A notícia desta sexta-feira. 11 de maio de 2018, é a oferta pública de aquisição (OPA) que o maior acionista da EDP (já tem 28% do capital) fez pela totalidade da empresa, bem como pela sua subsidiária, a EDP Renováveis. Os chineses estão assessorados nestas operações pelo Millenium BCP.
A desproporção entre os pesos das duas economias é enorme: a China ultrapassou recentemente o Japão para se tornar a segunda maior economia do mundo, enquanto que a economia portuguesa nem representa 2% do total da economia da zona-euro.
Quando, na segunda metade da década de 1990, a febre das privatizações arrancou em Portugal, as pessoas menos informadas sonharam que poderíamos ter multinacionais decentes. E alguma coisa foi feita nesse sentido. A Cimpor foi comprando metodicamente cimenteiras em outros países, ao ponto de ser a primeira empresa a passar o risco de ter mais de 50% da faturação fora de Portugal. Foi alvo de cobiça, nacional e estrangeira, e acabou vendida a um conglomerado brasileiro, e depois desmembrada. Perdeu-se um “centro de decisão nacional”.
A Portugal Telecom também apostou forte na sua expansão internacional, comprando a Vivo, a maior operadora de telemóveis brasileira, que operava no importante estado de São Paulo, e pagando um valor extraordinariamente elevado, que deixou toda a gente pasmada. Erros subsequentes de gestão e a ligação estreita ao grupo Espírito Santo deixaram a PT uma sombra do que foi, e em mãos estrangeiras.
Depois, veio a EDP. Produzir e vender eletricidade é um negócio estável, pelo que, nas palavras da minha analista chefe, “desde que não joguem dinheiro pela janela fora, são rentáveis”. Mesmo assim, a insegurança no primeiro governo de Guterres era muita, pelo que na primeira fase de privatização as ações foram vendidas a preço de saldo, e por isso dei, sem hesitar, um conselho de compra. Só achei menos piada quando retiraram à EDP, por tuta e meia, a REN, e por isso mudei o meu conselho para venda.
E hoje, qual é o consenso sobre o que deve ser público? À parte a Caixa Geral de Depósitos, não há. E há mesmo quem defenda que a CGD deve ser privatizada. Mas, como explicou, nos seus tempos de respeitabilidade, o Dr. Ricardo Salgado, “se juntássemos todos os bancos portugueses num só ficaríamos com um banco médio de dimensão europeia, que então poderia ser comprado por um banco realmente grande”.
Só ninguém defende que se deva privatizar a justiça, porque seria difícil rentabilizá-la. Na defesa, hoje já não temos mercenários, mas nada impede que voltemos a ter (tínhamo-los há quatro décadas, não foi assim há tanto tempo). Na educação e na saúde, público e privado competem. Na saúde a vantagem vai para o privado, na educação ainda há excelentes universidades públicas. Resta a idiossincrasia de 51% do capital da TAP ser público, o que um futuro governo poderá inverter com facilidade.
De facto, quando se tomou a decisão de privatizar 100% do capital da EDP, sabia-se muito bem que um dia como o de hoje podia acontecer. Decisão ideologicamente motivada, tomada por decisores de um país grandemente endividado. E ninguém duvida que os compradores irão colocar os seus próprios interesses à frente dos interesses de uma EDP maioritariamente portuguesa. Por isso, se eu fosse cliente do BCP, passava a pedir um desconto. É que montar uma operação desta dimensão não é barato, ajudando os lucros de 2018 do BCP.
Afinal, o que nos resta? Muito pouco. 51% da TAP, a Companhia das Lezírias, e alguns ativos que hoje não têm grande dimensão. Controlados por portugueses, só as compras em alguns supermercados: o Continente e o Pingo Doce são controlados maioritariamente pelas famílias Azevedo e Santos, respetivamente, que não estão atualmente na disposição de vender. Porque sabem que, no dia em que venderem, perdem o controlo. Nas palavras do empresário belga Albert Frére: “pequeno acionista minoritário, pequeno tolo. Grande acionista minoritário, grande tolo”.