Antes dos atentados da Al-Qaeda contra os Estados Unidos, em 2001, tinha sido estabelecido um período de ‘pausa estratégica’, durante o qual vários teorizadores em Relações Internacionais apresentaram os seus modelos prospetivos sobre a ‘nova’ situação internacional, tentando preencher o vazio deixado pela anterior estratégia: a contenção da expansão soviética durante a Guerra Fria.
Então, Samuel Huntington, com o seu Choque de Civilizações, e Francis Fukuyama, com o Fim da História, concordaram em defender que, uma vez comprovada definitivamente a obsolescência das formas totalitárias e concentracionárias do comunismo, não haveria qualquer outro sistema alternativo ao modelo democrático e à economia de mercado de modelo Ocidental.
Mas o que se verificou desde a ascensão de Putin foi a transformação dos conflitos, nomeadamente entre o novo terrorismo transnacional e os Estados. Terrorismo que alguns Estados apoiam, financiam e reconhecem como parceiro de pleno direito, valendo-se de guerras híbridas.
Nesta inquietante parceria Estado-terroristas, é elucidativo o recrutamento, por parte da Síria e do Irão, de milhares de elementos dos movimentos terroristas Hezbollah do Líbano e do Hamas de Gaza, integrando-os nas suas fileiras para auxiliarem o ditador sírio numa guerra civil de cruel violência contra os movimentos oponentes. Tudo sob o superior beneplácito político e militar da ‘nova’ Rússia, que já tinha intervindo ao lado dos separatistas na Ucrânia, empregando tropas suas!
A análise sistémica do novo ambiente internacional comprova que os Estados têm vindo a perder o monopólio da guerra, ao tornarem-se pequenos demais para poderem enfrentar os grandes problemas globais – mas grandes demais para gerirem os problemas locais, por lhes escapar o controlo dos mecanismos económicos e culturais que se desenvolvem em paralelo às suas políticas geoeconómicas.
Isto tem vindo a diminuir desde há décadas a margem de manobra dos Estados, devido a terem privilegiado os fatores transnacionais, que não controlam – como as migrações forçadas, as comunicações globais, a ação dos hackers no ciberespaço, os ataques ao meio ambiente ou o aquecimento global – em detrimento dos nacionais.
A atual realidade permite ainda constatar que os processos financeiros transnacionais, que atuam transversalmente ao Estado, têm vindo a constituir-se como centros de decisão oficiosos que crescentemente tendem a ultrapassar os centros de decisão política, provocando como que um ‘transbordar do Estado’ e das suas tradicionais competências históricas.
Acresce que os conflitos clássicos, determinados e desencadeados por ‘necessidades de Estado’, têm vindo a perder protagonismo, cedendo lugar a radicalismos culturais de matriz religiosa de características medievais que têm originado o aparecimento de ‘Estados falhados’ onde previamente foi criado um vazio de poder.
O terrorismo dito clássico típico da Guerra Fria transmutou-se num terrorismo global de natureza fundamentalista e metafísica, porque atua em nome de um Deus. Como a sua sede e células ‘operacionais’ são móveis e difusas, materializa uma ameaça com ramificações à escala planetária, atuando em estreita simbiose com o crime organizado.
Este ‘nevoeiro’ alterou as formas das manifestações de poder, originando a emergência de novos e por vezes descaracterizados atores que protagonizam as guerras híbridas em curso, contra a NATO e a União Europeia.
O novo ambiente geoestratégico mudou de configuração, assim como as fontes de tensão e de crise. Aumentaram as necessidades de segurança, potenciadas pela globalização da informação.
Esta situação na Europa é confirmada pela deriva do Brexit e pelo minar da parceria euro-atlântica na NATO. Tudo agravado pela incapacidade desta geração de políticos no poder em perceberem que a História sempre se repete e que pode estar a perfilar-se uma nova Termópilas, em que a traição de uns e o abandono de outros irá expor a Europa aos ataques dos novos bárbaros!