Um congresso de um partido que está no Governo, com a alegria de beneficiar de grande popularidade, em que a liderança não é discutida e a moção do líder faz bocejar um santo, corre o risco de ter um interesse 5000 vezes inferior ao do casamento entre o príncipe Harry e Meghan Markle. No castelo de Windsor, no sábado passado, sempre se podia comentar vestidos e chapéus.
A verdade é que Augusto Santos Silva, o ideólogo deste Governo como já foi do de Sócrates, avançou com matéria substancial para discutir no Congresso, ao defender que o PS é o PS moderado de sempre, apesar de apoiado por comunistas e bloquistas. Vão os socialistas ‘recentrar’ o discurso? Vão dar um pontapé na aliança com PCP e Bloco e sonhar com um futuro blairista? Se não houver maioria absoluta em 2019, os braços de Rui Rio são o próximo consolo? Será que existe «uma pequena ala direita» como defende o futuro candidato a secretário-geral Pedro Nuno Santos ou os últimos desenvolvimentos no Governo, a ascensão de Centeno ao Eurogrupo e o sucesso europeu vão fazer voltar o PS ao sítio onde estava antes da esquerdização do discurso promovida por António Costa?
No discurso de arranque do Congresso da Batalha, deu o sinal de que não quer ninguém a comentar chapéus, quanto mais ideologia. Se este é um indício do que vem aí, então Augusto Santos Silva estava certo: o PS vai moderar-se ao máximo e abandonar arroubos esquerdistas. Aquilo que foi o tom dos socialistas logo a seguir à formação da ‘geringonça’ e no congresso de há dois anos, quando o Governo tinha apenas seis meses, é para extinguir. Costa não vê nenhum problema ideológico no PS – e de Soares a Jaime Gama, de Almeida Santos a António José Seguro reivindica toda a história. A ‘geringonça’ não mudou nada. «O PS tem uma identidade única, vincada, e nenhum português tem dúvidas em saber o que é o PS e onde está o PS». Esta frase de Costa tem um subtexto: não venham agora com debates ideológicos, precisamente o contrário do que o presidente da mais importante Federação do PS, Duarte Cordeiro, defendeu em entrevista ao i.
Digamos que Francisco Assis, opositor da ‘geringonça’ desde a primeira hora, deverá rever-se totalmente neste discurso de Costa. E se isto não é um corte epistemológico, o que é um corte epistemológico?