Há para todos os gostos e para todos os desgostos, admita-se.
Um homem enriquece na política e vive a crédito do que não tem.
Outro resolve fazer uns biscates de ministro enquanto recebe o triplo, na constância da função, de entidade privada.
Gere a riqueza longe dos olhares e investe insaciável off-shore e on-shore. Não é esquisito nem parvo.
Dirão alguns que a história não é nova. Já o pobre Adão, na esperança de manter o paraíso, abocanhou a maçã.
Ora, valha a verdade que o dito Adão não fazia parte de nenhum governo. Vestia-se com uma folha de parra. Era, apesar de tudo, contido e frugal.
O que, nestas histórias contemporâneas, avoluma a censura geral é a especial responsabilidade dos intervenientes, o seu estatuto.
Estamos, portanto, perante atos inacreditáveis.
É isto mesmo o que, finalmente, alguém, da família, admite juntando a raiva à vergonha.
Bastaria este enunciado, o tempo decorrido, tudo quanto se tem visto e ouvido contra um silêncio ensurdecedor, para se estranhar a duração da cegueira. Alguém esfregou os olhos.
A César o que é de César…
Não pode, portanto, ninguém que à política se dedique e represente o povo, alhear-se deste problema, reduzi-lo, fingir não compreender a sua dimensão.
Claro que a história poderá não ficar por aqui.
Nas rendas, por exemplo…
Foram os portugueses prejudicados? Foi o Estado abusado? Foi o sistema político corrompido? Foi a decisão influenciada por critérios outros que impuseram interesses privados ao interesse público?
Estes são os outros níveis da indagação necessária.
Seremos obrigados a encontrar a serpente e o seu veneno.
E como?
Repousando na ação da Justiça, admitindo a demora, o jogo completo do contraditório, os recursos dos recursos, o primado da dúvida na apreciação do caso?
Ou, confiando na capacidade de uma comissão de inquérito se vergar ao peso dos factos e afastar a clubite partidária?
Ou, reproduzindo a complexidade, nessa mesma comissão de inquérito, juntando todos os que de algum modo contribuíram para o desastre final, mesmo que entre uns e outros as distâncias sejam infinitas?
A verdade é que, ainda que a opção se baseie em que se quer descobrir tudo, doa a quem doer, é percetível a proteção do infrator, o manto solidário, uma cantiga de amigo.
Isto é…
Quem defende a iniciativa privada, quem a apoia e promove, em termos gerais, mesmo sem ofender a legalidade, é igualmente condenável.
Um exagero oportuno, portanto.
Quem, mesmo tão corrupto como imaginoso, mesmo tão sensível como interessado, mesmo tão aberto como influenciável, estiver a praticar o mal em nome do bem do povo, é outro, é diferente, é bom.
Estávamos todos entretidos com isto e, noutro plano, descobre-se que um personagem levou à glória um sistema de saúde e assim se evitou que o mesmo acontecesse noutro.
País extraordinário este, em que, felizmente, qualquer jovem de vinte anos percebe um discurso…