Europa, Mundialização e Progresso

Ao contrário do naturalmente expectável, a relevância das instituições nos regimes democráticos mais consolidados faz, inesperadamente, multiplicar o jogo das manipulações em busca do poder. Não admira, pois, que demasiados europeus se questionem sobre a relevância da Europa e, sobretudo, da União Europeia. 

Mesmo os menos atentos à qualidade e quantidade de jogos políticos que enxameiam o quotidiano percebem que em política nem tudo o que parece é. Já quase todos estamos precavidos para a aparência ingénua de grandes tiradas políticas apresentadas como de grande interesse público, quando apenas tem o fito de promover interesses grupais dominantes ou outros interesses em processo de afirmação ou de alargamento da dominação.

A escolha do inimigo comum, sabemos, tem sido quase sempre estratégia ganhadora (exemplos não faltam), sobretudo nos casos de manifesto desinteresse pela política ou de ignorância sobre a essência dos verdadeiros caminhos do poder. 

Ao contrário do naturalmente expectável, a relevância das instituições nos regimes democráticos mais consolidados faz, inesperadamente, multiplicar o jogo das manipulações em busca do poder. Não admira, pois, que demasiados europeus se questionem sobre a relevância da Europa e, sobretudo, da União Europeia. 

 

Talvez por isso seja oportuno, que á luz da nova reorganização geoeconómica do mundo, envolvendo múltiplas estratégias nesta fase de pré consolidação, valha a pena que nos interroguemos sobre alguns aspetos decisivos para a nossa tomada de posição individual e coletiva. Assim, antes do mais, será crucial perceber:

– Qual a comunidade que desenvolveu um apoio social mais efetivo, tendo como referência a dignidade de todos os seres humanos?

– Que outro grupo social empregou mais esforços para combater as injustiças e as desigualdades?

– Em que espaço geográfico floresceram com maior vigor os compromissos de combate á miséria e ao sofrimento humano?

– Onde se praticam políticas que mais consistentemente promoveram e promovem a combinação da liberdade com o progresso material e ético dos seres humanos? 

– Em que parte do mundo o acesso à saúde e ao ensino estão mais facilitados e generalizados?

– Onde é que as classes trabalhadoras beneficiam de melhores condições de vida, usufruindo de garantias de liberdade, de opinião e de expressão?

–  Em que espaço geoeconómico estão garantidas a oposição aos governos em pé de igualdade, bem como eleições verdadeiramente livres?

– Em que parte do mundo se evoluiu conjuntamente tão significativamente em termos de nível e qualidade de vida?

– Em que latitude a paz se transformou num valor tão efetivo e generalizado da sociedade?

– Onde surgiram os apoios mais decisivos para combater as inqualificáveis catástrofes económicas e sociais desencadeadas por ideologias pressupostamente defensoras dos interesses dos mais vulneráveis?

– Que outra sociedade, em crise ou sem ela, mais protegeu e protege a cidadania?

 

É seguramente possível encontrarmos respostas contraditórias, mas, a grande questão é a de compreendermos, em tempo e a tempo, a quem mais interessará a fragilização da Europa? Porquê? E para quê? Será que o populismo e os populistas que estão a florescer na Europa têm alguma coisa a ver com isto?

As paixões e os preconceitos têm na política um campo inesgotável de opções para medrarem. Nacionalistas, soberanistas, ‘patriotas económicos’, demagogos encartados, têm certamente alternativas para toda as questões levantadas, o problema é perceber se os efeitos a que tais alternativas conduzem nos levam a uma situação de maior progresso coletivo.

Convém, contudo, não contaminarmos o progresso com a inveja. Inveja vista como praga, também por cá, persistente, emprestando misteriosa relevância à última palavra dos Lusíadas… Será apenas uma delicada premunição ou também um nosso fado consistente?