O Portugal político e litoral descobriu que existiam dois países há um ano, com a tragédia dos incêndios de Pedrógão, que tiveram um segundo catastrófico remake em outubro. O abandono a que o Estado foi deixando, ao longo dos anos, os portugueses desse ‘segundo país’ cada vez mais despovoado e com menos serviços públicos revelou-se gritante.
O país político é profundamente centralista. E o país jornalístico também – o centralismo dos meios de comunicação social foi-se tornando cada vez mais visível nos últimos anos. A crise do setor fez eliminar muitos postos de trabalho, nomeadamente os dos correspondentes que permitiam que a voz do interior chegasse aos grandes órgãos de comunicação social. O desinvestimento em publicidade na imprensa também provocou este fenómeno perverso: a nível nacional, ninguém sabe o que os habitantes do interior pensam, porque não está lá ninguém para o contar em regime de permanência.
Mas houve, claramente, um acordar nos últimos tempos. O movimento da sociedade civil onde pontificam antigos políticos e atuais políticos, como Jorge Coelho, natural de Mangualde; Silva Peneda, presidente do Conselho Geral da Universidade de Trás-os-Montes, o antigo ministro das Finanças Miguel Cadilhe, o presidente da Câmara da Guarda Álvaro Amaro, entre outros, propôs ontem medidas «revolucionárias, porque com falinhas mansas não se vai lá», como disse Silva Peneda. E tem razão: já houve demasiadas falinhas mansas. Para travar o desaparecimento desse segundo país é preciso uma revolução nas consciências e nas políticas.
As medidas são, em geral, boas e, de facto, revolucionárias. A discriminação fiscal, a dotação do Estado pelo menos de 200 milhões para financiar os programas de habitação, a transferência para as autarquias de todos os edifícios públicos abandonados e a polémica – mas correta – ideia de deslocalizar 25 serviços públicos de Lisboa para cidades do interior, com grandes incentivos aos funcionários, são medidas fundamentais para começar uma revolução. Haja vontade política genuína. O interior já não aguenta mais falinhas mansas.