O presidente norte-americano não se encontrava ontem na inauguração da embaixada dos EUA em Jerusalém, mas o seu vulto, assim como o seu nome, pairavam pelo edifício empedrado que Donald Trump ofereceu ao governo de Benjamin Netanyahu, talvez a figura mais satisfeita nas cerimónias. Tinha razões para isso. Afinal de contas, ao cabo de poucas semanas, recebeu de Washington duas ofertas de grande magnitude: a deslocação da embaixada de Telavive para Jerusalém e o fim do acordo nuclear iraniano. “Deus abençoe os Estados Unidos da América e deus abençoe Jerusalém, a eterna e una capital de Israel”, afirmou “Bibi” Netanyahu, que atravessa simultaneamente os melhores e o piores momentos dos seus 12 anos de poder. Israel soma as suas mais suculentas vitórias diplomáticas, mas o primeiro-ministro lida também com vários escândalos políticos em explosão coordenada. A sua sobrevivência é incerta. A do seu Estado, não. “Hoje, a embaixada da nação mais poderosa da Terra, do nosso maior aliado, os EUA, está a ser inaugurada aqui. Que a sua abertura nesta cidade alastre a verdade.”
Dezenas de convidados americanos e israelitas gritaram ontem o nome de Trump nos intervalos dos discursos em Jerusalém. A comitiva da Casa Branca, de facto, surgiu liderada por um Trump, Ivanka, a filha e conselheira do presidente, acompanhada do seu marido, Jared Kushner, como ela, judeu ortodoxo. Kushner, a quem recentemente foi retirada a autorização para receber informações confidenciais, é também o enviado de Donald Trump para negociar a mesma paz no Médio Oriente que se tornou mais improvável com o fim do acordo iraniano e a deslocação da embaixada – que o digam os bombardeamentos israelitas da semana passada contra posições iranianas na Síria e a retaliação violenta aos protestos de ontem. “Como temos vindo a assistir nos protestos do último mês e mesmo hoje, aqueles que provocam violência fazem parte do problema e não da solução”, disse, dirigindo-se aos palestinianos que se manifestavam na Faixa de Gaza.
As referências de Kushner aos confrontos de ontem foram as únicas ouvidas entre as grandes figuras cerimoniais – entre as quais se encontrava, por exemplo, um dos conselheiros evangélicos do presidente americano, Robert Jeffress, que no passado afirmou que judeus e muçulmanos vão para o inferno: o mesmo destino que reserva a apoiantes de Hillary Clinton. A abertura da embaixada americana, aliás, foi em muitos aspetos uma representação do ambiente de êxtase nacionalista que se vive em Israel. Chemi Shalev, o editor da versão americana do jornal “Haaretz” descreve-o: “Em Israel, por estes dias, Benjamin Netanyahu é rei e Donald Trump é um deus”, escreve. “A adrenalina e testosterona que corre pelas veias da nação pode em breve transbordar”. Netanyahu era ontem disso exemplo. Ayelet Shaked, ministro da Justiça do seu governo, também. “[Trump] voltou atrás com a política de capitulação de Chamberlain e está a mostrar ao mundo que o senhorio regressou”, disse ontem.