quando foi cristalino para si que era isto que queria fazer?

Aos dez, doze anos. Lembro-me de pôr assim os livros no parapeito da janela do meu quarto, sentar-me na cama que não era assim muito longe – e ainda via bem ao longe (risos) – e estar a ler toda satisfeita, a fingir que estava no telejornal a ler o livro de estudo do meio físico e social, a tentar entoar e colocar a voz. O meu pai teve um programa de rádio em Luanda e corrigia-me muitas vezes. Fazíamos muito o exercício da palavra, já o meu avô era professor de português e o meu pai quando veio para Portugal também veio dar aulas de português. Havia ali sempre a palavra, falada. E cantada – mal. 

E quando acabou o secundário estava então completamente decidida pelo caminho da comunicação.

Sim, mas não entrei, ou melhor, entrei na Faculdade mas não em Comunicação Social. Pus em primeiro Comunicação Social na Nova, em segundo no ISCSP, e depois como era toda descontraída – e achava que ia entrar claramente – nem vi as médias nem nada, pus todos os cursos do ISCSP. Entrei no último, Sociologia do Trabalho. As médias subiram brutalmente, nesse ano era preciso quase 19 para entrar em Comunicação Social e a minha era 14. Chorei imenso. Os meus pais lá me disseram que havia muitos jornalistas que não tinham sequer o curso de Comunicação Social e acabei por fazer Sociologia até ao fim. Depois fui para o Cenjor, aí sim tirar um curso – ainda que muito curto de televisão –, depois fui para a ETIC e pronto.

Quais foram os seus principais disparates ainda antes disso, na adolescência?

Nunca fui uma adolescente rebelde. O meu atual grupo de amigos é o mesmo dessa altura. Em Telheiras não se passava absolutamente nada, o máximo que fazíamos era apanhar o autocarro ou ir a pé até ao metro no Campo Grande para ir um bocadinho ao Bairro Alto ao fim de semana e às duas da manhã tínhamos que estar em casa. Mas fiz tudo o que os adolescentes normalmente fazem, embora nunca tenha ultrapassado determinados limites e fazia muita honra nisso, era uma pessoa que dizia que nunca ia fazer isto ou experimentar aquilo e nunca o fiz. Ainda hoje sinto um grande orgulho nisso. 

Mas como se entretinham?

As minhas amigas dormiam quase todos os fins de semana em minha casa, mas nós não fazíamos disparates nenhuns. Ficávamos a cantar até às duas da manhã e ríamos, ríamos. Hoje olhamos para trás e pensamos como é que nós fazíamos aquilo… Eu nem devia contar isto, mas eram discos… Bem, eram os Sete Palmos e Meio da Abelha Maia (risos). 

Mas já eram crescidas?

Pois, já, daí o ridículo…

E além da música, do que gostou mais na adolescência?

Andei 25 anos na ginástica do Sporting, entrei com quatro ou cinco e saí aos 28. Não fazia competição, fazia demonstração. Ia a montes de saraus e acho que é claramente um dos motivos pelos quais eu não entrei em grandes disparates na minha adolescência. Acho que é absolutamente fundamental que os miúdos façam desporto pelo equilíbrio que lhes dá entre a saúde física e mental. 

Os seus pais separaram-se quando tinha 15 anos e fala sempre disso com uma certa leveza embora uma separação seja sempre um momento difícil.

E foi. Mas os meus pais não se davam bem e na realidade foi um alívio para toda a gente quando se separaram. Não se tratavam mal nem pouco mais ou menos mas eles não eram felizes juntos, também fruto de todas aquelas circunstâncias que estava a contar. Ainda hoje são amigos um do outro, continuam a viver no mesmo bairro, encontram-se imensas vezes e falam muito bem. 

Há muitos filhos de pais separados que depois têm dificuldade em constituir família porque acham que não vai resultar. Isso nunca pôs em causa a sua ideia de família?

Nem pensar, pelo contrário. Sei exatamente aquilo que não vou fazer e o que não quero viver.

Este valor família é muito valorizado por si. Sempre foi assim ou foi algo que foi cultivando com a sua própria família?

