Luto nacional. “O Arnaut é uma lição de vida”

O país está de luto com a morte de António Arnaut. O fundador do PS e “pai” do Serviço Nacional de Saúde partiu aos 82 anos

António Arnaut foi batizado como o pai do Serviço Nacional de Saúde e foi por ele que lutou até ao fim da vida. Manuel Alegre, um dos amigos de sempre, conta que há poucos dias falou com o fundador do PS: “Manel, temos de defender o Serviço Nacional de Saúde.” Manuel Alegre não escondeu a tristeza por ver partir o socialista “mais genuíno” que conheceu. “O Arnaut é uma lição de vida. Para ele, o socialismo e a liberdade não eram conceitos, eram uma forma de vida. De coerência e de vida”, diz ao i o histórico do PS. Para Alegre, a melhor homenagem que se pode fazer a António Arnaut “é cumprir o último apelo dele, que foi salvar o SNS”. 

António Arnaut morreu aos 82 anos em Coimbra. Foi decretado um dia de luto nacional e o Partido Socialista decidiu que a bandeira do partido deverá ser colocada a meia haste em todas as sedes. O PS lamentou a perda de “uma verdadeira e incontornável referência ética e política de todos os socialistas portugueses”. 

Foram muitos os socialistas a homenagear Arnaut. O secretário-geral do PS, António Costa, realçou que “todos o recordaremos justamente como o pai do Serviço Nacional de Saúde”. Carlos César, presidente do PS, considerou que com “o desaparecimento de António Arnaut, nosso presidente honorário, sobretudo nosso presidente afetivo, desaparece uma parte muito significativa da nossa memória”. 

Esteve no PS desde o primeiro dia. Era o militante número 4. Só foi ministro uma vez e por pouco tempo – durante os oito meses que durou o governo de coligação entre o PS e o CDS, em 1978 –, mas não perdeu a oportunidade de deixar uma marca profunda na sociedade portuguesa com a criação do Serviço Nacional de Saúde. Foi também deputado à Assembleia Constituinte e à Assembleia da República. “Há dias pediram–me para escolher os três grandes momentos da minha vida. Pondo de parte os filhos e as coisas familiares, que reservo para a intimidade, os momentos luminosos da minha vida, por ordem, foram estes: a fundação do Partido Socialista. Chorei. A aprovação da Constituição. E a aprovação da Lei do Serviço Nacional de Saúde”, disse, em 2016, numa entrevista à revista “Saúde”.

Foi fiel aos seus valores até ao fim e nunca fez cedências. Talvez por isso tenha abandonado tão cedo a política ativa. “Eu deixei a política em 83 porque o poder económico começou, nessa altura, a querer mandar no poder político e começou a subsidiar as campanhas (…) Percebi que havia uns fumos no ar. A expressão fumos de corrupção vem dessa altura. E eu pensei: ‘Isto não é para mim, eu estou aqui deslocado.’ Fui-me embora”, contou, há dois anos, numa entrevista ao i. Saiu da política ativa, mas nunca deixou de ter uma acesa intervenção pública. Desde 2016 que é presidente honorário do PS. No congresso do partido em que foi convidado para o cargo, o fundador deixou um apelo aos socialistas: “Vamos pela esquerda, que é o lado do nosso coração.” 

Assumiu cedo a sua ligação à maçonaria. Foi grão-mestre do Grande Oriente Lusitano entre 2002 e 2005. A maçonaria, em comunicado, realça que António Arnaut “foi e será sempre um exemplo para todos os maçons, especialmente para os do Grande Oriente Lusitano, de que foi grão-mestre e onde permanecerá como fonte inspiradora para todos nós”.
O corpo de António Arnaut estará em câmara ardente na antiga igreja do Convento de São Francisco, em Coimbra. Sairá hoje, às 16h30, para o crematório da Figueira da Foz. Com M. F. R.