Terras raras. Grande potencial mas com mineração complicada

O Japão tem no fundo do seu mar minérios suficientes para assegurar o seu futuro industrial. Mas a sua extração é difícil e a China, principal produtora, procura controlar o mercado

O futuro industrial do Japão para as próximas centenas de anos poderá estar assegurado pela confirmação de que há milhões de toneladas de terras raras na costa do país. A Universidade de Tóquio e a Agência do Japão para a Ciência e Tecnologia da Terra e do Mar (JAMSTEC) confirmaram que no fundo oceânico ao largo das ilhas de Ogasawara há grandes concentrações de terras raras. 

O problema é a sua mineração. Estes minérios estão a 6 mil metros de profundidade e não há, nem se pensa que exista nas próximas décadas, tecnologia capaz de fazer esta extração. Ainda assim, o governo nipónico promete empenhar os seus recursos de forma a libertar o país da dependência da China em termos de terras raras. Pequim tem mais de 90% destes minérios a nível mundial. 

De acordo com os investigadores, há uma faixa de 400 km2 naquele fundo oceânico que tem 16 milhões de toneladas de metais de terras raras, incluindo itério suficiente para 780 anos de procura doméstica, 620 anos de európio, 420 anos de térbio e 730 anos de disprósio. “Esta lama tem um grande potencial como recurso de terras raras devido à grande quantidade disponível e às suas características minerais vantajosas”, resume um especialista citado na imprensa internacional.

Ao i, o LNEG – Laboratório Nacional de Engenharia e Geologia explica que as “terras raras são um grupo de 17 elementos químicos de relativa abundância na crosta terrestre”. São estes o lantânio, cério, praseodímio, neodímio, promécio, samário, európio, gadolínio, térbio, disprósio, hólmio, érbio, túlio, itérbio e lutécio, e estão divididos “em terras raras leves e pesadas, sendo as pesadas as mais raras e mais valiosas”. 

De acordo com o LNEG, o “termo ‘raras’ é um equívoco porque a sua concentração na crosta terrestre é superior à dos metais nobres e elementos do grupo da platina” e o “termo vem da sua difícil extração, por serem tóxicas, poluentes e, em muitos casos, radioativas”. 

Fernando Barriga, professor na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, explica ao i que estes metais “têm enorme importância na indústria, desde ligas a ímanes permanentes, lasers e ecrãs fluorescentes responsáveis pelas cores vivas dos ecrãs dos televisores de ecrã plano, monitores de computadores e smartphones”. 
Segundo Fernando Barriga, os “ímanes permanentes são usados em larga escala em aplicações verdes, incluindo nos automóveis híbridos e elétricos, turbinas eólicas e outras”, acrescentando que as terras raras são “ainda utilizadas na refinação do petróleo e em muitas outras aplicações”. 

Poder da China “Nos anos 2000, quando da disputa entre a China e o Japão por causa das ilhas no mar da China Oriental, a China impôs um embargo de facto às terras raras que estavam a ser vendidas ao Japão, apesar de o ter negado”, revelou um professor japonês citado na imprensa internacional. “Estes elementos são críticos para futuras gerações de tecnologia e Tóquio respondeu de imediato indo à procura de novas fontes, incluindo a Mongólia, de forma a assegurar o fornecimento e manter a vantagem tecnológica do Japão”, acrescentou. 

O Japão tem investido muito na exploração do leito do mar da sua zona económica exclusiva (ZEE) para encontrar estes minérios, e a sua descoberta justifica que Tóquio reclame a soberania sobre grande parte do Pacífico ocidental, incluindo o remoto atol de Okinotorishima. Tanto a China como a Coreia do Sul têm-se oposto ao reconhecimento de Okinotorishima como ilha, afirmando que é só um atol incapaz de albergar vida humana e, por isso, não deveria ser usada para alargar a ZEE japonesa. 

Mineração complicada Em relação à questão da mineração, um especialista afirma que, se virmos os sites das 20 principais empresas mineiras mundiais, nenhuma delas tem listadas atividades no fundo do mar. 

Reconhecendo que no Japão há um grande depósito, o mesmo professor universitário acrescenta que quem quer que seja que esteja interessado em explorar comercialmente estas terras raras terá de investir milhares de milhões em tecnologia para raspar, fazer explodir e cortar o leito do mar, rebocando os pedaços valiosos milhares de metros até à superfície e mitigando impactos ambientais, que poderão ser gigantescos. 

“É algo para além do domínio daquilo que as empresas mineiras estão dispostas a fazer”, diz um especialista em terras raras. “É como se fossem descobertas coisas em cometas ou asteroides.” 

“Nos fundos marinhos (incluindo nas planícies abissais, a 4 mil ou 5 mil metros de profundidade) existem recursos gigantescos contendo quantidades de terras raras assinaláveis em sedimentos não consolidados”, explica Fernando Barriga, acrescentando que “a generalidade das rochas contêm quantidades subeconómicas de terras raras que raramente podem ser mineradas”. Segundo o professor da Faculdade de Ciências, as “principais reservas de terras raras (suscetíveis de extração económica) ocorrem na China, Vietname, Brasil e Rússia. O principal produtor é a China, com 81% da produção mundial em 2017”. 

Ao mesmo tempo, a China está a tentar solidificar o futuro monopólio no mercado de terras raras. As empresas apoiadas pelo Estado trabalham para assegurar direitos de exploração mineira, colocando a funcionar depósitos da África do Sul e América do Sul que “garantem uma descida do preço e produzir com perdas durante tempo suficiente para eliminar qualquer concorrência dos oceanos”. 

De acordo com os especialistas, se a China quiser manter o domínio das chamadas energias limpas vai precisar de todos esses metais. 

O maior produtor de terras raras é a chinesa Bayan Obo, que produz essencialmente a gama de terras raras pesadas, seguida da australiana Mt. Weld Deposit. Há também produção na Rússia, Brasil, Tailândia, Índia, Malásia e Vietname, e ainda vários projetos promissores em fase de avaliação, nomeadamente Norra Kärr (Suécia), Kvanefjeld (Gronelândia), Steenkampskraal e Zandkopsdrift (África do Sul), Nolens Bore e Dubbo Zirconia (Austrália), Dong Pao (Vietname), Hoidas Lake e Nechalacho (Canadá), Bear Lodge (EUA) e Lofdal (Namíbia). 

Segundo o LNEG, “atualmente, a substituição das terras raras em algumas das suas principais aplicações é um objetivo que tem estado a ser estudado, mas não são previsíveis soluções viáveis a curto prazo”. Ao i, o laboratório aponta que a “tendência atual será mais para a minimização do seu uso e não para a sua substituição no imediato”, defendendo que “uma estratégia a prosseguir para responder ao desafio do risco de fornecimento das terras raras será implementar a reciclagem de produtos em fim de vida que contêm estes elementos”.