Fui cultivando com a minha própria família mas, por outro lado, também foi sempre assim. As minhas memórias têm sempre família à mistura mas acho que foi quando comecei a namorar com o João [Cardoso] que tive essa perceção de que queria criar uma família com aquela pessoa e que era com ele que queria ficar até ser velhinha. E pronto, até ver, está a correr tudo muito bem (sorri). 

No outro dia publicou até a fotografia de um CD com o qual ele a pediu em namoro.

O que eu já me ri com esse CD! Começámos a namorar em 2005, casámos em 2009 – já vivíamos juntos há mais de três anos – e tivemos o primeiro filho em 2012.

Tudo planeado.

Não foi planeado, foi o deixar andar. Todos os nossos amigos já tinham filhos mas queríamos continuar por mais um bocado a viajar e a jantar fora, a ter uma vida mais folgada. Mas tínhamos a absoluta certeza de que queríamos ter filhos. Sempre quis ter dois rapazes, aquelas coisas que se pensam, e por acaso aconteceu, mas se tivesse sido uma menina tinha ficado igualmente feliz. Mas pronto, acho que a partir do nosso encontro as coisas se começaram a criar. A nossa família começou com um gato, o Puscas, que morreu. Quando o Puscas morreu fiquei de rastos, e o João aproveitou-se de mim para ter um cão (risos), o Baeur, que já vai fazer 11 anos.

Quais foram os desafios que encontrou na maternidade com os quais nem sonhava com que se ia deparar?

É muito difícil responder a isso. Não estava à espera de nada, mas começa mesmo uma vida nova depois de nascer um filho. Tudo o que comecei a viver desde esse dia foi e ainda é uma novidade para mim. Há aquela frase feita, quando nasce um filho nasce uma mãe, e isso é verdade. Eu já existia, já era feliz antes de eles nascerem, eles não vieram justificar toda a felicidade de uma vida. Há pessoas que podem ser felizes sem filhos, não vamos ser fundamentalistas e achar que quem não tem filhos é egoísta. Algumas pessoas nunca deveriam ter tido filhos, esta é a verdade. Há crianças que não têm culpa nenhuma dos pais que têm.

A logística do tempo nunca é fácil para os pais e imagino que, para alguém que faz televisão diariamente, ainda tenha que ser pensada com mais cuidado. Já perdeu algum momento importante da vida dos seus filhos?

(sorri) Acho que consegui sempre estar presente. Trabalho quase todas as tardes em direto, acho que todas as pessoas trabalham à tarde seja lá onde for, também estão em direto dos seus escritórios (risos). Vou buscá-los à escola todos os dias, o João vai pô-los, temos uma vida familiar como tantas outras pessoas. 

Antes de ser apresentadora foi jornalista na RTP. Que trabalhos a marcaram quando começou, seja por terem sido caricatos ou importantes?

Houve muitos! Quando fui para o Bom Dia Portugal fazia diretos quase todos os dias. Mas já pendia ali para o light, para a parte mais divertida da coisa. Isto nesse estágio, em que entrei como jornalista com mais 24 pessoas depois de não sei quantos testes. Depois houve uma mudança na RTP com a chegada do Emídio Rangel e decidiu-se que afinal os estagiários já não eram necessários e nem sequer iam entrar no quadro. Quando aquilo aconteceu, lembro-me de ficar a pensar: ‘Então mas agora vou morrer na praia outra vez?’, porque já lá tinha estado a estagiar antes. E foi quando o Nuno Santos me ligou e perguntou se queria fazer parte da equipa de repórteres da Operação Triunfo (OP) porque a Judite de Sousa e a Alberta Marques Fernandes lhe tinham falado de mim. Disseram-lhe que no grupo havia ótimos jornalistas, mas que eu teria jeito para o entretimento, porque era divertida.

E recebeu esse convite que se desviava do jornalismo como uma lufada de ar fresco ou como um desafio?

Pânico. A minha primeira reação foi dizer: ‘Não quero ir, quero ser jornalista, quando abrir a porta do entretenimento já não volto para trás’. E pronto, isso durou dez segundos. Fui à reunião com o Nuno Santos, tivemos logo uma enorme empatia à primeira vista e ficámos inclusivamente amigos para o resto da vida. Falámos também com o senhor Luís Andrade, que infelizmente também já não está cá que era o diretor de programas na altura. E lá fui fazer parte da equipa de um programa novo. E a partir daí nunca mais parei.

