O debate da eutanásia acabou por ‘abafar’ outra questão ‘fraturante’ relacionada com a vida e a morte.
Refiro-me à lei das barrigas de aluguer (Lei n.º 25/2016, de 22 de Agosto). Fiquei incrédulo, contristado, pois não considero de forma alguma possível que uma mulher gere dentro de si uma criança – com toda a catadupa de hormonas/emoções que tal implica – para depois ‘dar’ essa criança a outra pessoa. Salvo se em estado de grande pobreza, ou se se tratar de uma pessoa desprovida de quaisquer sentimentos.
É certo que a lei diz que não poderão existir interesses pecuniários envolvidos. Mas quem poderá assegurá-lo E não poderá haver outras formas de pagamento, difíceis de detetar?
O facto de Portugal ser (com a Grécia, a Inglaterra e, com condições, a Bélgica) um dos poucos países da União Europeia que têm legislação neste sentido poderá fazer com que no nosso país se instale um lucrativo negócio de ‘aviários’ (ia a escrever ‘fábricas’ mas achei demasiado violento) de bebés.
Assim sugiro que, para tal evitar, a ‘barriga de aluguer’ apenas possa ser a de uma outra mulher familiar direta (mãe, filha, irmã ou prima em 1.º grau) da mãe que fornece o óvulo – como, aliás, sucedeu no primeiro caso de gestação de substituição. Isto porque nenhuma outra mulher aceitará esse fardo sem benefícios.
Outro problema relacionado com este é o de indivíduos isolados ou ‘casais’ do mesmo sexo que vão ‘fazer’ um filho a um país do Terceiro Mundo – ou mesmo da União Europeia, onde também, como se sabe, há zonas de pobreza e de grande desagregação moral – e depois o tragam para Portugal.
Ora, fará sentido preocuparmo-nos com a proveniência de uns poucos milhares de euros (concedo que com as grandes transferências seja diferente) e fingirmos que não vemos a proveniência das crianças? Devemos aceitar que portugueses estejam a promover, através do seu comportamento, essa nova forma de escravatura – pior do que a antiga, pois essa apenas dizia respeito ao corpo, enquanto a das ‘barrigas de aluguer’ diz respeito à totalidade do ser?
Esta situação, no caso de homens ou de ‘casais’ do mesmo sexo de indivíduos masculinos, poderá ter ainda contornos mais negros, pois não dispondo naturalmente de óvulos terão de conseguir um – e o processo mais fácil e direto é pertencer o óvulo à mulher que ‘aluga a sua barriga’ (desculpem-me a crueza da expressão) – mulher essa que estará assim vendendo o seu próprio filho.
Acresce – last but not least – que as crianças têm direito a ter um Pai e uma Mãe.
Por tudo isto, esse comportamento deve ser punido. Se a criança tem direito a ser registada, conforme aliás um acórdão do Supremo Tribunal Europeu (e dever-se-ia estudar em que termos), já o pai deveria sofrer prisão efetiva, embora não muito prolongada (p. ex., um ano) – isto para não penalizar a criança, que não pode ser esquecida.
A dignidade é aquilo que não pode ser mercantilizado (o conceito não é meu). Ao aceitarmos a mercantilização da vida, estamos construindo uma sociedade sem dignidade. E assim estes comportamentos, melhor, a sua pacífica aceitação – pois comportamentos mais ou menos desviantes sempre existirão –, põe em causa os fundamentos da sociedade.
Apelo a V. Exª, senhor Presidente, para que use todos os seus legítimos poderes e a sua influência moral para evitar estes males.