Os partidos portugueses acham que Portugal perdeu, mas há um português que parece ter ganho. Para o governo e para os partidos que o apoiam (PS, BE e PCP), a proposta que a Comissão Europeia apresentou ontem para o orçamento plurianual da União é má para o país. Mas nos corredores de Bruxelas é um português um dos vencedores de destaque, olhando para as verbas atribuídas a cada pasta. De 14 protagonistas europeus, incluindo o presidente do Conselho (Donald Tusk) e o primeiro-ministro holandês Mark Rutte, a reputada publicação Politico selecionou Carlos Moedas para o primeiro lugar dos melhor colocados face ao orçamento que a Comissão Europeia propõe para os próximos sete anos.
O comissário europeu de Portugal terá um aumento de 30% para a pasta da Inovação – sendo que até o Reino Unido pós-Brexit manterá uma relação com a União Europeia no que à pasta de Moedas diz respeito.
Em declarações à imprensa, o comissário luso considerou o orçamento “o possível dentro da Europa em que vivemos”.
“Com o Brexit, estamos a sentir, pela primeira vez, na pele aquilo que é um dos Estados-membros sair da UE. Isso faz com que tenhamos este orçamento – que é um orçamento de 160 mil milhões por ano – e que vai ter de ter algumas reduções por uma questão simples: é que há menos dinheiro porque o Reino Unido sai da fotografia”.
Quanto aos cortes de 7% na política de Coesão, 5% na Política Agrícola Comum (PAC) e 4% nos pagamentos diretos – que muito incómodo causaram ao governo e ao parlamento português – Moedas disse serem “uma pena para a Europa”, ainda que acredite que a proposta passe o crivo dos Estados-membros.
Para o governo português, o cenário é ainda menos reluzente. Os cortes nos fundos estruturais causaram repulsa, tanto no ministro dos Negócios Estrangeiros Augusto Santos Silva quanto nos partidos com assento na Assembleia da República.
Santos Silva, também ontem, afirmou que a proposta da Comissão de Jean-Claude Juncker é “um mau ponto de partida”, assumindo que o processo negocial “não começa bem”. “No que diz respeito aos recursos da União Europeia, é muito insuficiente”, disse, depois concretizando: “As políticas de coesão e a PAC têm sido elementos essenciais para a integração europeia e para a convergência económica e social entre os Estados membros”, apontou, criticando os cortes “indesejáveis”.
Do lado da oposição, também o PSD criticou esses cortes. Rubina Berardo, social-democrata, disse mesmo que “o PSD não aceita que haja cortes na área da coesão e na política agrícola comum”, tendo o CDS também apontado ao mesmo. “O CDS não está contra novos desafios, novas áreas de investimento comunitário. Entendemos é que isso não pode ser feito à custa das verbas da agricultura e da coesão”, esclareceu Pedro Mota Soares.
Em comunicado, o PCP utilizou a ironia ao jeito de quem bem avisou. “O tempo e a vida demonstraram que os fundos da União Europeia nunca compensaram (nem podiam compensar) as perdas de soberania”, defendem os comunistas. “A proposta de Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027 hoje apresentada pela Comissão Europeia vem, assim, criar as condições para acentuar ainda mais o rumo de divergência que tem caracterizado a UE, com o aumento das desigualdades e das assimetrias entre Estados-Membros e dentro de cada Estado-Membro”.
Quanto ao Bloco de Esquerda, na voz da deputada Isabel Pires, “a política europeia está a seguir um caminho completamente errado”.
“Mais militarização e uma rubrica de controlo de fronteiras, que são as duas políticas que a Europa não precisa, especialmente porque estamos a retirar da coesão para uma maior militarização e, portanto, quem vai ganhar é a indústria do armamento”, sustentou a bloquista, sendo factual que a verba para segurança fronteiriça tem um aumento previsto.