Estive a ver uns vídeos dessa altura da OP em que a Tânia era como é hoje: muito natural, a câmara para si é não é um objeto que a muda.

Até me esqueço que lá está.

Mas esta naturalidade treina-se ou é inata?

Acho que não treinei nada. Mas também faço um ginásio televisivo diário há quase 11 anos, em direto, não há margem. Posso falhar mas toda a gente já viu e portanto tive que aprender com os erros e falhar o menos possível, nunca deixando de ser eu própria. Estou desde 2007 a fazer day time e é claro que isso me ensinou tudo o que sei, mas não acredito que se treine, pelo menos em consciência. Odeio lugares-comuns, odeio falsos moralismos e apresentadores de televisão que dão lições de moral às pessoas, que fazem perguntas que já contém as respostas, que vão ao outro lado do mundo perguntar ‘então como é que se sente hoje?’ porque adoram ouvir-se. A única coisa que faço é evitar o mais possível estas coisas de que não gosto.

Recebe diariamente pessoas com estilos e escolhas de vida diferentes. Por exemplo, na alimentação somos constantemente bombardeados com informações sobre lactose, o glúten, às vezes ideias que se contradizem, e por aí fora. Leva algo disto para o seu estilo de vida?

Por acaso no Agora Nós até desconstruímos muito essas modas. Ainda há pouco tempo estivemos a falar exatamente sobre o glúten e chegou a um ponto que perguntei: ‘Então quem não é intolerante ao glúten porque é que não o come? Porque é moda?’. E ela disse que sim. Tentamos ali esclarecer as pessoas, e a partir daí cada um faz o que entende. Depois há também o açúcar, que é óbvio que é um veneno. Mas não sou nada fundamentalista, ou seja, acho que todos temos que fazer o máximo possível pela nossa saúde, ter uma alimentação saudável, praticar exercício físico, mas há coisas que também fazem falta. Comer uma bola de Berlim na praia não é crime. É uma coisa maravilhosa. Não é comer uma todos os dias. Agora parece que temos todos medo de mostrar até um pastel de nata. Calma. Ser fundamentalista e não ser feliz? Não concordo nada. 

Vê o trabalho dos outros?

Vejo. Não no sentido de criticar, mas vejo porque se faço televisão tenho que ver televisão. E admiro muitas pessoas.

Estar todos os dias no ar requer muita disciplina?

Requer. Primeiro tenho que ser muito organizada com os meus horários e rotinas. Depois qualquer senão que tenha na minha vida, ninguém tem culpa disso. Nem os meus colegas na RTP e muito menos os telespetadores. As pessoas têm o direito de receber alguém bem-disposto em sua casa, penso que isso é absolutamente fundamental na minha profissão. E depois é preparar muito bem os programas, saber com quem estou a falar, saber que as pessoas não são só um hoje, também têm um ontem. Depois é falar sempre olhos nos olhos – e saber ouvir é fundamental.

Já foi alguma vez gravar destroçada?

Já. Quando o meu avô faleceu. No dia 22 de setembro estreou o Agora Nós, um formato novo, da manhã, uma aposta forte da RTP. Era a primeira vez que trabalhava com o Zé Pedro, com um mega cenário, tudo espetacular e o meu avô com cancro desde agosto. Abrimos o programa maravilhosos nesse dia e o meu avô morreu no dia 26. Durante três dias não consegui ir trabalhar. Nesse momento só consegui pensar numa frase da Inês Pedrosa: ‘Como pode o sol brilhar com este despudor amarelo num mundo onde tu já não estás?’. Ainda demorei algum tempo a ficar bem. 

Diria que esse foi o momento mais difícil da sua carreira?

Sim. E noutra perspetiva completamente diferente, tive outro: o dia em que o João Baião se foi embora para a SIC. Ainda hoje quando penso nisso tenho vontade de chorar (sorri e emociona-se). 

Ainda? Mas é uma ferida aberta?

