João Galamba é uma cara conhecida na zona da barragem de Santa Clara, em Odemira. O deputado socialista e a irmã usam como casa de férias e de fins de semana a habitação de um dos cantoneiros, com vista privilegiada para a barragem. O imóvel, que é património do Estado, foi arrematado num concurso público, em 2012, pela mãe de João Galamba. Rita Saldanha de Azevedo morreu no passado dia 7 de julho, aos 64 anos, e, por isso, o contrato estará caducado. Mas nenhum familiar comunicou o falecimento da arrendatária e, mesmo em agosto, a casa continuou a ser utilizada.
Na aldeia de Santa Clara, nenhuma das fontes contactadas pelo SOL se recorda de lá ter visto a mãe de Galamba. Já João e Ana, os dois filhos da arrendatária, publicaram fotografias da vista do imóvel nas suas páginas no Facebook – e ambos são vistos frequentemente na casa do antigo cantoneiro, acompanhados por familiares.
As casas dos cantoneiros são imóveis património do Estado geridos pela Associação de Beneficiários do Mira, uma organização sem fins lucrativos, tutelada pelo Ministério da Agricultura, que assegura a gestão e exploração do Aproveitamento Hidroagrícola do Mira e o aproveitamento hidroagrícola de Corte Brique.
«As casas são património do Estado e destinam-se a funcionários. Quando se encontram disponíveis temporariamente, como é o caso, são feitos contratos de licença de uso privativo, que é uma figura jurídica que é aplicada nos serviços públicos. A pessoa tem de requerer anualmente a continuidade do contrato», explicou ao SOL fonte da associação.
A associação confirmou ao SOL que «a casa de cantoneiros F1 foi cedida através do Edital nº 1/2012 de 05/06/2012, conjuntamente com outras 4 casas momentaneamente disponíveis. Este foi divulgado pelos meios em uso à data, designadamente afixação nas Juntas de Freguesias e Câmara Municipal». A associação tem 70 casas – destas, «cerca de 30» estão cedidas nestes moldes, revela fonte da associação.
327 euros de renda
O SOL requereu a consulta deste processo, mas, até ao fecho desta edição, a informação ainda não tinha sido disponibilizada. Mas o SOL sabe que a casa está em nome da mãe de João Galamba.
Apenas duas pessoas participaram neste concurso, uma com uma proposta de renda de 185 euros por mês e a outra – em nome de Rita Saldanha de Azevedo – com um valor de 310 euros mensais. Normalmente, segundo as fontes ouvidas pelo SOL, os valores das rendas propostas rondam os 100 e os 300 euros.
A proposta assinada pela mãe de Galamba acabou por vencer – o valor é atualizado anualmente e, este ano, a família do deputado socialista paga 327 euros de renda, através de uma conta titulada pela mãe de Galamba, da qual, aliás, também foi feito o pagamento da renda já deste mês de agosto.
Fonte da associação acrescentou também ao SOL que, neste tipo de arrendamento, o rendeiro «pode propor as obras de reabilitação que pretende realizar. Estas são previamente autorizadas pela direção».
O SOL apurou que a família de João Galamba gastou 10.800 euros em obras e que este valor já foi amortizado.
Populares da zona reiteram que nunca viram a mãe do socialista na zona, mas apenas Galamba, a irmã e as respetivas famílias ou amigos. Confrontado pelo SOL, Manuel Amaro Figueira, o representante do Estado na Associação de Beneficiários do Mira, esclareceu que não sabia que a mãe de João Galamba tinha morrido: «A associação não tem, neste momento, informação alguma de que o arrendatário tenha falecido».
Manuel Amaro Figueira acrescentou: «A informação terá de ser comunicada à direção, mas, no meu entender, a casa terá de ir a concurso novamente».
‘A casa é do meu padrasto’, diz Galamba
A Associação de Beneficiários do Mira afirmou ainda que, agora que tomou conhecimento da situação através do SOL, irá contactar a família do deputado João Galamba para que alguém resolva as irregularidades processuais.
Confrontado pelo SOL, João Galamba, audivelmente indignado, explicou que, face ao falecimento da mãe, a casa é agora do padrasto. «Não tenho nada a ver com isso. A minha mãe e o meu padrasto candidataram-se ao concurso, a minha mãe faleceu há um mês e meio e agora a casa é do meu padrasto», afirmou o deputado socialista.
«Ainda não fui lá desde que a minha mãe morreu, mas tenciono ir lá, acompanhar o meu padrasto», acrescentou João Galamba, explicando que esteve até quinta-feira na ilha da Madeira.
O deputado socialista esclareceu ainda que a mãe e o padrasto «passavam férias ali há 30 anos e os locais avisaram(-nos)» da abertura de concurso para arrendamento da casa do cantoneiro na barragem de Santa Clara, tendo ambos concorrido e ganho o concurso.
Mas o contrato de arrendamento da casa está apenas em nome da mãe de João Galamba.