Com o calor a começar a apertar – este ano mais tarde do que o habitual – e em plena época crítica de incêndios, boa parte das Câmaras ainda não se substituíram aos privados que não limparam os seus terrenos, apesar da insistência do Governo no cumprimento da lei. Os autarcas queixam-se de atrasos, de falta de regulamentação e de burocracia. E recordam que, durante o verão, é proibido fazer trabalhos com máquinas nas florestas.
Entre 2 de abril e 24 de junho, a GNR levantou 1819 autos de contraordenação por falta de limpeza de terrenos a privados, em todo o país. E, no caso de os donos não procederem à limpeza, cabe às autarquias avançar com os trabalhos, imputando depois os custos aos proprietários. Inicialmente, a limpeza de matos tinha de estar feita 31 de maio, mas o Governo decidiu prolongar o prazo até ao final de junho. Um mês depois, e ao que o SOL apurou juntou de vários autarcas, pouco se passou no que diz respeito à intervenção das Câmaras. Na da Guarda, o autarca Álvaro Amaro admite que ainda não foram feitas intervenções em áreas privadas. E explica porquê: «Não fomos notificados pela GNR para nos substituirmos a qualquer privado».
Ali perto, na Covilhã, o presidente Vítor Pereira adianta que a Câmara interveio «apenas numa situação», sem adiantar detalhes sobre o caso. Existirão, no entanto, «várias outras situações» de não limpeza identificadas, sendo que a autarquia ainda está a trabalhar com a GNR para «perceber porque é que os donos não fizeram a limpeza». Só a seguir arrancarão os eventuais trabalhos, embora Vítor Pereira avise, desde já, que não vai ser possível limpar tudo. «Vamos dar prioridade aos locais onde existem arbustos, não tanto intervir em zonas de mato», explica. E admite: «Começámos demasiado tarde e a culpa é de todos e não é de ninguém».
No Sardoal, a Câmara ainda não se substituiu a nenhum proprietário. «Estamos a trabalhar com a GNR na validação das infrações detetadas antes de ter terminado o prazo. Desde então e até agora, houve donos que limparam», justifica o autarca, Miguel Borges. A seguir, incumpridores voltam a ser notificados e só depois a Câmara avança Só que há um obstáculo: a Lei da Defesa da Floresta contra Incêndios não permite que durante o período crítico dos fogos haja maquinaria a trabalhar em zonas rurais e florestais. Por isso, e até 30 de setembro, as autarquias não podem avançar com a aplicação da lei. «Houve tantas alterações e prazos prorrogados que é preciso encarar este ano como uma espécie de ano zero», diz o autarca. Entretanto, ainda aspetos da lei por esclarecer. O ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, afirmou que os donos que não tenham possibilidade de pagar pelas limpezas não terão de pagar. Mas o assunto não foi regulamento e as Câmaras não sabem como fazer. «Quem paga? Não há nada na lei sobre como aplicar essa benesse e com que critérios», aponta Miguel Borges.
Outra das dificuldades das Câmaras tem a ver com o preço da mão de obra, que aumentou este ano, e com a falta de empresas. «Muitas Câmaras tiveram concursos de adjudicação vazios e nós só conseguimos adjudicar à segunda», diz Miguel Borges.
No Sabugal, a dificuldade do autarca António Robalo é outra: gastou cerca de 200 mil na gestão de combustíveis da rede primária e candidatou-se à linha de financiamento do Governo, mas «o dinheiro ainda não chegou». ´
Mais a Norte, em Oliveira de Frades, Paulo Ferreira chama a atenção para outro aspeto: em março, a Câmara cortou o mato de todos os seus terrenos: «Mas já está tudo crescido outra vez e temos de voltar ao início». Manter os terrenos limpos parece uma missão impossível.