«Treinamo-los, equipamo-los, financiamo-los, incluindo alguém chamado Osama Bin Laden… e as coisas não correm muito bem para nós». Sobre terrorismo, Hillary Clinton, Secretária de Estado dos EUA, 2010.
Foi com um misto de surpresa e de satisfação que recebi a notícia de que um antigo aluno meu no mestrado de Diplomacia e de Relações Internacionais está a trabalhar numa organização que, entre outras matérias, estuda e combate o terrorismo. E, desde que tive oportunidade de trocar impressões com ele, revisitei o tema e reconheço a sua importância, até para países como o nosso – que, pelo menos até ao momento, parece estar longe de ter o terrorismo como um problema grave.
Mas Portugal, país membro da União Europeia, da NATO, da CPLP, das Nações Unidas e de outras organizações internacionais, tem uma situação geopolítica importante no triângulo estratégico Europa-África- EUA, que o deve levar a tratar o fenómeno do terrorismo com a maior seriedade. Apesar de ser um dos países mais seguros do mundo, a sua localização geográfica e as suas ‘pertenças’ políticas transformam-no num alvo potencial. Aliás, a organização terrorista Estado Islâmico identificou nos últimos anos Portugal como um dos alvos, no que diz respeito à reconquista de antigos territórios árabes…
O terrorismo é um dos problemas maiores para a Europa e para o mundo.
É algo com que o mundo, sobretudo nas últimas décadas, se tem debatido com muitas dificuldades e sérios desaires. Guerra e terrorismo são, na sua natureza e nos seus objetivos, coisas distintas. Mas têm causas e consequências semelhantes. Razões e motivações que se alimentam em muitos casos do mesmo – o ódio ao Ocidente, sobretudo à Europa e aos europeus, e o ódio aos EUA e aos americanos.
O terrorismo alimenta-se e muito dos novos e velhos media. Da publicidade na internet. De ações violentas, sangrentas e espetaculares. Não é por acaso que muitas das ações mais sangrentas e espetaculares ocorrem em locais muito frequentados pelas ‘massas populacionais’: aeroportos, aviões, ruas e avenidas, salas de espetáculos, estações de metropolitano, etc.
Tudo isto não acontece por acaso. Sobretudo em territórios, continentes e países ocidentais. O terrorismo tem sido e é o começo da decadência ocidental! Até quando? Até países como os EUA, a França e a Inglaterra, com o apoio de outros, sobretudo na União Europeia, continuam a cavalgar a unipolaridade ocidental, normativamente, politicamente, diplomaticamente, economicamente e militarmente. Muitos dos ex-terroristas que têm atacado o Ocidente foram pelo Ocidente recrutados, formados e financiados. E muitos terroristas do futuro talvez a esta hora já estejam a ser alimentados financeiramente pelos ‘donos’ do Ocidente.
Os que nunca quiseram perceber que o mundo não é plano. E que os sentimentos de identidade e de pertença valem mais que os biliões de euros e de dólares para se renderem à democracia demoliberal ocidental. Sobretudo se essa imposição for feita à bruta e sem respeito por valores de vida ancestrais.
Tal como a droga, a sida, a corrupção ou a escassez de água, o terrorismo anti-ocidental vive das suas raízes ocidentais. Não é politicamente correto afirmá-lo. Mas estas são verdades inconvenientes. Típicas de quem conhece a história, de quem respeita o passado, de quem não trocou a maturidade e as várias diferenças com séculos. Se os europeus e os ocidentais quiserem derrotar o terrorismo, não será apenas com mais guerras e ações militares, clandestinas ou oficiais.
A geopolítica não vive de ações gratuitas, protagonizadas por atitudes infantis de gente convencida da supremacia moral e política do Ocidente. O resultado das suas ações está à vista: nos últimos 15 anos aumentaram e de que maneira as guerras e os ataques terroristas. O seu alimento mediático é um erro.
Digam o que disserem, a sociedade aberta tem cada vez mais brechas. A ordem liberal faz cada vez mais vítimas. Povos de vários continentes escolhem cada vez mais protecionismo. A ordem iliberal faz cada vez mais mossa à ordem liberal. O globalismo tem cada vez maiores dificuldades.
O americanismo vai fazendo o seu caminho.
A nova ordem internacional parece caminhar para velha. O Ocidente continua a ser uma fábrica de terroristas. As guerras por procuração tendem a aumentar. A ‘NATO árabe’ falhou. E o ‘polícia do mundo’ (EUA) reforça a sua relação com o maior produtor de crude (Arábia Saudita). A guerra fria no Médio Oriente, entre o Irão e a Arábia Saudita, veio para ficar.
Os espaços vazios têm horror à desordem. Tal e qual a natureza. Exemplos não faltam. Veja-se o caso de Israel. E veja-se o que estão a fazer Israel, Turquia e Arábia Saudita. Juntos! Quem diria?
O mundo está pior. Afinal Khadafi e outros tiveram razão com os seus vaticínios.
Será que as grandes potências e os países charneira estão fartos de ver os seus ‘poderes’ diluídos em alguns organismos internacionais, que são eles que pagam?
Enquanto tudo isto acontece, as guerras e o terrorismo aumentaram tanto que, segundo o FMI, consomem cerca de 3% do PIB mundial. Nos últimos dez anos, o terrorismo e a guerra destruíram entre 20% e 80% o PIB de vários países (a Líbia é o caso mais extremo). Nunca o planeta, com tanta regra ocidental, com tanta influência ocidental, teve tanta guerra e tanto terrorismo. Não será isso suficiente para nós, ocidentais, pararmos para perceber aquilo em que temos errado?
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