Visto deste século, António-Pedro Vasconcelos é o realizador de Os Imortais (2003), Call Girl (2007), A Bela e o Paparazzo (2010), Os Gatos Não Têm Vertigens (2014), Amor Impossível (2015) – lote a que vai juntar-se em breve Parque Mayer, protagonizado por Diogo Morgado e Alexandra Lencastre. Visto deste século, António Pedro Vasconcelos é um realizador a pensar em públicos, e por isso desalinhado, crítico feroz e recorrente da política de sucessivos governos para o cinema português. É ver os títulos que dá aos jornais. «A catástrofe que é o cinema português, a sua situação de irrelevância junto do seu público e no estrangeiro (basta ver os números), vai agravar-se», dizia no final do mês passado ao Expresso. «A esquerda, que alinha nesta teoria de que há um cinema de autor e um cinema comercial, e que acha que cabe ao Estado proteger o cinema de autor, essa esquerda gosta muito do povo, mas não gosta do público», diria já na semana passada ao Observador, numa entrevista a propósito do ciclo retrospetivo que a Cinemateca Portuguesa lhe dedica ao longo do próximo mês.
Entrevista que alimentou polémica nas redes sociais, não tanto pelo título – «O cinema português hoje é irrelevante» – mas por a Cinemateca ter partilhado o link no Twitter e no Facebook.
O que a retrospetiva que a Cinemateca lhe dedica vem lembrar é que há (houve) muito António-Pedro Vasconcelos antes disto. Basta ver como o realizador que contribuiu nos últimos anos de forma determinante para lançar nomes como Soraia Chaves ou Rui Unas, que teve um dos seus primeiros papéis em Os Imortais, é o mesmo que em 1972 chegava de Paris a filmar como filmavam os realizadores da Nouvelle Vague.
Foi isso Perdido Por Cem…, a sua primeira longa-metragem, de 1972, mais de dez anos antes do sucesso comercial de O Lugar do Morto (270 mil espectadores), que iniciou com produção de Paulo Branco, com quem rompeu durante o processo – juntos tinham fundado, em 1979, a VO Filmes, que produziu obras de realizadores como Manoel de Oliveira, João César Monteiro, Raúl Ruiz ou Wim Wenders.
Emergido já depois de Paulo Rocha, Fernando Lopes e António de Macedo, os três realizadores que deram início ao Cinema Novo português, António-Pedro Vasconcelos é tido ainda como um dos nomes fundamentais do movimento numa segunda fase, a partir da década de 1970.
Ao longo de um mês, a Cinemateca Portuguesa dedica uma restrospetiva integral à sua obra. De alguns dos seus primeiros trabalhos, na publicidade institucional, a Amor Impossível, a sua última longa de ficção, e ao seu último filme, um documentário televisivo, do ano passado, para a RTP: A Voz e os Ouvidos do MFA. Aliás, são vários os documentários – televisivos ou não – que António-Pedro Vasconcelos foi realizando ao longo da carreira, sobretudo nos anos que se seguiram ao 25 de Abril. Para a próxima quarta-feira está marcado um encontro entre o público e o realizador (18h30, Sala M. Félix Ribeiro, entrada livre), que, de resto, durante o mês de junho estará presente em todas as sessões.