Acordo nuclear. Europa conta os trunfos, mas Irão só vê duques

Bruxelas apressa-se e engole o orgulho para salvar o pacto. Putin recebeu Merkel e em breve estará com Macron. Cimeira crucial é na sexta.

O governo iraniano considera que a comunidade europeia tem de fazer mais para compensar a saída americana do acordo e evitar uma corrida nuclear no Médio Oriente.

A mensagem, para já, é lida como um aviso semipúblico aos responsáveis europeus de que não bastará um penso rápido para preencher o fosso deixado pela saída americana do pacto. O ministro iraniano dos Negócios Estrangeiros comunicou-o este domingo ao comissário Europeu da Energia e a conversa viu-se rapidamente publicada na agência de notícias estatal IRNA.

Teerão, por outras palavras, pressiona o passo europeu. “Com o abandono da América, o apoio político europeu ao acordo é insuficiente”, declarou Mohammad Javad Zarif.

A Europa, em todo o caso, parece apressar-se ao ponto do desconforto. Angela Merkel engoliu em seco os últimos meses de colisão com o governo russo e na sexta-feira encontrou-se com Vladimir Putin em Moscovo. Emmanuel Macron fará o mesmo na quinta, um dia antes de uma cimeira crucial em Viena, na qual estarão reunidos pela primeira vez os signatários não americanos do pacto nuclear.

Muito do futuro do acordo nuclear ficará decidido nesse momento e a Europa consulta as suas cartas e as dos outros. Se Zarif fez já a tournée por Pequim, Moscovo e Bruxelas, agora é a vez de os dois principais líderes europeus contactarem Rússia e China para, juntos, tentarem salvar o acordo deixado à deriva por Donald Trump. Trata-se do primeiro grande embate europeu contra o isolacionismo americano, assim como havia aconselhado há ano e meio Angela Merkel, nos primeiros dias do novo presidente americano, quando disse que os europeus já não podem confiar no parceria transatlântica.

Putin, isolado, recebe os avanços com agrado. Entregou até a Merkel um ramo de rosas vermelhas na sua chegada.

Movimentações

“Até nos momentos mais difíceis, nunca deixámos de nos contactar”, disse o presidente russo. “A vida continua, evolui, e novas oportunidades surgem”, acrescentou, não escondendo a bênção que o abandono americano do palco internacional concede a uma Rússia que, ainda há dois meses, assistia a notícias de que centenas de diplomatas seus seriam expulsos de vários países ocidentais.

“Temos interesses estratégicos comuns”, lançou Merkel, em Moscovo, onde discutiu também o projeto Nord Stream 2, através do qual a Rússia aumentará o fornecimento de gás para a Europa Central – que, por sua vez, ficará mais dependente da sua energia, o que não cai nada bem ao governo norte-americano.

Questionada sobre se o encontro em Moscovo é um sinal de que as relações estão a suavizar-se, Merkel evitou uma posição forte: “Considero absolutamente importante conversarmos um com o outro.”

Jean-Claude Juncker revelou na semana passada um esboço de resposta à saída americana, acenando, por exemplo, com pagamentos diretos ao Banco Central do Irão pelo seu petróleo e uma rede de proteção para as empresas europeias dispostas a ignorar as ameaças americanas.

Washington, contudo, não assiste de braços cruzados. O secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, afirmou esta segunda-feira que o governo de Trump está a preparar o maior conjunto de sanções iranianas “da História” e indicou de novo que o grande objetivo americano é agora – e de novo – o de forçar uma mudança de regime em Teerão.

“O povo iraniano tem de tomar decisões sobre a sua liderança”, lançou Pompeo. “Seria maravilhoso que tomassem uma decisão com rapidez. Caso optem por não o fazer, seguiremos o nosso rumo com severidade até alcançarmos os objetivos pretendidos.”