Docentes. Braço-de-ferro vai acabar nos tribunais

Sindicatos queixam-se de ilegalidades do governo para travar a greve às avaliações dos alunos, fazem queixa ao Ministério Público e entregam providências cautelares.

Docentes. Braço-de-ferro vai acabar nos tribunais

O braço-de-ferro entre sindicatos de professores e o Ministério da Educação vai acabar nos tribunais. A greve anunciada às avaliações por causa do descongelamento de carreiras levou a tutela a avançar com orientações nas escolas para superar a paralisação. Resultado? Os sindicatos classificaram o processo de ilegal e chamaram os seus advogados para preparar uma resposta contra o executivo. O Ministério da Educação deixou o secretário de Estado da tutela a fazer as despesas de defesa da equipa de António Costa num dos  mais críticos dias para a relação com os docentes. 

O  S.T.O.P deu entrada com duas providências cautelares nos  Tribunais Administrativos do Porto e Lisboa. A Fenprof, pela voz de Mário Nogueira, acrescentou que iria entregar amanhã uma queixa junto da Inspeção-Geral de Educação, do  Ministério Público e da Provedoria de Justiça, e a FNE prometeu também uma resposta jurídica contra a equipa de Tiago Brandão Rodrigues.

O Ministério da Educação deu instruções precisas para que os conselhos de turma não falhem no processo de avaliações. Para o efeito, as reuniões – onde são lançadas as notas dos alunos –, só podem ser adiadas duas vezes. Depois, cabe ao diretor de turma a recolha das notas, previamente, para a terceira reunião. Para os sindicatos trata-se de uma forma ilegal de obrigar os professores a cumprirem os serviços mínimos em período de greve às avaliações. O dirigente da FNE, João Dias da Silva, assegurou ao i que se trata de “uma obstrução do livre exercício de direito à greve”.

O S.T.O.P, sindicato recém criado, pede que ninguém obedeça às exigências do governo, e fez um guião nas redes sociais para os professores seguirem.  “A uma ordem ilegal não se obedece”, sintetizou ao i um dos responsáveis sindicais do S.T.O.P, José Oliveira.      

Coube ao secretário de Estado da Educação, João Costa, fazer a defesa do governo, deixando o ministro da Educação fora dos holofotes de mais uma medida polémica. João Costa foi primeiro, de manhã, à TSF, e depois, à tarde, falou às televisões. No Fórum TSF, o secretário de Estado refutou os argumentos dos sindicatos  de bloqueio à greve: “Objetivamente não coloca em causa [a greve]. Não estamos a negar o direito de faltar a essa reunião [conselho de turma]”, advogou. O governante explicou a opção do Ministério pelo despacho que seguiu para os agrupamentos de escola: “Poderá haver efeitos prolongados de  contínua e sucessiva não realização de reuniões”. 

Reuniões adiadas

O S.T.O.P já começou o protesto esta semana e inviabilizou 329 reuniões em agrupamentos de escola. A partir de dia 18 até 29 de junho, há greve às avaliações porque os professores querem o descongelamento de carreiras referentes a nove anos, quatro meses e dois dias. O governo só quer contemplar dois anos e nove meses, antecipando um custo de 140 milhões de euros. O primeiro-ministro já avisou que não há dinheiro para acautelar as progressões dos docentes, alegando um impacto na ordem dos 650 milhões de euros.

Bloco quer contas. Entre os partidos que suportam o PS no parlamento, a situação dos professores ampliou a tensão interna. A coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, colocou-se ao lado dos docentes. Sustentou que as contas dos professores para o descongelamento de carreiras são “compagináveis” e enviou um recado ao primeiro-ministro, António Costa. “A proposta faz justiça ao tempo de serviço dos professores, sendo também compaginável com o esforço das contas públicas”, afirmou ontem  Catarina Martins, no Porto, citada pela Lusa.

Os bloquistas entregaram, entretanto, um requerimento no parlamento, a pedirem o impacto orçamental do descongelamento de carreiras dos docentes, reportando-se a nove anos, quatro meses e dois dias, bem como o cenário proposto pela Fenprof de descongelar as carreiras dos professores, de forma faseada até 2023, com um valor inicial de 22 milhões de euros em 2018.  Mais, o Bloco pediu ao Executivo “o cenário apresentado pelo governo de recuperação integral do tempo de serviço, incluindo o impacto do faseamento previsto para o descongelamento das carreiras da Administração Pública”. 

A atitude do Bloco de Esquerda é um sinal para que António Costa encontre uma solução clara para a aplicação da lei antes da discussão do Orçamento do Estado para 2019.

Cerco no Parlamento

O ministro da Educação delegou ontem no seu secretário de Estado da Educação as reações aos sindicatos, mas, no parlamento, o Bloco de Esquerda conseguiu aprovar, ao final da tarde,  uma audição urgente de Tiago Brandão Rodrigues, na Comissão de Educação, sobre o descongelamento de carreiras. O pedido foi aprovado por unanimidade.
Na próxima sexta-feira, o PCP marcou um debate sobre “a organização do próximo ano letivo, carreira e concursos dos docentes”, onde o governo tem seis minutos para convencer os comunistas da sua estratégia. O tema dos professores será um dos pontos quentes do debate na ‘geringonça’ para o Orçamento do Estado de 2019, e o governo contou ontem com o apoio do antigo ministro das Finanças, Teixeira dos Santos. 

“Em geral, acho que [os professores] não têm razão”, afirmou Fernando Teixeira dos Santos, citado pela RTP3. “Custa-me a compreender que nos dias de hoje existam sistemas remuneratórios que assentem numa ideia de que há progressos automáticos”, declarou o antigo governante da equipa de José Sócrates, que foi não só o autor do congelamento das progressões de carreira na Função Pública, mas também do último aumento para o setor. O ex-governante  defendeu uma revisão do sistema de avaliações dos docentes nos próximos anos. 

A tensão aberta entre tutela e docentes agudizou-se. Ao que apurou o i junto de fontes sindicais, não houve qualquer contacto formal ou informal da parte do governo ou do gabinete do primeiro-ministros para se ultrapassar o impasse instalado na progressão de carreiras.