António Costa está ‘noutra’, como já é público e notório. O Bloco de Esquerda e o PCP já perceberam que para António Costa se tornaram dispensáveis senão mesmo empecilhos ou tralha de que fará sair de ‘casa’ – «o PS de sempre», mantra do Congresso – o mais rapidamente possível. Esta semana, Jerónimo de Sousa manifestou a sua «crescente preocupação» com o aumento dos «sinais e práticas que indiciam uma travagem, senão uma inversão de rumo».
Francisco Louçã, fundador do Bloco, tinha ido mais longe: «Para António Costa terminou a fase dos acordos de esquerda. Está a preparar as próximas eleições no sentido de dispensar qualquer acordo de esquerda».
Os parceiros do Governo têm razão: o mundo mudou para António Costa e eles já não fazem parte da equação. António Costa dá-se ao luxo de assinar um acordo de concertação social sobre trabalho sem se dignar dar uma palavrinha aos homens e mulheres que lhe sustentam o Governo na Assembleia da República – e com quem estava precisamente a negociar reformas no trabalho.
Não é falta de educação, é estratégia. O novo mundo de Costa, como se viu nos discursos do Congresso e que a própria moção de estratégia aprovada deixa indiciar, já não passa pelo PS virado à esquerda, a estratégia escolhida pelo secretário-geral desde o momento em que decidiu afrontar Seguro a seguir às eleições para o Parlamento Europeu de 2014.
O momento simbólico foi quando, dirigindo-se aos parceiros que transformaram um derrotado das eleições em primeiro-ministro, repetiu a célebre frase de Vítor Gaspar: «Não há dinheiro». Foi a propósito das reinvindicações dos professores, mas podia ser sobre qualquer outro tema.
A gasparização de Costa e o distanciamento da sua esquerda é tão evidente que é legítimo interrogar-nos sobre se o primeiro-ministro não deseja, de facto, antecipar eleições um ano, que seria a consequência de uma rutura com BE e PCP no Orçamento do Estado.
Ora, o medo da vitimização de Costa em eleições imediatas é grande à esquerda. E só assim se pode entender o facto de Fernando Rosas, fundador do Bloco, apontar a «deslealdade negocial séria» mas alertar que é preciso «cabeça fria e não abrir nenhuma crise com o Orçamento». Costa parece desejá-la.