Aos cinco vice-presidentes de Pedro Passos Coelho, a chegada do ‘rioísmo’ trouxe reações diferentes. Sofia Galvão, a única extraparlamentar, permaneceu silenciosa. Teresa Morais, que depois contribuiria para o programa de Santana Lopes, reservou-se a semelhante discrição pública – ainda que feroz nas críticas em reuniões parlamentares à porta fechada. Maria Luís Albuquerque permaneceu participante assídua nas comissões e, ainda recentemente, assinou um artigo bem direto ao PS no Observador.
Marco António Costa, que não apoiou ninguém na eleição interna e se proscreveu de cargos executivos, mantém-se na presidência da Comissão de Defesa e teve esta semana intervenção notória no congresso da Ordem dos Enfermeiros. Face a discursos mais discretos dos demais, o social-democrata colocou o dedo na ferida. E foi sobre a eutanásia. É «frontalmente» contra».
Contactado pelo SOL, Marco António esclarece o posicionamento. E defende um referendo num tema que «não pode ser decidido em âmbito estritamente parlamentar».
Hoje, quando olha para o partido, vê o PSD mais favorável ou mais contra a eutanásia?
Muito sinceramente não consigo ter uma leitura rigorosa ou concreta do posicionamento interno porque ainda não houve um debate suficiente aberto sobre esta matéria. Julgo que a circunstância de o líder do partido dar liberdade de voto relativamente a esta matéria faz com que o partido, em si mesmo, não se envolva num debate para tomar uma posição mas que cada militante e cada dirigente se procure envolver nos debates da sociedade civil, o que torna mais difícil essa perceção. O que é mais evidente é que a Esquerda – e o Bloco de Esquerda em concreto – tem trazido um conjunto de temas considerados mais fraturantes para a praça pública, de modo a ganhar um posicionamento central no debate político. Isto é: traz temas provocadores para se valorizar. E tem conseguido um conjunto de transformações na sociedade portuguesa sem, necessariamente, o consentimento da sociedade portuguesa.
É a liberdade de voto concedida por Rui Rio que impele os militantes a debaterem mais com a sociedade civil do que no nível interno?
Não. É indiscutivel que o PSD, em matérias de consciência, nunca se deixou condicionar pela opinião dos presidentes do partido. Creio que a posição que o dr. Rio assumiu é correta: deu a sua opinião a título pessoal e manifestou um princípio, que é a consciência de cada um que deve ditar as suas opções.
E por que razão Marco António Costa, em consciência, é contra?
Porque eu considero que há linmhas que não podem ser ultrapassadas. E a defesa da vida é uma dessas linhas. Há princípios que são estruturantes. A eutanásia é abrir uma porta perigosa.
Para o quê?
Um exemplo exagerado: qualquer dia começamos a questionar se valerá a pena investir em cuidados de saúde sofisticados em pessoas com idades avançadas. O problema da eutanásia é dar espaço para a relativização no debate sobre os princípios. Obviamente que se abre caminho para soluções, a meu ver, perigosas. Permitir essa relativização de principios em nome de determinados valores entramos num caminho que sabemos como começa mas não sabemos como acaba.
É católico. A sua religião influenciou esta tomada de posição?
Não. Eu separo as questões de natureza confessional – que vêm da minha fé e da minha formação – das questões políticas. Mas não escondo que sou católico, apesar de não frequentar regularmente iniciativas de culto. Tem mais a ver com a minha convicção do que devem ser os princípios orientadores da vida em sociedade e os valores de uma sociedade moderna e saudável.
Depois da sua intervenção no congresso dos enfermeiros recebeu feedback negativo ou positivo dentro do PSD?
Recebi bastantes reações. Acima de tudo, no próprio congresso e de algumas pessoas que ficaram a saber a minha posição, recebi posições favoráveis e desfavoráveis. A maioria favoráveis. Mas mesmo as desfavoráveis apreciaram o facto de não me ter escondido numa posição politicamente correta. Disse aquilo em que acredito. Sou frontalmente contra [a eutanásia].
Falou até de uma experiência mais sua.
Sob o ponto de vista pessoal, houve uma situação que me poderia ter levado a ser favor. É verdade. Mas preferi esclarecer que há princípios de que não vale a pena abdicar em nome de uma alegada modernização da sociedade. Para mim, o debate não pode ser estabelecido entre ‘modernos’ e ‘conservadores’. O que estamos a falar é central – é a vida humana – e não há posições conservadoras ou modernas sobre a vida.
Acerca do facto de o referendo que propõe não ser unânime no PSD [Rui Rio já disse que, na sua opinião não é matéria de referendo], que lhe parece?
Os temas fraturantes não podem ser decididos em âmbito estritamente parlamentar. Não referendar estes temas é teleguiar a sociedade rumo ao caminho que só alguns desejam em vez de ouvir a sociedade para transformá-a consoante a sua opinião.