Chamavam-lhe rainha da soul por motivos sinceros. Uma das mais importantes cantoras do Séc. XX calou-se aos 76 anos. Aretha Franklin deixa uma obra em que a música foi a imitação mais perfeita do combate pelo afro-americanismo e pelos direitos das mulheres.
No dia de aniversário da Rainha da pop, Madonna, a Rainha da soul perdeu em definitivo a batalha contra um cancro no pâncreas, diagnosticado em 2010. Desde novembro que Aretha Franklin não era vista em público
Para se ter uma ideia da sua importância, esteve para a sua época como Beyoncé para os tempos modernos, não apenas como artista pop de raiz soul e r&b como no combate pelo feminismo.
Filha de pai pastor, começou por cantor no coro da igreja Baptista construída por Clarence LaVaughn Franklin. A mensagem passa e nomes como Mahalia Jackson, Dinah Washington, Sam Cooke e Jackie Wilson frequentam a casa onde a petiz cresce. Aos dez anos, Aretha Franklin é conhecida como «a voz do milhão de dólares».
Com a ajuda do pai, grava um álbum gospel aos 14 anos. Em Nova Iorque, grava uma maqueta e chama a atenção de uma das duas editoras cruciais da soul, a Motown. Opta, no entanto, pela Columbia e passa a trabalhar com John Hammond, produtor de Billie Holliday e Count Basie.
É aí que Aretha Franklin evolui de cantora religiosa para diva do r&b, num tempo de modificação do rhythm & blues, para algo mais distante das bases do rock & roll e mais parecido com o r&b popularizado desde a década de 90 não só por Beyoncé, como também por Aaliyah, Rihanna ou Justin Timberlake.
Êxitos modestos que antecederão a época de ouro de Aretha Franklin quando não renova com a Columbia e assina pela Atlantic. Em 1967, é editado ‘Respect’, escrito por Otis Redding dois anos antes, mas enquanto o autor reclamava o respeito e reconhecimento de uma mulher, Aretha inverteu os papéis. O original foi bastante popular entre a comunidade negra mas este acabou por ser um daqueles casos na história da música em que a versão se fixa na memória coletiva como a interpretação definitiva.
Não só se tornou uma das canções simbólicas dos anos 60, como foi usada como hino de diversos movimentos feministas. «Foi a canção certa no momento certo». haveria de contar à Elle em 2016.
O pai organiza a maior manifestação pelos direitos civis da comunidade negra em Detroit, ano de 1963, e conhece Martin Luther King. Canta no funeral deste em 1968.
Canta pelas mulheres mas o radicalismo é educado. E os Presidentes americanos reconhecem-na. Em 1977, é convidada por Jimmy Carter a cantar na tomada de posse do novo Presidente dos EUA. E em 1993, Bill Clinton imita o seu antecessor. Aretha Franklin responde com uma interpretação sentida de ‘I Dreamed a Dream’.
Quando Barack Obama concorre à Casa Branca em 2008, une a comunidade negra à sua volta e, rodeada de artistas contemporâneas como Beyoncé ou Alicia Keys, é uma das vozes pivot. E é aí que arranca um dos maiores momentos neste século quando arranca ‘My Country, Tis of Thee’ no empossar do primeiro Presidente negro.
Nos últimos anos, sucedem-se os tributos premonitórios do pior. Não chega a novas gerações mas nunca perde o respeito entre músicos. Amy Winehouse venera-a e cita-a como referência maior. Aretha Franklin, símbolo da América negra e da igualdade.