Catarina Martins afirmou que o BE está disponível para assumir todas as responsabilidades. De que forma é que devemos interpretar essas palavras?
A minha interpretação do discurso da Catarina Martins é a de que a disponibilidade para entrar no Governo está intimamente associada a uma alteração na correlação de forças. O Bloco de Esquerda não está no Governo agora, porque não tem uma votação suficiente para influenciar a política governativa de modo a que ela não seja, por exemplo, tão tímida em relação aos avanços sociais e tão obediente em relação àquilo que é ainda a ortodoxia orçamental europeia. Eu junto as duas peças. A disponibilidade é real, não é fictícia, não é retórica, mas é uma disponibilidade que está associada a uma condição que é, no fundo, a alteração da correlação de forças na maioria parlamentar.
Com os deputados que tem atualmente não consegue ter essa força?
Não consegue. A verdade é que conseguiu muitas medidas e orientações positivas, mas é evidente que não conseguiu outras que são também essenciais e por isso é que eu juntaria sempre as duas variáveis.
Essa disponibilidade do BE para ir para o Governo mostra que houve uma transformação no partido?
Eu também vejo aí uma transformação. O Bloco tem hoje mais responsabilidade e mais maturidade política. Não nego que os últimos anos de negociação intensa, nem sempre feliz, mas intensa, dentro da maioria parlamentar, contribuiu para esse acréscimo de maturidade. Sem dúvida nenhuma.
Ainda faz sentido associar o BE a um partido de protesto?
Continua a fazer sentido. Eu prefiro, em vez de protesto, chamar-lhe de alguma rebeldia. Isso é um ingrediente fundamental no espaço político que o Bloco quer ocupar. É fundamental que o Bloco consiga associar a maturidade, a responsabilidade, a preparação técnica, com alguma criatividade, indignação, imaginação e rebeldia. Nem sempre isso é fácil.
Julga que António Costa quer mesmo continuar com esta solução política ou a aproximação ao PSD com a mudança de liderança pode mudar algumas coisas?
António Costa é acima de tudo um pragmático, mas tudo vai depender da correlação de forças. Acho que há hoje no PS, na sua base de apoio, uma adesão muito grande à chamada ‘geringonça’ e é mais isso a condicionar António Costa do que qualquer tipo de inclinação ideológica. Ele é um pragmático.
Como viu as críticas de António Costa a Ricardo Robles?
Ultimamente houve várias provocações por parte do Partido Socialista. Dizer, por exemplo, que os próximos entendimentos não seriam escritos é algo obviamente inaceitável. São provocações que indicam, mais do que uma tensão real, uma preocupação com a disputa de eleitorado à sua esquerda.