Não! É porque o adoro, temos uma paixão enorme um pelo outro. Destes quase onze anos, sete foram com ele. Fizemos o Portugal no Coração e também a Praça da Alegria que veio do Porto para Lisboa durante um ano e foi nessa altura que ele foi convidado pela SIC. Depois de muito pensar e se martirizar aceitou e obviamente tinha que o fazer. Era uma proposta irrecusável. Mas foi muito doloroso para mim.

Ainda há pouco tempo publicou nas redes sociais uma imagem sobre o João Baião. Aliás, usa muito o Instagram e o Facebook. Os apresentadores hoje têm que ser multiplataforma? 

Acho que não têm, mas é mais uma ferramenta do nosso trabalho. Também tenho um blog, O Nosso T2, e esse blog tem alguns braços de ferro – um é o meu Instagram, o outro é o meu Facebook – e nesse sentido é muito mais fácil para mim pegar nas minhas redes sociais e dizer o que vai aparecer no blog nesse dia. Nesse sentido, e também para marcas e perspetivas comerciais, nós estamos no mercado. Os apresentadores de televisão têm um valor que é diferente de uns para os outros. 

Tem noção que é uma marca, como um jogador de futebol?

Não me importava (risos). Mas acho que sim, represento grande parte das mulheres portuguesas e tenho claramente um público. No meu Instagram, por exemplo, 75% dos meus utilizadores são mulheres e eu adoro isso.

Já que falou de mulheres: há igualdade salarial no seu trabalho?

Na minha profissão há, mas sou uma exceção. Não ganho, nem pouco mais ou menos, aquilo que a maior parte dos portugueses ganha. E por uma questão de elegância não vamos falar de valores. Há mulheres em televisão que ganham muito mais do que eu, mais do dobro ou triplo, outras que ganham menos. E relativamente aos homens a mesma coisa. Não há desigualdade devido ao género.

E nunca sentiu que teve algum tipo de tratamento diferente por ser mulher ou que foi desrespeitada no seu percurso profissional?

Não. Agora toda a gente fala na questão do assédio sexual, a mim nunca me aconteceu; nem nunca fui desrespeitada. Mas também nunca me dei ao desrespeito. Acho que as pessoas sabem perfeitamente quem é que podem tentar desrespeitar ou não, e eu não sou uma dessas pessoas. 

Já escreveu três livros…

Quatro, três infantis e um para os pais. Para mim escrever ou falar é natural. O primeiro livro que escrevi nem sequer tinha filhos, o segundo estava grávida do Tomás, e só o terceiro é que já tinha o Tomás mas o Pedro ainda não tinha nascido. É um universo no qual sempre me senti muito bem. O último livro, As Pérolas das Nossas Crianças, é para os pais anotarem aquilo que os filhos dizem.

Houve depois uma acusação de plágio relativo a esse livro que imediatamente refutou. Foi apanhada na curva, ou seja, conheceu um lado menos bom de pessoas que não esperava?

Foi uma coisa que já passou e que foi muito feia. A palavra plágio é muito forte e é parece-me inenarrável quando falamos de palavras. Por exemplo, esta história do Diogo Piçarra no Festival da Canção. Penso que está mais do que provado que aquilo não é plágio nenhum, era uma música. Isso também me irritou muito. Sobre o meu livro, quantos livros de culinária, beleza, bem-estar, saúde e etc. é que existem numa livraria? Que pena, existir mais um livro também que recolhia registos do que as crianças dizem, isso torna-se um plágio porquê? Mas o que mais me magoou foi ter-se acreditado que eu sabia da existência desse livro e eu nunca soube, nunca. E não admito que ninguém desrespeite a minha palavra quando eu digo que não sabia. Mas já passou, está mais do que sanado. 

Onde se vê daqui a 10 anos?

A continuar a trabalhar em televisão. Isto é a minha profissão, não é trabalho temporário nem um meio para ser capa de revista. É a minha profissão e levo-a muito a sério. Vou ser capa desta revista?

Sim!

(risos). Mas pronto, isso é uma consequência da minha profissão. Respondendo à pergunta anterior, gostava de continuar a apresentar programas. Gosto desta coisa da adrenalina, do estar vivo, alimenta-me. Mas também me imagino, daqui a uns largos anos, uns anos largos a controlar conteúdos televisivos.