Até ao final de setembro o executivo liderado por António Costa terá de arranjar uma justificação que convença a Comissão Europeia quanto aos motivos que levaram o governo de José Sócrates em 2007 a estender em cerca de 25 anos em média 27 contratos de concessões hidroelétricas a favor da EDP. E a Comissão começa por lembrar que não vale a pena explorar a ideia de que se tratou de um auxílio de Estado, pois já em maio de 2017 essa hipótese fora por si recusada.
Numa carta do director-geral do Mercado Interno, da Indústria, do Empreendedorismo e das PME, Lowri Evans, datada de 12 de Julho, a que a Lusa teve hoje acesso, é chamada a atenção para "uma questão de direito europeu em matéria de contratação pública relativa à extensão dos contratos das concessões hidroelétricas portuguesas", decisão de 2007, tomada pelo então ministro da Economia, Manuel Pinho.
O ex-ministro da Economia Manuel Pinho tentou justificar a decisão dizendo que se limitou a seguir um decreto que já vinha do governo anterior: "estava tudo nos contratos de cessação dos CAE [custos de aquisição de energia]". "Eu herdo a parte final da execução. A concepção, aprovação e pedidos de autorização foram feitos por governo anterior", acrescentou no parlamento o antigo ministro.
Agora, o Estado português deve responder às questões levantadas por Bruxelas e a eterna estratégia de pssar a batata quente, e que tão bem tem resultado a nível interno, não é uma das opções do actual executivo.
Tendo a Comissão já se pronunciado, em maio de 2017, sobre a decisão do governo Sócrates, tendo concluindo que "a extensão em 2007 de cerca de 25 anos em média de 27 concessões hidroelétricas a favor da EDP, o operador histórico, não constituía um auxílio de Estado", vem agora a missiva recordar que falta apreciar "a conformidade com regras da União Europeia em matéria de contratação pública".
"Assim, somos da opinião que, na falta de outros elementos, a decisão tomada pelas autoridades portuguesas em 2007, poderia levantar sérias dúvidas quanto à sua compatibilidade com o direito europeu em matéria de contratação pública", sublinha.
Em 24 de Julho, em audição na comissão parlamentar de inquérito às rendas excessivas na energia, o ex-presidente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) Vítor Santos defendeu que "seria obrigatório" ter havido um concurso público aquando do processo de extensão da concessão do domínio público hídrico.
Vítor Santos, que esteve dez anos à frente do regulador do setor da energia, desde 2006, considerou que "não era impossível fazer aquilo que foi feito pelo Governo na altura, mas a ser feito era necessário que tivesse existido um concurso público".
Esta obrigação de realização de concurso público, na opinião de Vítor Santos, decorre de dois motivos: "Por causa do que está estabelecido no decreto-lei que funciona como uma espécie de lei de bases do sector eclétrico, no qual é estabelecido um regime de produção de mercado, e, para além disso, uma cláusula dos CAE estabelece que um ano antes da sua cessação deveria ter organizado um concurso público."